Escrito por: Rosely Rocha

Frases de Bolsonaro são “sincericídios” sobre neoliberalismo no país, diz Pochmann

Para Marcio Pochmann, declarações de Bolsonaro sobre país estar quebrado e que trabalhador brasileiro não está preparado são “sincericídios” de quem tem de rezar pela cartilha neoliberal

Edson Rimonatto (Rima) / CUT Brasil

O Brasil começou a primeira semana do ano ouvindo as já controversas declarações do presidente sobre a situação econômica do país e a terceirização de suas responsabilidades. Para Jair Bolsonaro (ex-PSL) nada de ruim que acontece com o Brasil é de sua responsabilidade, seja o fim do auxílio emergencial, o aumento do desemprego, a falta de vacinas contra a Covid-19 e o calote dado ao aporte previsto no Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), instituição financeira criada pelos cinco países do grupo do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

Na última quarta-feira (5), Bolsonaro soltou duas pérolas “Brasil está quebrado e eu não consigo fazer nada”, sobre o fim do auxílio emergencial e a impossibilidade de cumprir promessa de campanha de cobrar impostos para quem ganha a partir de R$ 5.000,00 ( hoje a alíquota do IR é paga a partir de R$ 1.900,00); e “ que o Brasil é um país difícil trabalhar. Quando fala em desemprego, né, [são] vários motivos. Um é a formação do brasileiro. Uma parte considerável não está preparada para fazer quase nada. Nós importamos muito serviço".

Essas declarações são consideradas “sincericídios” – uma mistura de sinceridade com suicídio – pelo presidente do Instituto Lula, o economista, Marcio Pochmann, por que Bolsonaro tem de manter a cartilha neoliberal econômica que o elegeu.

“É uma espécie de ‘sincericídio’ por que dentro do neoliberalismo, ele não tem saída. Está impossibilitado de mudar o receituário neoliberal econômico que o elegeu e o mantém prisioneiro, e por isso ele não pode fazer nada”, afirma o presidente do Instituto Lula.

Segundo Pochmann, politicamente Bolsonaro está “preso” ao centrão, bloco fisiológico de parlamentares da Câmara e Senado Federal, de centro-direita e extrema direita, que costuma aderir ao governo em troca de cargos, por ter saído do PSL , se unindo ao grupo para manter a maioria do Congresso fiel a ele.

Como não quer perder a popularidade com o auxílio emergencial, mas também não quer perder o apoio da maioria no Congresso, que reza pela cartilha neoliberal, defende o teto de gastos públicos e é avessa a políticas públicas, Bolsonaro joga com frases de efeito para dizer que a responsabilidade não é dele, quando, na verdade, faz tudo de maneira pensada, tentando manobrar a opinião pública.

“Os resultados das últimas eleições municipais em que os partidos deste bloco ficaram com 45% das prefeituras e 2/3 dos prefeitos foram reeleitos mostram a força do centrão que Bolsonaro não quer dispensar”, analisa.

Pochmann diz que o Brasil não está quebrado e que Bolsonaro usou uma interpretação bancária, financeira, utilizada nos anos de 1980 que definia os países latino-americanos endividados e não conseguiam pagar suas dívidas no exterior.

“Como ele não tem saída por causa do teto de gastos e ainda assim aumentou o déficit público, Bolsonaro adota como resposta para a crise o mesmo discurso de alguns economistas, de que a saída é vender, privatizar, de que está quebrado”, afirma Pochmann.

Desculpa para alta do desemprego é a mesma de FHC e Temer

Ao desqualificar o trabalhador e a trabalhadora brasileiros dizendo que eles não têm preparo, por isso a alta do desemprego que está em 14,6%, o atual presidente da República adota o mesmo discurso do tucano e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) e do golpista Michel Temer (MDB-SP) que sob seu governo aprovou a reforma Trabalhista que retirou mais de cem direitos que estavam na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), acredita Pochmann.

“FHC chamava os trabalhadores de ‘impregáveis’ e os aposentados de vagabundos. Uma visão errônea de que teria emprego em qualquer esquina e as pessoas não se qualificaram para a vaga. Sob Temer, o argumento era de que a legislação trabalhista impedia o patrão de ter flexibilidade por ter de pagar ‘muitos direitos’. Hoje o custo do trabalhador brasileiro é menor do que o da China e o resultado da reforma Trabalhista, que prometeu abrir seis milhões de vagas, está aí”, diz.

Bolsonaro só repete o discurso neoliberal de que o problema do desemprego é o despreparo e desqualificação do trabalhador- Marcio Pochmann

Brasil deixa protagonismo no cenário mundial

Outra polêmica envolvendo o governo Bolsonaro é o calote de US$ 292 milhões para o pagamento, que venceu no último dia 3, da penúltima parcela de aporte junto ao Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), instituição financeira que o Brasil ajudou a fundar junto com os outros quatro países do grupo do Brics ( Rússia, Índia, China e África do Sul), e do qual é um dos acionistas.

Pochmann diz que embora não saiba quais as bases do acordo do banco com o Brasil, a decisão do governo tira do país mais um pouco do protagonismo internacional conquistado no governo Lula.

“O BRICS é uma referência importante, uma alternativa ao sistema monetário mundial. O calote é uma consequência do próprio esfriamento do bloco desde o governo Temer. Com isso o Brasil perde relevância e o mundo nos vê como um país que não dá para confiar, que não paga seus débitos”.

As declarações de Bolsonaro indicam que ele repete Jânio Quadros [ex-presidente] que dizia que forças ocultas o impediam de governar. Bolsonaro só tenta arrumar uma desculpa para virar o jogo em seu favor- Marcio Pochmann