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Empresas ganham na Justiça direito de não pagar salário maternidade na pandemia

Justiça de São Paulo e Belém deram ganho de causa para empresas que querem compensação previdenciária do INSS pelo pagamento do salário maternidade de grávidas afastadas do trabalho durante a pandemia

Publicado: 21 Fevereiro, 2022 - 08h30 | Última modificação: 21 Fevereiro, 2022 - 08h41

Escrito por: Rosely Rocha | Editado por: Marize Muniz

Ana Nascimento / MDS / Portal Brasil
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Contrárias a Lei nº 14.151, que garante o afastamento das grávidas do trabalho presencial, no caso das mulheres cujas atividades profissionais não podem ser feitas em home office, como caixas de supermercados, estoquistas e faxineiras, empresas entram na justiça para não pagar o salário maternidade. E algumas estão ganhando a causa. 

O pagamento do salário maternidade é garantido com a contribuição previdenciária das empresas, que agora pedem o ressarcimento desses custos ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Duas grandes redes de supermercado, a “Mais Barato”, de Belém (PA) e o “Atacadão” da Rede Carrefour, com sede em São Paulo, acionaram a Justiça para que o INSS assuma essa dívida, e elas possam descontar da contribuição previdenciária o que foi gasto até agora e do que podem pagar ainda.

Apesar do Congresso Nacional ter aprovado na última quarta-feira (16) a volta das grávidas ao trabalho, mesmo com o alto número de infecções e mortes registrados no Brasil, se as ações das empresas forem ganhas até o final dos processos, o INSS pode ser obrigado a ressarci-las dando descontos nas contribuições previdenciárias, sem prejuízo no pagamento do salário maternidade às grávidas.

Leia mais: Congresso aprova PL que obriga grávidas a voltar ao trabalho presencial

“As sentenças não determinam que o empregador cesse os pagamentos e o INSS assuma. Apenas declara o enquadramento dessas verbas como salário maternidade e concede ao empregador o direito de compensar esses pagamentos da base de cálculo das contribuições previdenciárias”, explica a advogada especialista em Direito Previdenciário do escritório LBS, Karina Balduino.

“Ou seja, a rigor, nada muda para as gestantes, que continuam recebendo”, ressalta a advogada, que faz uma ressalva: “Se o direito do empregador compensar esses valores vai de fato vigorar vai depender de como o processo irá transitar em julgado”.

As ações do Atacadão e do Mais Barato

O Atacadão, do Grupo Carrefour, que estima ter atualmente cerca de 850 empregadas gestantes, e a Rede Mais Barato foram à Justiça após a edição, em maio de 2021, da Lei nº 14.151, que exige o afastamento das gestantes do trabalho presencial, com o pagamento integral da remuneração que trata do afastamento de gestante em ambiente insalubre.

A liminar favorável ao Atacadão foi da juíza Diana Brustein, da 7ª Vara Federal Cível de São Paulo. Ela entendeu que não se discute que o objetivo da lei é a proteção da gestante, “todavia, não pode o empregador ser responsável pelo pagamento da remuneração”. Ela acrescenta, na sentença, que a situação é semelhante à das gestantes afastadas por trabalharem em atividades insalubres.

A sentença favorável à rede Mais Barato, é da juíza Hind Ghassan Kayath, da 2ª Vara de Belém. Ela entendeu que é dever do INSS pagar o salário maternidade às grávidas que não podem exercer suas funções em home office, por ser prejudicial ao empregador que “em hipótese alguma, deve ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega”, de acordo o Decreto nº 10.088, de 2019, sobre a proteção à maternidade.

Outras duas empresas dos setores de conservação e limpeza e de vigilância e portaria, que teriam entre 70 e 80 grávidas afastadas, também obtiveram liminares neste sentido, segundo o escritório do FAS Advogados, ao jornal Valor Econômico.

As liminares repassam os pagamentos ao INSS e autorizam a compensação dos valores já pagos, além de permitirem que esse procedimento seja aplicado às funcionárias que vierem a ficar grávidas durante a pandemia.

Judiciário machista

Para a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT Nacional, Juneia Batista, espanta a decisão favorável às empresas terem sido dadas por juízas, o que demonstra um machismo arraigado no Judiciário brasileiro.

“Num momento pandêmico, duas mulheres, juízas, deram ganho de causa a empregadores que ganharam muito mais nesse período. Elas não consideraram que quem perdeu mais na pandemia foram as trabalhadoras com salários diminuídos, que ainda têm de alimentar seus filhos e filhas. É responsabilizar a mulher pela gravidez”, diz Juneia.

Para a dirigente não importa que o pagamento seja feito pelo INSS, sem prejuízo às trabalhadoras, é a mensagem dada pelo Judiciário em favor também do capital.

“O papel da Justiça num momento de fome, miséria, desemprego e arrocho e de enriquecimento maior dos mais ricos teria de ser proteger a classe trabalhadora”, conclui.