Escrito por: Rosely Rocha
Senado dá o primeiro passo para a autonomia do Banco Central (BC). Para vice-presidente da CUT, Vagner Freitas e o presidente do Instituto Lula, Marcio Pochmann, decisão vai prejudicar empresas e trabalhadores
O Senado Federal deu o primeiro passo, nesta terça-feira (3), para a autonomia do Banco Central (BC) ao aprovar por 56 votos a 12, o projeto de lei que estabelece mandatos de quatro anos, com direito a recondução ao cargo pelo mesmo período, do presidente e diretores da instituição. Atualmente a direção do Banco Central não tem mandato fixo e é indicada pela Presidência da República. A autonomia do Banco Central ainda precisa ser votada pela Câmara dos Deputados.
Mas, o que o trabalhador tem a ver com a escolha e tempo de mandato de um presidente e dos diretores do Banco Central? Tudo, dizem o vice-presidente da CUT, Vagner Freitas e o economista e presidente do Instituto Lula, Marcio Pochmann.
A atuação do BC influencia na geração de emprego e renda ao condicionar instrumentos de políticas econômicas como a taxa básica de juros, que impactam no valor dos empréstimos pessoais e das empresas, que podem ser favoráveis, ou não, ao aumento da produção.
Com juros altos, uma indústria, por exemplo, não consegue crédito para se expandir e contratar mais funcionários. Uma importadora pode ter prejuízos com o dólar alto e até mesmo o mercado interno ficar desabastecido como vem ocorrendo com a desvalorização do real frente ao dólar, o que acarretou nos preços altos dos alimentos. Quando a moeda norte-americana está muito alta ao ponto de ser prejudicial ao país é o BC que entra no mercado para vender ou comprar dólares e estabilizar seus preços.
O economista explica que o papel do BC é também exercer o controle da moeda, a valorização do país. Para isso tem de enfrentar a inflação e a desvalorização do Real e, é por isso que precisa cuidar da saúde dos que operam a moeda, que são os bancos, as instituições financeiras.
O problema, de acordo com Pochmann, é que se o BC adotar uma receita que mate o paciente, ele acaba com os empregos.
“Mesmo estabelecendo a taxa básica dos juros, o Banco Central não define a taxa final, o que já tem favorecido os grandes bancos. Se já atrelado ao governo federal o BC não promove competição entre os bancos, nem favorece a criação de cooperativas de crédito que possam baratear o custo do dinheiro, as possibilidade de crescimento de emprego se tornam mínimas, afetando toda a população”, diz Pochmann.
Autonomia gerará conflitos com eventual governo progressista
Tanto para o vice-presidente da CUT como para o presidente do Instituto Lula, a autonomia do Banco Central é uma farsa, já que a instituição passará a definir os rumos da economia do país, independentemente da política econômica que um presidente eleito vier a tomar.
O perigo, segundo Vagner Freitas, é o discurso de que o objetivo da autonomia do Banco Central é blindá-lo de pressões político-partidárias, mas o que ocorre na verdade, é que o comando da instituição deverá ficar nas mãos do mercado financeiro, lembrando que o atual ministro da Economia, Paulo Guedes, é banqueiro.
“É preciso ter respeito pelo voto do eleitor. A atuação do BC não pode ser restrita ao governo escolhido pelo povo, que sentirá as medidas adotadas pela instituição. Na realidade, querem distanciar as decisões do BC do povo e aproximar do mercado financeiro. A autonomia do BC é transformar a eleição num engodo. É impedir que um presidente progressista coloque em prática a sua política econômica de geração de emprego e renda”, critica Vagner.
A autonomia do Banco Central para Pochmann nada tem de independência, pois esconde uma parcialidade, já que a instituição estaria distante de políticas governamentais e passaria a atuar à margem das decisões de um governo eleito.
Isto significa que a vontade da população ao votar e eleger num determinado candidato que tenha propostas econômicas de geração de emprego e renda, diferentes da direção do BC, poderá ser impedido de implantá-las.
