Evento em homenagem à Constituição de 1988 engrossa coro pela liberdade de Lula
Convidados como Adolfo Esquivel, prêmio Nobel da Paz, estiveram em Curitiba para denunciar violações ao processo legal
Publicado: 19 Abril, 2018 - 09h41 | Última modificação: 19 Abril, 2018 - 09h45
Escrito por: Daniel Giovanaz, Brasil de Fato Curitiba (PR),
O teatro da reitoria da Universidade Federal do Paraná (UFPR) recebeu na noite desta quarta-feira (18) o evento “Direitos Fundamentais, a Democracia e a Constituição da Primavera”, em homenagem aos 30 anos da Constituição Federal de 1988. Participaram do debate o teólogo Leonardo Boff, o diplomata e ex-ministro da Defesa, Celso Amorim, a diretora da Faculdade de Direito da UFPR, Vera Karam de Chueiri, e a deputada argentina Paula Cecilia Merchán. Em seguida, subiu ao palco o argentino Adolfo Pérez Esquivel, ganhador do prêmio Nobel em 1980 pelo enfrentamento aos crimes de tortura e desaparecimento de militantes políticos praticados pelas ditaduras militares na America Latina na década de 1970.
Além de celebrar os avanços e contribuições da Carta Magna no processo de superação da ditadura civil-militar, os convidados elencaram as recentes violações aos direitos fundamentais no Brasil e discutiram caminhos para a resistência.
Motivos para lutar
Merchán cumprimentou os 700 espectadores e citou a prisão do ex-presidente Lula em tom de lamento: "Infelizmente, vivemos uma situação parecida na Argentina, onde também temos presos políticos”. Em seguida, reforçou a importância da solidariedade entre os povos. Na plateia, também estava o prêmio Nobel da Paz argentino Adolfo Esquivel, anunciado nos microfones e ovacionado pela plateia.
O pronunciamento do ex-ministro Celso Amorim foi um alerta para o avanço da intolerância política no Brasil. "Vivemos um momento novo, em que o neoliberalismo aparece com traços de fascismo”, declarou. “E essa manifestação de solidariedade, de crença numa verdadeira primavera democrática, nos dá esperança”.
Para o diplomata brasileiro, uma das maiores dificuldades da atual conjuntura é o esvaziamento de debate político. Amorim citou o presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulisses Guimarães, como exemplo positivo de tolerância e respeito. "Ele não era um homem de esquerda, mas um homem de centro”, ponderou. "Hoje está até difícil encontrar democratas fora das forças progressistas”. Para concluir, o ex-ministro lembrou os retrocessos na política externa para decretar: "Temos que lutar por Lula livre, Brasil independente e América Latina solidária”.
O povo como intérprete
Vera Karam de Chueiri, professora de Direito Constitucional, ressaltou ameaças recentes ao devido processo legal. "As pessoas não podem estar sujeitas ao exercício arbitrário do poder por meio das instituições governamentais e seus agentes”, disse. Ao recordar o golpe contra a presidenta eleita Dilma Rousseff (PT), em 2016, ela afirmou que os membros do parlamento "romperam com as regras do processo democrático e fizeram dos princípios republicanos uma quimera”.
A diretora da Faculdade de Direito da UFPR não citou nominalmente a Lava Jato e seus operadores, mas declarou que a prisão de Lula foi resultado de "um expediente para aniquilar a democracia”. Para finalizar seu pronunciamento, a professora criticou o papel desempenhado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como suposto guardião dos princípios constitucionais. "Nós, o povo, somos os legítimos intérpretes da Constituição, e não podemos ser demitidos desta tarefa”, finalizou.
Barbárie
O teólogo Leonardo Boff celebrou a presença de argentinos e argentinas no debate: “Não é fácil alguém, por solidariedade, vir de tão longe". Em seu pronunciamento, ele também demonstrou preocupação com o avanço do fascismo. "São tempos de barbárie e de inumanidade. Nunca na nossa história houve tanta discriminação, tanta violência. E esse ódio vem dos descendentes da Casa Grande”, disse.
Ao citar as injustiças contra Lula, a quem veio visitar em Curitiba, o teólogo fez uma promessa em nome dos amigos de longa data do ex-presidente: "Vamos lutar para levar o sonho e a causa dele adiante, que era a causa dos marginalizados”.
Lula Livre
Os debates foram intercalados por uma vasta programação artística e cultural, com canções populares latino-americanas que foram entoadas pela plateia. A atriz Leticia Sabatella também subiu ao palco e agradeceu aos curitibanos que lotaram o auditório: “'É bom saber que nós não estamos sozinhos”.
Em um dos intervalos, o presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Darci Frigo, mandou um recado ao amigo Edson Fachin, juiz do STF, um dos responsáveis pela prisão política de Lula: "Aquele que está lá no STF não é o Fachin que nós conhecemos. As suas decisões estão causando muito sofrimento ao povo brasileiro”, explicou. “Fachin, nós precisamos que você volte às suas posições históricas”, suplicou Frigo, em um dos momentos mais comoventes da noite.
Adolfo Pérez Esquivel iniciou seu discurso de forma direta e sucinta: “Estamos aqui para pedir a liberdade do companheiro Lula”. O prêmio Nobel argentino mencionou o caso Marielle Franco não só como símbolo de injustiça social, mas como semente para a luta contra a discriminação e a intolerância.
Todo o pronunciamento de Esquivel foi permeado por mensagens positivas, de força e esperança para enfrentar o imperialismo e a miséria: “Um outro mundo é possível. Um mundo com consciência crítica, com valores”, sintetizou. Para finalizar, ele endossou a campanha para que Lula também seja agraciado com o prêmio Nobel da Paz, em retribuição às políticas públicas de combate à pobreza: “Seria um grande ato de reconhecimento”.
Ao final do evento, os participantes depositaram flores sobre um painel pintado por Esquivel. Nesta quinta-feira (19), as flores, símbolos de resistência, serão levadas ao acampamento Lula Livre, próximo à sede da Polícia Federal (PF) no bairro Santa Cândida.