Escrito por: CNTE
Pânico com divulgação de notícias falsas aumenta possibilidade de casos de violência
Os ataques a escolas de São Paulo e Santa Catarina, entre março e abril deste ano, deixaram cinco mortos e levaram medo à comunidade escolar e às famílias dos estudantes. A partir da sensação de insegurança, a União, estados e municípios se mobilizaram para trazer uma resposta rápida e novamente apostaram nos investimentos na polícia e em seguranças armados.
No entanto, experiências em outros países, como nos Estados Unidos, diante do mesmo problema, demonstraram que o pânico e a circulação de notícias falsas só ajuda a alimentar iniciativas de quem apoia a militarização e o aumento da circulação de armas na sociedade.
Em abril, o ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP) anunciou a liberação de R$150 milhões para ampliar a atuação das rondas escolares. No mesmo mês, o governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), afirmou que todas as escolas estaduais terão ao menos um policial armado em até junho. A iniciativa deve recrutar policiais militares da ativa e aposentados.
Em São Paulo, o deputado estadual da base do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), Guto Zacarias (União Brasil), apresentou um projeto de Lei que autoriza policiais militares de folga a atuarem como seguranças armados em escolas paulistas de forma remunerada.
Reportagem da BBC sobre o tema apontou que, segundo o jornal estadunidense Washington Post, nos Estados Unidos, desde 1999, quando dois estudantes atiraram contra colegas na Columbine High School, um marco para a tendência de violência escolar no país e no mundo, ocorreram ao menos 377 ataques no país.
Em 2021, as unidades educacionais americanas investiram U$ 3,1 bilhões com sistemas e serviços de vigilância e proteção, aponta a consultoria de mercado tecnológico OMDIA. Dados do Centro Nacional de Estatísticas da Educação do governo do país também apontaram, que entre 2017 e 2018, apenas metade das escolas tinha controle total do acesso às dependências. Enquanto em 2023, a taxa de monitoramento via câmeras alcança quase 100% delas.
Além disso, 43% das escolas públicas possuem o chamado "botão de pânico", 78% dos colégios têm salas equipadas com fechaduras capazes de permitir trancamento interno e 65% têm funcionários exclusivamente dedicados à segurança.
Apesar do investimento bilionário e crescente em ações de segurança, 2022 foi um dos anos com maior número de ataques, 47 ao todo.
De acordo com uma pesquisa publicada em 2019 na revista científica Journal of Adolescent Health, que revisou 179 episódios de tiroteios em escolas americanas entre 1999 e 2018, manter guardas armados na escola não reduziu o número de vítimas em massacres.
Para piorar, uma análise do Instituto Nacional de Justiça dos EUA, publicado em 2021, apontou que o número de mortes em escolas com guardas armados tendia a ser quase três vezes maior do que naquelas sem seguranças armados.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) defende medidas como a criação urgente de um canal para denúncias e a constituição de equipes com a presença de profissionais da área de segurança, da educação, familiares e estudantes para identificar potenciais alunos e alunas com comportamento potencialmente violento.
Paralelo a isso, também é necessário investir na presença de psicólogos para acompanhar as relações escolares e impedir que aproveitadores tentem emplacar propostas que possam ampliar o problema, como destaca a Secretária de Assuntos Educacionais da CNTE, Guelda Andrade.
“Há pessoas que têm se utilizado desse cenário para reforçar a tese da militarização e de guardas armados no chão da escola. Precisamos manter a calma e os pais precisam acompanhar de perto o que seus filhos acessam na internet, ao invés de repercutir o nome dos autores de ataques ou dar publicidade a fake news que contribuem para o pânico geral. Quando recebemos alguma denúncia de possível ação violenta, precisamos enviar para a polícia e ao Ministério Público. Porque esse é o papel da polícia, investigar, e não estar dentro das escolas”, pontua.
Outra bandeira importante da CNTE sobre o tema é a revogação do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (PECIM) implantado nos governos anteriores. A confederação e outras entidades que lutam em defesa de uma escola pública e de qualidade também cobram o fim do programa.
Em reportagem publicada pelo Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF), a diretora Luciana Custódio alerta para os riscos encontrados em saídas simplistas, destaca que medida emergencial não resolve e aponta para a necessidade de construir ações coordenadas e ampliar o investimento em educação.
“Não se combate violência nas escolas sem uma política forte voltada para a valorização da educação, estruturação das escolas com profissionais suficientes. Infelizmente, as escolas têm vivido entre colapsos, com turmas superlotadas, profissionais que não são do quadro efetivo, com alta rotatividade, que não interagem e conhecem a comunidade em que atuam. Precisamos de uma política pública preventiva, de parceria, entre as secretarias de Educação, Desenvolvimento Social e Saúde, para atuar com as famílias e jovens que estão em áreas de vulnerabilidade social, mapear essas famílias”, diz.
Enquanto isso, na contramão do que defendem estudiosos sobre o tema e sem dialogar com a comunidade escolar, governadores de ao menos 22 estados já adotaram a segurança armada nas escolas públicas.
Em abril, o MJSP, em parceria com organização não-governamental SaferNet Brasil, criou um canal na internet para receber denúncias de ataques contra escolas. As informações recebidas são analisadas pela equipe do Ciberlab, da Secretaria Nacional de Segurança Pública, e se tornam um importante aliado também na luta contra as fake news.
Guelda ressalta que a divulgação e compartilhamento de notícias falsas e alarmistas por redes sociais como WhatsApp, apenas aumentam o pânico e ampliam o poderio dos grupos da extrema-direita que lutam pela militarização das escolas e do cerceamento da liberdade.