Escrito por: Andre Accarini

Em São Paulo, Lula reforça compromisso com movimentos sociais em plano de governo

Encontro contou com participação de entidade como CUT, MTST, MST, UNE e outras. Lula recebeu documento com propostas para seu plano de governo, bem como apoio à sua candidatura

Roberto Parizotti

Com a esperança em dia e a motivação renovada, movimentos populares participaram de um encontro com o ex-presidente Lula, na tarde desta sexta-feira (27), realizado na Casa de Portugal, em São Paulo. Ao lado da esposa Janja, de Geraldo Alckmin, pré-candidato a vice na chapa, além de lideranças dos movimentos sociais, Lula, recebeu, um documento com propostas para o plano de governo e com o compromisso de apoio à sua candidatura.

O Encontro de Lula com os Movimentos Sociais, como foi chamado o evento, teve como peculiaridade a convergência de cerca de 90 movimentos sociais em torno de uma única candidatura. Para as lideranças desses movimentos, Lula é a única figura, hoje, com a capacidade e experiência de não somente reconstruir o Brasil no campo econômico, com geração de emprego, mas restituir uma ordem social democrática que prioriza direitos e dignidade a segmentos historicamente excluídos e marginalizados na sociedade.

E foram os representantes desses segmentos que dialogaram diretamente com o ex-presidente no encontro. Atento às várias falas com reivindicações e posposições para o futuro governo, Lula não só se comprometeu com as lutas, como é já característica sua, mas também fez uma espécie de convocação para que, neste momento, se mantenham alertas e engajados a derrotar o governo de Bolsonaro e, depois das eleições, ‘ajudem’ a reconstruir o país.

“Quero um compromisso. Se a gente governar o país, vou precisar do apoio de você para ser feito. Mas o compromisso não é com o governo e sim com o povo que vocês representam”, disse Lula, afirmando que jamais reprimiu ou mesmo pediu para que não houvesse qualquer tipo manifestação ou protesto durante seus mandatos.

E, se dirigindo ao vice-presidente da CUT, Vagner Freitas, um dos convidados do evento, Lula lembrou que greves foram feitas em seus governos. “Nunca pedi ao movimento sindical que deixasse de fazer greve porque eu era presidente[...] Nasci no movimento sindical e sei que não podemos abdicar da nossa luta. Não se incomodem de cobrar. Se vocês não cobrarem serão pelegos e não nasceram para isso”, disse Lula reforçando que é papel dos movimentos sociais se manter luta pelos interesses que defendem.

Não vai ser fácil

Após elencar as várias tragédias e retrocessos vividos pelo país nos últimos tempos como o desemprego, a fome, os preços dos combustíveis junto com o drama vivido pelos brasileiros que não conseguem comprar gás e até comida por causa dos altos preços que impactam em todo o mercado, Lula apontou a responsabilidade pelo Brasil ser o país do desalento como é hoje.

“Não adianta jogar culpa na Petrobras ou na guerra da Ucrânia. É responsabilidade desse desgoverno que temos nesse pais, e que agora quer privatizar tudo o que o Brasil já construiu para o seu povo”, afirmou.

Todas as políticas são interlaçadas. Quando se fala, por exemplo, em privatização de estatais, fala-se em tarifas mais altas e degradação de serviços essenciais à população e, que mais sofre os impactos são as camadas mais vulneráveis. Mas vai além disso. Corte de recursos em educação, em saúde, a condução de ações positivas e corretas a exemplo do que não aconteceu durante a pandemia e que resultaram na morte de mais de 665 mil pessoas também são exemplos.

Para Lula, o ‘conjunto dessa obra’ é um desrespeito como povo brasileiro. “[vamos] Recuperar o país para que as pessoas sejam tratadas com respeito. Tem que ter direitos, cultura, lazer, saúde, hospital, tudo o que precisamos para viver dignamente”, disse o ex-presidente.

E reforçou que seu objetivo é “cuidar do país como se cuida da casa da família” e reforçou que “cuidar do povo brasileiro é a razão da existência do país”.

Acreditem que nós temos condições de consertar esse país. Acreditem que a gente tem condições de atender grande parte das reivindicações- Lula


A voz de Deus

Lula não deixou de citar os resultados da última pesquisa Datafolha que mostra uma vantagem de 21 pontos do ex-presidente em relação a Jair Bolsonaro. E aproveitou para alertar que a disputa, mesmo assim, será difícil.

“Estamos começando uma campanha que não é fácil. Não estamos enfrentando um adversário fraco. É alguém perigoso porque seu comportamento não é democrático vive de ofender as instituições, dizendo que só Deus vai tirá-lo de lá”, alertou Lula, que mandou um recado. “Quero que ele saiba que quem vai tirar ele de lá não é Alckmin e eu e sim vocês, porque vocês querem voltar a acreditar no país”, disse.

