Escrito por: Isaías Dalle
Isso porque o dinheiro é quase todo aplicado em repressão. Confira entrevista com Fernanda Magano, psicóloga prisional e presidenta do Sindicato da categoria em São Paulo
No Brasil, mídia e amplos setores da sociedade costumam tratar as questões de criminalidade e prisão segundo uma máxima conhecida dos filmes de western: “bandido bom é bandido morto”.
Mesmo diante de pesquisas que apontam em outra direção, como a anunciada na última quinta-feira, dia 12, pela ONG Internacional Human Rights Watch, que denunciou a superlotação das cadeias brasileiras e a total desumanidade do sistema, o tom do noticiário, ainda que nas entrelinhas – como no Jornal Nacional daquela noite – aponta que a solução seria, então, aumentar o número de vagas. Longe dos microfones, não são poucos os que dizem que a solução seria mesmo simplesmente matar.
A crise penitenciária brasileira, com as recentes matanças na Região Norte, trouxe de volta à tona o problema que se quer esquecer. Na principal capital do país, o prefeito recém-eleito ganhou a campanha prometendo, entre outras coisas, empurrar os viciados em drogas para embaixo do tapete.
Tudo muito longe do que pensa Fernanda Lou Sans Magano, presidenta do Sindicato dos Psicólogos do Estado de São Paulo, filiado à CUT, e psicóloga prisional de profissão. Funcionária concursada da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária, Fernanda jamais conseguiu liberação oficial para a atividade sindical – o que demonstra, em parte, o perfil dantesco do sistema prisional brasileiro.
Portanto – mas não só por isso – ela costuma frequentemente estar no interior de presídios. Um pouco dessa experiência e formas de mudar a situação você pode acompanhar na entrevista a seguir:
CUT: Fernanda, conte um pouco sobre o seu trabalho.
Fernanda: Eu sou psicóloga, sou concursada na Secretaria Estadual da Administração Penitenciária (de São Paulo) e entrei para o sistema pós-massacre do Carandiru. Já estou nessa estrada há 24 anos.
O massacre do Carandiru e sua entrada no sistema foram coincidências ou aquilo te motivou a entrar?
Fernanda: cuidado com a saúde mental deveria estar entre as prioridades. Foto: Roberto Parizotti
A vida foi te levando pra isso ou você se sentia vocacionada?
Durante a formação, alguns professores foram nos chamando a atenção para essa questão da segurança e da violência, para esse trabalho com recorte de políticas públicas e isso foi chamando minha atenção e me preparando para entrar nessa área, onde poucos se dispõem fazê-lo. Vocacionada eu não diria, mas eu me senti preparada, sim, para trabalhar.
Quantos psicólogos como você atuam nessa área aqui no Estado de São Paulo?
Esse número tem caído bastante, porque poucos se habilitam ao concurso e as pessoas vão se aposentando. Não passam de 220, num sistema que tem 160 unidades, não passam de um ou dois por unidade.
Que tipo de atendimento vocês prestam?
A Lei de Execução Penal é que vai permitir a entrada do profissional. A organização da lei, cuja primeira versão é de 1984 e a segunda, de 2003, prevê uma comissão técnica de classificação, para progressão do regime, ou seja, avaliação para a passagem do regime fechado para o regime semiaberto e do semiaberto para o aberto. Na primeira versão da lei essa comissão era obrigatória para toda a população carcerária, então para a progressão de pena, o preso ou a presa teriam de passar necessariamente por essa comissão. Na segunda versão, o exame é facultado, ou seja, o Poder Judiciário, o juiz, dependendo do tipo de delito cometido, solicita o exame. Senão, a progressão passa a ser automática, baseada em bom comportamento ou lapso de pena cumprida. Um exemplo, para ficar claro: um assaltante tem pena mínima de cinco anos e quatro meses, se é réu primário, cumpre seis a 11 meses e já pode passar para o regime semiaberto. Isso é o que é chamado de dosiometria penal. Se o crime é mais grave, o tempo de regime fechado aumenta.
Me parece que com a diminuição do papel do psicólogo, houve um afrouxamento dessa progressão.
Na verdade, há sim uma certa licenciosidade para que isso aconteça, especialmente em tempos de facção criminal, em que ter boa conduta passa a ser fazer parte da facção. Ou aqueles que têm um bom trânsito dentro da unidade, mesmo sem fazer parte da facção, passa a ser sinônimo de boa conduta. Por outro lado, há todo um debate sobre o fato de o exame, por não ter as condições objetivas para acontecer da forma como deveria, passava a ser muito mais um instrumento que o Judiciário se utilizava como anteparo para se proteger e não se manifestar.
Por quê?
