Escrito por: Claudia Motta, RBA
Banco anuncia mais demissões. Presidente da federação dos empregados da Caixa faz "prognóstico ruim" do novo governo. Entidade move ação contra venda da Lotex
Em dezembro de 2014 a Caixa Econômica Federal tinha 101.484 empregados para atender 78 milhões de clientes. Hoje são 86.427 e esse número deve cair para menos de 85 mil bancários para cuidar de 102,6 milhões de contas.
Isso porque o banco público, responsável pela gestão do FGTS e de programas sociais como o Minha Casa Minha Vida (MCMV), anunciou mais um programa de desligamento de empregados (PDE) com o objetivo de cortar 1.626 postos de trabalho. Segundo comunicado da Caixa, a adesão dos bancários interessados deverá ocorrer entre 26 e 30 de novembro.
Já foram cinco programas de demissão ou de aposentadoria desde 2014. “De lá para cá a Caixa não contratou, sem falar nos que aposentam ou saem por outra razão. Perdemos 16 mil vagas de trabalho nos últimos três anos”, relata o presidente da Federação Nacional dos Associados da Caixa (Fenae), Jair Pedro Ferreira. “Isso automaticamente afeta as condições de trabalho de quem fica, porque não diminuem as demandas nas unidades.”
A pesquisa Saúde do Trabalhador da Caixa, realizada entre os dias 2 e 30 de maio de 2018, a pedido da Fenae, comprovou essa realidade: um em cada três empregados da instituição teve algum problema de saúde relacionado ao trabalho nos últimos 12 meses. As doenças psicológicas e causadas por estresse representam 60,5% dos casos.
“Por mais que a tecnologia seja muito forte, na Caixa esse efeito demora. É o banco que atende à população de modo geral, a máquina não substitui as pessoas, em especial os de baixa renda, os mais idosos. Essa política vai contra isso porque compromete o trabalho, o atendimento, as pessoas ficam mais tempo na fila. Onde é que nós vamos parar desse jeito?”
Jair lembra que nos últimos anos os trabalhadores de um modo geral vêm sofrendo muito ataque. E a visão de futuro é de preocupação.
“Os bancos públicos têm papel importante na sociedade. Quando fala em vender esses bancos ou tirar seu papel, não é só a questão corporativa que está pegando. Nós vamos ter comprometimento. Quem é que vai executar os programas sociais no país?”, questiona o presidente da Fenae, que desde 1989 é empregado do banco público.
“A Caixa tem quase 40% das suas receitas provenientes de programas sociais, da gestão do FGTS. Quando tiro isso da empresa pública perco a possibilidade de fiscalização. É preocupante porque todos os sinais que estão dados, com a indicação do novo presidente, tem histórico de retirar o papel das empresas públicas, a visão de que isso tem de ser papel dos bancos privados.”
Jair se refere à confirmação pelo governo Jair Bolsonaro de que Pedro Guimarães, um especialista em privatizações, presidirá o banco a partir de 2019. Indicado por Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, Pedro Guimarães é sócio do banco de investimento Brasil Plural e atua há mais de 20 anos no mercado financeiro na gestão de ativos e reestruturação de empresas. Na Caixa, especula-se que deverá iniciar sua gestão pela venda da área de cartões de crédito e de seguros.
“Convocamos empregados, entidades, todas as pessoas que sabem da importância da Caixa a se juntar e fazer o enfrentamento, porque ao que tudo indica vamos ter um esfacelamento muito grande desses serviços daqui para frente: lotérica, financiamento habitacional, MCMV”, lamenta o bancário, lembrando que são programas que atendem grande volume da população e em especial a baixa renda. “Porque a alta renda sempre vai ter banco pra atender.”
O presidente da Fenae conta ter participado de audiências públicas pelo país e ver estados que só têm a Caixa fazendo financiamento, principalmente no Norte, Centro-Oeste e Nordeste. “E um pouco do Banco do Brasil. Os bancos privados até arrecadam poupança dessas regiões e aplicam em outras”, critica. “Quem é que vai atender, que é que vai ajudar a equilibrar as desigualdades sociais. No nosso entendimento os bancos públicos, oferendo atendimento e crédito à população que vai ficar cada vez mais à mercê sem eles.”
O dirigente reforça a importância da presença do banco federal em praticamente todos os municípios brasileiros. “Isso tudo está em risco se eles resolverem fatiar a Caixa, que é o que está se desenhando. Posso até manter um banco pequeno, com 10 mil funcionários, mas praticamente sem seu papel tão importante”, afirma. “Sem os bancos públicos a tendência é ajudar a acelerar o aumento da pobreza, a falta de renda, cada vez menos oportunidades.
No próximo ano, de acordo com Jair Ferreira, a faixa 1 do MCMV (para famílias com renda de até R$ 1.800) terá recursos muito baixos, com encolhimento de carteira para a população que mais precisa. Também haverá corte de verba para o Fies (financiamento estudantil) e está previsto para 29 de novembro o leilão da Lotex, o setor de loterias da Caixa, que repassa 35% a 40% dos recursos para a previdência social, esporte, cultura, Apaes.
“A privatização quer aumentar a premiação para quem ganha, mas reduzir os repasses sociais. Estamos diante de um caos social se essas políticas todas forem implementadas como estão anunciando”, avalia o presidente da Fenae, que protocolou, na quarta-feira (22), ação civil pública contra o leilão.
“Até aqui fazemos um prognóstico muito ruim do novo governo. Vamos precisar de muita união, muita resistência, porque o cenário que se avizinha não é nada bom para o trabalhador, para o cidadão comum”, afirma Jair, para quem muitos dos empregados da Caixa que votaram em Bolsonaro, já mostram um certo arrependimento diante dos anúncios do novo governo em relação ao banco e o possível novo presidente da instituição pública.
“Mas nosso papel não é tripudiar de quem votou nesse ou naquele candidato. Pelo contrário, queremos nos juntar com todos porque o ataque a essas empresas, aos nossos direitos vem independente da coloração partidária ou da posição que tivemos no processo eleitoral.”
Uma das iniciativas em defesa do banco e dos bancários está sendo lançada pela Fenae em todo país, com debates em todo o país e via veículos de comunicação: a campanha Não Tem Sentido enfraquecer, fatiar, reduzir, privatizar a Caixa.