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Esquerda sul-americana e europeia avaliam limites da unidade

Debate tratou da importância de fortalecer os valores da democracia diante do avanço conservador no Brasil e no mundo

Publicado: 11 Dezembro, 2018 - 10h33 | Última modificação: 11 Dezembro, 2018 - 10h38

Escrito por: Vitor Nuzzi, da RBA

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Celso Amorim com Antonio Lisboa (CUT) e Isabel Moreira, de Portugal: é preciso superar diferenças

A necessidade de juntar forças é um consenso do grupo progressista, mas os limites dessas unidade ainda são controversos, de acordo com os pontos de vistas de representantes de partidos de esquerda que se reuniram na tarde desta segunda-feira (10), em São Paulo, em debate promovido pela Fundação Perseu Abramo.

Enquanto o espanhol Txema Guijarro, do Podemos, falou em um "cordão sanitário" para separar direita e social-democracia, por exemplo, o ex-ministro brasileiro Celso Amorim observou que "a linha divisória (da unidade) vai ter de se deslocar um pouquinho para a direita, ou nós não sobreviveremos". Também participaram a deputada Isabel Moreira, do Partido Socialista de Portugal, e o uruguaio Javier Miranda, presidente da coligação Frente Ampla. 

Na análise, todos chamaram a atenção não apenas para a ascensão do conservadorismo, inclusive da extrema-direita, mas com a capacidade de comunicação desse espectro político com a população. Para Amorim, existe "algum instrumento de comunicação popular que nós temos de entender e não apenas negar", que precisa ser "estudado e entendido do ponto de vista técnico – e psicológico". Para ele, a chamada direita populista abriu mão do discurso racional, "que é uma característica intrínseca da democracia".

O ex-chanceler, que na abertura fez referência ao assassinato de dois militantes sem-terra na Paraíba,neste fim de semana, observou que o fascismo à brasileira tem outra característica, adotando o neoliberalismo em seu discurso em vez de nacionalismo, com a defesa da privatização "extremada", sinônimo de desnacionalização. "Não há sequer o nacionalismo defendido por empresários nacionais."

Guijarro defende que, para somar forças e atrair também a população para a resistência, é preciso demonstrar que não se trata de uma "luta esotérica, mas uma luta pela sobrevivência", com base em pautas concretas, como o salário mínimo e a aposentadoria. Isso demonstraria "a utilidade do programa político que defendemos", uma utopia "republicana, fraternal, que cuida das pessoas".

A deputada socialista portuguesa – que no início de sua fala homenageou a vereadora carioca Marielle Franco, assassinada em março – afirmou que os direitos civis são indissociáveis da democracia, para acrescentar que no atual momento político "estamos a regredir historicamente", com uma agenda conservadora que avança sobre esses direitos. Mas ressaltou a vitória progressista nas eleições de 2015 no país europeu, com resultado de uma soma de forças que ganhou o apelido irônico de "geringonça".

"É geringonça, mas funciona", disse Isabel Moreira, arrancando aplausos do público. "Temos de esquecer nossas diferenças. É verdade que temos divergências entre nós, mas tínhamos e temos um objetivo, acabar com a (política de) austeridade. Temos de unir os democratas e os progressistas de esquerda", acrescentou o parlamentar, fazendo alusão às eleições brasileiras deste ano para afirmar que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o ex-ministro Ciro Gomes "perderam o momento histórico da vida deles".

Líder da Frente Ampla uruguaia, Javier Miranda disse que a ameaça à democracia não é um fenômeno novo e chamou a atenção para o crescimento da "antipolítica". Segundo ele, também é preciso compreender que "há um processo de transformação profundo dentro do modo de produção capitalista" e um debate sobre o mundo que se quer ter. Mas não há democracia sem liberdade – de expressão, organização, comunicação. O político também destacou a "relação estrutural" entre democracia e direitos humanos, observando que "a maioria não legitima um discurso antidemocrático".

"A unidade para nós é um valor essencial", afirmou Javier. "Temos diferenças? Temos. Nos peleamos? Muitíssimo."

Encerrado o debate, mediado pelo secretário de Relações Internacionais da CUT, Antonio Lisboa, todos seguiram para a sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo, onde à noite será realizado um ato pela liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A atividade integra a Conferência Internacional em Defesa da Democracia, em celebração dos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Haverá ainda um debate nesta terça-feira (11) pela manhã, com a presença da ex-presidenta Dilma Rousseff, do dirigente italiano Giacomo Filibeck (Partido Socialista Europeu), da espanhola Maite Mola (Partido da Esquerda Europeia) e do ex-deputado Virgilio Hernándes (da Revolução Cidadã, do Equador).