Escrito por: Érica Aragão

Filas enormes para sacar R$ 600 na Caixa podem piorar problema de saúde pública

Desesperadas e sem amparo, milhares de pessoas se aglomeraram em filas para sacar Auxílio Emergencial aprovado pelo Congresso justamente para garantir a quarentena

Sindicato dos Bancários do Pará
Fila da Caixa em Santarém no Pará nesta segunda (27)

Milhares de pessoas se aglomeraram em filas gigantescas em frente as agências da Caixa Econômica Federal em todo o país, nesta segunda-feira (27), dia que o banco começou a liberar o saque do Auxílio Emergencial de R$ 600,00 para trabalhadores e trabalhadoras informais e de baixa renda que não têm conta em banco.

Neste primeiro dia, podem retirar o benefício, aprovado pelo Congresso Nacional em março, para ser pago durante três meses,  período de isolamento social para conter a disseminação do novo coronavírus (Covid-19) , os trabalhadores nascidos nos meses de janeiro e fevereiro.

Os trabalhadores também podem usar o aplicativo CAIXA Tem para pagar contas ou transferir o dinheiro, mas, no desespero ou por falta de informação, a maioria preferiu se arriscar e ir para a porta do banco, sem máscaras ou qualquer outro tipo de proteção, sem respeitar o distanciamento mínimo para não ser infectado. E nas filas tinham crianças de colo, homens, mulheres, idosos e jovens que esperam há mais de um mês a burocracia do governo de Jair Bolsonaro liberar o dinheiro para que consigam sobreviver com o mínimo de dignidade durante o isolamento social.

Confira nas imagens feitas pelo Sindicato dos Bancários do Pará, as filas que se formaram em frente a agência da Caixa em Santarém.

E em São Paulo não foi diferente. Filas enormes começaram a se formar em todo o Estado durante a madrugada. Na periferia da capital paulista, beneficiários chegaram a ficar mais de 5 horas esperando para ser atendidos.

Em Santo André, no ABC Paulista, imagens feitas pelo presidente do Sindicato dos Bancários no ABC, Belmiro Moreira, que também é secretário de Comunicação da CUT-SP, mostram a aglomeração de pessoas na agência da Caixa do bairro Luzita.

 

Para a representante dos trabalhadores e das trabalhadoras no Conselho da administração da Caixa, Rita Serrano, essa situação traz duas grandes preocupações. Primeiro porque coloca os funcionários do banco em risco de contágio da doença, porque estão na linha de frente atendendo a população, e segundo, que para ela é ainda mais grave, é que a fila pode virar um problema de saúde pública.

“Estas filas que estão dobrando esquinas em todo país estão aglutinando pessoas, sem equipamentos de proteção e sem respeitar o distanciamento social, e pode virar um ponto de proliferação do vírus para toda a sociedade”, afirma.

Segundo ela, apesar da Caixa ter atendido a solicitação dos sindicatos da categoria e ter distribuído máscaras de proteção para os trabalhadores diretos e terceirizados do banco e colocado 70% da categoria em home office para amenizar os riscos de contágio da doença, não é responsabilidade do banco os cuidados que a população deve ter ao sair na rua.

“Como é um benefício do governo federal ele deveria, com apoio do governo do Estado e do município, distribuir mascaras e álcool em gel para a população nas filas ou até mesmo descentralizar este saque neste momento de calamidade”, afirmou Rita.

“Outros bancos poderiam ajudar a distribuir este benefício, porque além de evitar aglomerações, ajudariam também a acelerar o saque do auxílio aos que têm pressa para receber porque não tem mais recursos para sobreviver durante esta pandemia”, disse.

Desinformação e canseira para acessar benefício

Uma moradora do Ipiranga, que não quis se identificar, disse ao Portal CUT que nem conseguiu acessar o aplicativo “Caixa Tem”, no qual poderia fazer transferência do benefício para outro banco.

“Eu tenho 74 anos e não tenho renda nenhuma. Já fui ao banco duas vezes para pedir informação e pediram para retornar hoje que eu poderia sacar, mas esta fila me assustou e eu vou voltar para casa sem nenhum centavo. O governo já deu canseira até a aprovação do auxílio e agora nos deu mais essa canseira hoje”, contou ela, que mora com filho, marido e uma irmã deficiente.

Ela disse que não consegue acessar o CAIXA Tem porque é preciso um código para o saque. E neste caso, antes de ir a uma agência da Caixa, ficando exposto ao novo coronavírus, o trabalhador ou a trabalhadora pode ligar para o 0800-7260101 ​do banco, pedindo orientações. Muitos não sabem ou não conseguem contato.

Segundo Rita, a desinformação é outro fator que pode desencadear em outros problemas ainda maiores.

 “Mais de 40 milhões de pessoas já receberam o benefício, mas outras milhões ainda vão receber e este problema pode piorar se o governo não fizer sua parte direito. Não adianta dizer que paga o benefício e não proteger a população nem facilita a divulgação de informações”, ressaltou.

Doença na categoria

Rita também nos contou que até semana passada, já eram 60 casos confirmados de Covid-19 entre trabalhadores e trabalhadoras da Caixa, em sua grande maioria em São Paulo, fora os casos de subnotificações.  

O Sindicato dos Bancários no Pará soltou uma nota nesta segunda informando sobre a primeira morte por Covid-19 na categoria no Estado.

Segundo a entidade, Elíada Albuquerque era bancária do Banco da Amazônia, completou 54 anos no último dia 4 e morreu neste domingo (26), após passar vários dias internada no hospital de campanha no Hangar com a Covid-19.

Rita disse que os 60 casos diante do número total de trabalhadores pode até ser irrelevante para muitos, mas que os casos podem aumentar de forma acelerada com este saque do auxílio.

“Até a semana passada eram dois óbitos em todo país na categoria, mas com esta procura no atendimento da Caixa para receber o benefício o risco de contágio entre os trabalhadores pode aumentar consideradamente”, destacou.

Adoecimento psicológico

Outra questão que vem preocupando a categoria e toda sociedade é o adoecimento mental dos profissionais que estão na linha de frente contra o Covid-19.

Perguntada sobre os casos de doenças mentais, Rita disse que acha que todo mundo vai adoecer psicologicamente neste momento de pandemia no país, e que não tem como medir agora a quantidade de trabalhadores e trabalhadoras que já adoeceram.

“Não só os trabalhadores e trabalhadoras da Caixa ficarão doentes psicologicamente, os da saúde e a sociedade também correm sérios riscos de adoecerem porque além do estresse do dia a dia da pandemia, o isolamento social e a pressão no trabalho dificultam manter a saúde mental”, afirmou Rita.

Pressão para retorno ao trabalho

Rita também alertou que com essa exclusividade da Caixa pagar os benefícios, os gestores do banco têm pressionado a categoria que está de home office a voltar ao trabalho.

“A alta demanda faz com que os gestores pressionem os trabalhadores e as trabalhadoras para voltar a sede do banco para ajudar no atendimento e isso é outro motivo para levar a categoria a ter mais casos de problemas na saúde mental. Estamos atentos e estamos dispostos a continuar a luta e a defesa dos trabalhadores porque são vidas que estão em jogo”, alertou Rita.