Segundo ele, se de fato se confirmar o BC como autoridade independente dos governos de plantões, podemos ter na verdade caminhos diferentes. Um governo voltado à criação de empregos e um Banco Central contra, por conta da condução de uma politica monetária restritiva, com juros elevados, com poucos recursos para empréstimos.
“ Nas mãos do mercado financeiro, o BC não atuará numa uma política de incentivo ao emprego e à renda. O trabalhador também será prejudicado com uma política de juros altos que influenciam a habitação, seus gastos pessoais, as contas no supermercado. A vida ficará mais difícil para quem precisa de crédito pra comprar bens duráveis, de consumo, como carros, imóveis e até a possibilidade das empresas contratarem em investir em obras”, diz o economista.
A autonomia do Banco Central consolida uma espécie de feudo dos bancos, constituído na defesa dos seus interesses, independente do país. É destruir a identidade nacional porque o que passa a valer são os interesses particulares e os interesses não necessariamente convergentes com os da Nação- Marcio PochmannJá para Vagner Freitas, o BC independente é ter um parceiro para o mercado acumular riqueza, sem compromisso com políticas públicas. É deixar a instituição fora da pressão da opinião pública, da democracia.
“Eles querem fugir dessa pressão para que os recursos oriundos da riqueza nacional, que o BC é gestor, estejam fora de alcance da população. O Banco Central tem de estar atrelado ao projeto de governo que o povo escolher, e não ser mais um elo do mercado financeiro que só tem vontade fazer o bem a si próprio”, diz Vagner.
BC independente para quê? Independente de quem? Quem comporá a direção deste BC independente?.Serão os trabalhadores importantes nesta construção?. Serão os membros das cadeias produtivas, os setores da indústria, do agronegócio, do movimento sindical ligado aos trabalhadores? .O BC vai ser comandado no Brasil ou será pelos agentes financeiros internacionais que regulam o mercado?. São perguntas em que ninguém diz a resposta- Vagner FreitasPara o dirigente, esses questionamentos são válidos porque a interferência do mercado financeiro no Brasil, é segundo ele, muito grande, já que o mercado no Brasil só serve para estabelecer regras de acumular capital para enriquecer os grandes bancos privados.
O presidente do Instituto Lula ressalta ainda que o BC virou a porta de entrada e saída de banqueiros, hora são eleitos presidentes, hora são indicados ao ministério da Economia. Nos últimos cinco anos, segundo ele, esse funcionamento que já é autônomo, não reconhecido em lei, não favoreceu o país porque os bancos tiveram lucros excepcionais. O BC se tornou um sindicato dos bancos
“ Eu vejo essa autonomia como medida que se constitui num processo mais abrangente. De um lado a ideia de separação do Banco Central do Brasil, a sequencia é a aprovação do Real como moeda digital, e a terceira, é a transformação do Real como moeda conversível ao dólares. É a perda da soberania do Brasil”.
A presidenta nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR) concorda com Pochmann de que a autonomia do BC é um atentado à soberania do país. Em seu twitter, a parlamentar escreveu:
“A autonomia do Banco Central serve aos interesses do mercado e não do país. Como pode o banco do governo ser autônomo?", questionou. Um BC independente é atentado "à soberania", acrescentou a parlamentar.
O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho ( SE) disse que “ sob pretexto de ‘blindar’ a instituição de ‘ingerências políticas’, o que os parlamentares aprovaram foi a ‘autonomia’ em relação à soberania popular”.
“Estamos dando autonomia em relação ao governo, mas não estamos dando autonomia em relação ao mercado. Ou seja, haverá autonomia com relação à vontade popular, ao governo eleito. Mas não haverá autonomia em relação ao mercado e aos interesses comerciais para quem vai dirigir a política monetária do país”, afirmou o líder petista.
Carvalho destacou ainda que a proposta foi aprovada pelos senadores sem debate com a sociedade. Além dos seis dos seis senadores do PT, também votaram contra Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Fabiano Contarato (Rede-ES), Regufe (Pode-DF), Weverton Rocha (PDT-MA), José Serra (PSDB-SP) e Zenaide Rocha (Pros-RN).