Porque a lei diz que o detento, ao chegar na unidade, passaria por uma primeira fase de exame para se conhecer a personalidade e se produzir um dossiê. Então a unidade deveria fazer um programa individualizado de penas – trabalho, programas de educação, cela em separado, separação por tipo de delito – e isso tudo é história da carochinha. É fábula, nada disso acontece. O segundo exame, que é o de progressão de pena e que deve ser feito por essa tal comissão de classificação, passa a ser muito mais baseado na relação do preso com o sistema prisional do que na relação delito-delinquente. Então, vem com uma série de mazelas que o próprio sistema prisional já gerou naquela pessoa. Então, é um trabalho que do ponto de vista psicológico, científico, não tem sentido. É mais uma chancela para o Judiciário. Tanto que o debate no Conselho Federal de Psicologia, por um tempo, foi se posicionar contrariamente a esse exame criminológico e que o trabalho da psicóloga, do psicólogo ou da assistente social deveria um olhar mais crítico sobre os efeitos do capitalismo e dos processos sociais exclusórios que levaram aquele indivíduo a cometer crime.
Como se daria essa nova abordagem?
Por atendimentos na área de saúde, de saúde mental e de reinserção social. A estrutura do sistema acaba virando máquina de moer carne. O cara entra pro sistema e aí ou é batizado pela facção ou vira irmão, primo ou outra ligação de proximidade para poder sobreviver naquela estrutura, ou ele vai pro MPS – medida protetiva de segurança, no jargão formal – ou pro seguro, como é dito no jargão do movimento criminal. Ele fica retirado da população porque vira inimigo da facção. Então, essa estrutura não proporciona as condições para um processo reeducativo. Para que então serviriam os profissionais da área técnica?
Como você, e o próprio movimento dos psicólogos, imaginam uma saída para esse verdadeiro caos, para essa situação que parece insolúvel?
Não me arriscaria a dizer que a gente tem uma solução. O pouco que a gente tem procurado se pautar é que esse discurso repressivo/punitivo é muito ruim, porque ele é generalizante e vai levando à pratica de que o Poder Legislativo coloque em pauta o aumento dos anos de pena a ser cumprido, a retirada da progressão de pena de regime e alguns até se arvorem o direito de defender pena de morte – que na prática já existe, via facções criminais, como a gente viu na última semana. Então, nosso debate é: alguns crimes, de fato, podem ficar para esse direito penal mais repressivo. Alguns crimes têm de estar no direito penal mínimo. Temos que evitar que esse sujeito entre pra prisão, por intermédio de penas alternativas, porque essa roldana da prisão só vai piorando os indivíduos.
Quais seriam os crimes destinados a um sistema punitivo mais rígido?
O próprio direito penal já diz: seriam os crimes hediondos. Assassinato, sequestro e o tráfico de drogas – e neste último ponto reside outra polêmica: nós temos uma lei antidrogas que foi reformulada em 2006 e que tinha a pretensão de separar o usuário de drogas do traficante. Na lei, em seu artigo 28, desenha-se inclusive o encaminhamento do viciado para tratamento de saúde e mental – o que chamávamos carinhosamente de ‘vara terapêutica’. Mas isso não saiu do papel. E hoje, inclusive, há quem pegue o gancho do tratamento terapêutico para tentar piorar a situação. Como o senhor Osmar Terra (atual ministro do Desenvolvimento Agrário), que é médico e dono de comunidade terapêutica, que tem um projeto de lei para mudar o Sisnad (Sistema Nacional de Políticas sobre DrogasMuitas vezes a família depende - e incentiva - a participação de algum integrante no crime. Foto: Agência Brasil
Chama atenção o fato de que duas mudanças na lei, primeiro na lei de execuções penais em 2003 e depois na chamada lei das drogas, em 2006, tenham ocorrido em governos democrático-populares. Tem ligação direta ou, por falta de condições objetivas, outros setores se apropriam das tentativas bem intencionadas para endurecer ainda mais a legislação?
É exatamente isso. Quando houve a mudança na lei de execuções penais, havia um amplo debate sobre esse exame psicológico dos detentos, a forma como era feito. Por exemplo: para um detento que estava há cinco anos no sistema carcerário e que nunca tinha passado por um exame desses, tinha-se a pretensão – e muitos de nós se recusam a fazer isso – de traçar um perfil psicológico dele numa sessão de trinta minutos. Eu mesma me recuso a fazer isso. Se precisar atender várias vezes, eu vou atender. Se precisar atender a família, eu vou atender. É dever nosso olhar essa pessoa como indivíduo e sua história, o que o levou a cometer um delito. Isso não quer dizer “passar a mão na cabeça”. É reconhecer o ilícito, reconhecer que a pena é necessária, mas avaliar como essa pena não será reforçadora de outros ilícitos. Então, essa mudança na lei, em que o exame criminológico deixa de ser obrigatório, por um lado vemos como positivo. Mas aí vêm as distorções, pois passa a ser usado por juízes, especialmente os mais inseguros, para se proteger. Mesmo para um réu primário, há juízes que pedem o exame criminológico. Também na mudança na chamada lei de drogas, havia uma intenção positiva. Devemos considerar igualmente que a tramitação de leis tem um longo processo, inclusive parte dela começou antes dos governos democrático-populares. E a coisa que mais pega nessa lei antidrogas, por conta da apropriação dos reacionários, é que havia a proposta inicial de estabelecer a quantidade de drogas apreendida com uma pessoa para diferenciar quem é viciado, usuário, de quem é traficante. E essa quantificação nunca foi estabelecida. Isso ficou na esfera do subjetivo.
