Empréstimo consignado no Auxílio Brasil é inconstitucional, diz Procuradoria
Aliado de Bolsonaro, Augusto Aras se manifestou à Suprema Corte em ação movida pelo PDT que considera o empréstimo um risco para o superendividamento das famílias mais vulneráveis
Publicado: 16 Novembro, 2022 - 14h26 | Última modificação: 17 Novembro, 2022 - 10h48
Escrito por: André Accarini | Editado por: Marize Muniz
Após ser considerado por economistas uma bomba para o orçamento dos beneficiários, o empréstimo consignado no Auxílio Brasil recebeu reprovação também do Procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras, aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL). Em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF), Aras considerou a modalidade inconstitucional por não proteger os beneficiários do endividamento.
O posicionamento do procurador-geral se refere a uma ação movida pelo PDT que aponta os riscos do consignado à população de baixa renda, beneficiária do Auxílio Brasil. Para Augusto Aras, de fato, o empréstimo com descontos no próprio benefício vai contra o direito do consumidor e fere a dignidade de pessoas vulneráveis ao permitir que elas se endividem.
Na ação, o PDT reforça que "a prática legislativa não pode incentivar o endividamento da população e permitir uma abertura de margem para danos de maior proporção para a população em vulnerabilidade econômica, o que atrai prejuízos sem medida para idosos, pessoas com deficiência e famílias em situação de miserabilidade e vai de encontro às práticas de crédito responsável e de prevenção ao superendividamento”.
Compra de votos
A medida do governo federal, antes das eleições, de conceder o empréstimo consignado aos beneficiários do Auxílio Brasil, foi uma extensão das ações eleitoreiras de Jair Bolsonaro, antes do pleito, em outubro, com o objetivo de atrair os votos dos mais pobres, o que não conseguiu.
Com a ajuda de aliados no Congresso, Bolsonaro conseguiu aprovar a chamada PEC do Desespero, manobra que, por Emenda Constitucional alterou a Carta Magna de forma a permitir que em ano eleitoral o Executivo fizesse ‘chover recursos’ à população. A medida previa, além de benefícios a caminhoneiros e taxista e aumento do vale-gás, uma elevação do valor Auxílio Brasil, de R$ 400 para R$ 600 até dezembro deste ano.
Equipe de transição
A equipe de transição de governo liderada pelo vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSD), articula a manutenção do auxílio, que voltará a se chamar Bolsa Família, em R$ 600.
Alckmin já discutiu um acordo com o relator-geral do Orçamento da União para 2023, Marcelo Castro (MDB-PI), para estabelecer quais programas serão cobertos com a chamada "licença para gastar" na "PEC da Transição", que está sendo elaborada.
O projeto de Orçamento de 2023 enviado por Bolsonaro ao Congresso prevê recurso para garantir apenas R$ 400 mensais para o atual Auxílio Brasil. Lula quer começar janeiro mantendo o valor atual de R$ 600, o que exige mais R$ 52 bilhões.
Dídiva impagável
Após o aumento de R$ 200 do auxílio, em 10 outubro, o governo disponibilizou na rede bancária a modalidade do consignado aos beneficiários. As prestações do empréstimo não podem exceder 40% do valor do benefício ampliado (R$ 600). No entanto, há um leque de desvantagens e abusos no empréstimo.
Um deles é a taxa extorsiva de juros, na margem de 79% ao ano, considerada por especialistas como ‘agiotagem’.
“Quem pegar mil reais de empréstimo ao longo de 12 meses vai pagar R$ 1.700 se a taxa de juros ficar em torno de 70% ao ano, e esses R$ 700 de juros irão para o sistema financeiro, demonstrando que esse governo não compreende para que serve um auxílio”, diz Fausto Augusto Junior, diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Outro problema é sobre o valor ‘que sobra’ do benefício ao serem descontadas as parcelas. Se em um primeiro momento o beneficiário tem a “ilusão de ter muito dinheiro’, com o empréstimo liberado, ao longo dos meses a sensação será bem diferente, já que o benefício, insuficiente para a sobrevivência da maioria das famílias, virá ainda menor.
“Se o beneficiário receber R$ 600 vai poder comprometer R$ 240, por mês. Mas terá o valor rebaixado para R$ 400, a partir de janeiro de 2023. Assim o comprometimento da renda será ainda maior: 60% do que receberá, se a dívida não for quitada até o prazo final do ganho de R$ 600”, explica Adriana Marcolino, técnica da subseção CUT Nacional do Dieese.
Ou seja, se hoje, com o valor de R$ 600, descontada a parcela do consignado (40%=R$ 240,00) sobrariam R$ 360, se o valor voltasse a ser R$ 400, restariam seriam apenas R$ 160, com o desconto da parcela do empréstimo.
Retorno da modalidade
A oferta do consignado havia sido suspensa no dia 31 de outubro por causa de problemas no processamento da folha de pagamento dos benefícios, procedimento que envolve o Ministério da Cidadania, a Caixa e a Dataprev. O serviço voltou a ser ofertado na última segunda-feira, 14, mas ainda assim há reclamações sobre a liberação e os descontos no benefício.
Beneficiários que não pediram empréstimos dizem que extratos estão vindo com descontos. Outros pediram, mas reclamam porque 1ª parcela foi antecipada e pode ocorrer antes de o empréstimo cair na conta.
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A oferta de crédito consignado também havia sido contestada pelo Ministério Público (MP) do Tribunal de Contas da União (TCU), que chegou a entrar com uma liminar para que a Caixa Federal suspendesse as operações.