O povo é a voz de Deus e vai tirar ele de lá- Lula


O jeito certo de se fazer

A união das lideranças dos movimentos também foi destacada pelo ex-governador de São Paulo, Geraldo Alkmin (PSB). “É assim que se faz um programa. Não é fazendo motociata, subindo em lancha ou iate, mas junto do povo”, disse Alckmin em resposta à conduta de Jair Bolsonaro.

Aqui se constrói um programa de governo democrático e popular onde movimentos terão voz e vez- Geraldo Alckmin


Estamos chegando e só sairemos daqui de mãos dadas com Lula

No início do encontro, vários integrantes dos movimentos sociais entoaram não só palavras de ordem, mas mensagens de esperança como o trecho de uma canção famosa em mobilizações que diz “Sozinho ando bem, mas com você ando melhor”. Foi assim, de braços abertos que Lula foi recebido no encontro, simbolizando o apoio à sua proposta de reconstruir o país.

A ‘mística’ de abertura trouxe o grito das massas por um país melhor, mais justo, mais solidário, com economia que não privilegie a poucos, mas que seja sustentável e para todos, moradia com uma reforma urbana justa, segurança pública que não mate o povo mais pobre, investimento e respeito à educação e à ciência, bem como respeito a direitos e à diversidade.

A primeira anfitriã do evento, Nalu Faria, da Marcha Mundial das Mulheres deixou claro que a intenção dos movimentos é resolver problemas sociais. “São sistêmicos e temos que afrontar esse sistema capitalista, patriarcal, racista, depredador da natureza e LGBTfóbico”, disse Nalu.

E reforçou que o evento é simbólico porque os movimentos presentes representam, na verdade, toda a população brasileira. Para ela, se trata de uma oportunidade histórica de o povo retomar o poder.

Raimundo Bonfim, da Central de Movimentos Populares, apresentou o documento elaborado pelas entidades e destacou que a mobilização das organizações em torno da disputa do projeto de poder já começou. “É tarefa retomar a democracia e abrir caminho para sermos feliz com igualdade social, direitos, emprego, renda e sem ódio’, disse.

Emprego e renda foram destaques na fala de Vagner Freitas, que representou a CUT no encontro, apontada pelos anfitriões como uma entidade que nunca arredou pé e se manteve firme na luta em todo esse tempo, de golpe e ataques ao povo brasileiro e à classe trabalhadora.

É necessário que tenha emprego. Esse governo excluiu o povo trabalhador de ter emprego. É preciso ter Lula de volta para colocar o povo no orçamento e para rico pagar imposto”, disse Vagner.

Vagner Freitas/ Foto: Roberto Parizotti

A presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffman, também ressaltou a unidade dos movimentos em torno da candidatura de Lula à presidência da República. Ela lembrou que muito dos presentes estiveram também em importantes e cruciais momentos da história recente como na luta contra o golpe na vigília Lula Libre, durante os 580 dias em que ele esteve preso na Superintendência da Polícia Federal após ser condenado em um processo cheio de inconsistências, pelo ex-juiz Sérgio Moro.

“É um grande e forte movimento em defesa do Brasil e do povo brasileiro. Estou orgulhosa por estar desse lado”, disse a parlamentar.

Justiça por Genivaldo

Entre as várias lideranças dos mais diversos movimentos representando a luta por moradia, por diversidade, povos indígenas, estudantes e de trabalhadores do campo, um momento teve a atenção especial de toda a plateia.

Representando o Movimento Negro Unificado (MNU), Simone Nascimento destacou a barbárie praticada pelas polícias nos últimos tempos, em especial, com a morte de Genivaldo  de Jesus Santos, homem negro de 38 anos, que morreu depois que agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) fizeram uma “câmara de gás” no porta malas de uma viatura e o trancaram dentro, nesta quarta-feira (25).

Roberto Parizotti

“Resistimos a essa barbaridade em curso no país. Pelo menos 23 pessoas foram vítimas na Vila Cruzeiro [em referência a uma incursão da Polícia Militar no Rio de Janeiro] e estamos aqui para denunciar esse projeto de genocídio, que ganha mais corpo de atuação e espaço pra violar nossos corpos, com Bolsonaro”, disse Simone após erguer um cartaz em homenagem a Genivaldo e pedir um minuto de silencia a todos.

Além do MNU, representantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), União Nacional dos Estudantes (UNE), Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e da União por Moradia Popular também participaram da entrega do documento a Lula.