Nas ruas, há uma crença quase generalizada que essa diferenciação entre usuário e traficante existe. Quer dizer que não funciona?
Não funciona e o que ocorre é que muitas vezes o usuário recebe a pena mínima como traficante. E aí essa pessoa entra pro sistema penitenciário e acaba descobrindo novas formas de ilícito ou se filiando a uma facção. Sem falar que isso favorece a prática de proteger aquele que tem grandes quantidades mas tem trânsito nas altas esferas, e que acaba ficando apenas como testemunha do ato de apreensão, e prende-se o pequenininho, o pé-de-chinelo. Até porque grande parte daqueles que hoje estão nas ruas vendendo droga é o usuário que, para sustentar seu vício, acaba reproduzindo a prática. (Leia aqui reportagem que demonstra a diferença de tratamento em geral dada aos brancos ricos e aos negros pobres quando flagrados com drogas).
A coisa que mais pega nessa lei antidrogas, por conta da apropriação dos reacionários, é que havia a proposta inicial de estabelecer a quantidade de drogas apreendida com uma pessoa para diferenciar quem é viciado, usuário, de quem é traficante. E essa quantificação nunca foi estabelecida.Fernanda Lou Sans MaganoSe a lei de drogas tivesse sido aprovada como desejado e estivesse sendo aplicada como deveria, qual seria o tratamento dado a esse que seria considerado apenas usuário?
Havia toda uma formulação, que ia sendo construída em paralelo, que consistia na consolidação da rede de CAPS (Centro de Atendimento Psicossocial) e previa também que a rede de CAPS Álcool e Drogas tivesse atendimento para quem tivesse envolvimento com delitos e com um processo condenatório. E aí também tem todo o debate sobre a descriminalização, que começaria com a maconha e depois iria evoluindo. Isso se aproximaria dos modelos europeus que já desenvolveram uma abordagem nova para o tema e que cuida da saúde e da saúde mental do usuário para sua reinserção na vida.
Os países onde essa diferenciação é bem delineada me parecem aqueles mais avançados em termos de igualdade social...
E de políticas públicas.
Existe algum país com características semelhantes ao Brasil, em termos de desigualdade, que tenha adotado uma política de drogas semelhante à dos países desenvolvidos?
Eu desconheço.
O que vem antes? É preciso primeiro acabar com as desigualdades e depois dar tratamento diferenciado para a questão das drogas?
Olha, eu acho que as coisas têm de andar paralelas. Que era o que os governos democrático-populares estavam tentando fazer. Nos mecanismos de controle social, com pessoas do mesmo campo político que o nosso, fomos construindo inovações. Por exemplo, no Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas, nós conseguimos barrar por muito tempo a proposta de incluir as comunidades terapêuticas no atendimento aos usuários.
Como são essas comunidades terapêuticas?
São entidades normalmente ligadas a igrejas, o que tira o caráter laico, que pegam uma autorização para as pessoas ficarem ali durante meses supostamente para se tratar da dependência de álcool e drogas. Nós conseguimos impedir a autorização para que elas atuarem dentro do sistema, pois nossa visão é contra a internação obrigatória, de condenação da tortura. Alguém, quando ler nosso relato, poderá dizer ‘mas eu conheço comunidade terapêutica legal’. Ok, pode ser uma em mil, mas é a exceção que confirma a regra. Essa que é boa tem psicólogo, tem psiquiatra, não tem portas fechadas, não tem castigo, não tem obrigatoriedade de trabalho. A gente costuma dizer que a maioria das comunidades terapêuticas é ‘enxada e Bíblia’. Lá também se faz um trabalho em que o paciente fica totalmente em abstinência, enquanto estudos científicos comprovam que a redução de danos é muito mais efetiva. (Com a redução de danos) Você vai criando elementos de substituição, vai diminuindo a dosagem, vai dando novos significados para a subjetividade daquela pessoa. Porque a droga, embora tenha esse nome, possui um elemento de desejo muito grande. Ela aplaca dores, ela produz efeitos cinestésicos que trazem prazer. Então, mudar a relação com as drogas tem a ver com autoconscientização, mas não de maneira impositiva, mas todo um processo revisional da pessoa.
Como se inseririam os CAPS nessa mudança?
CAPS AD no Sacomã, São Paulo: estrutura ameaçada pela PEC 55. Foto: reprodução
Quem é considerado área-fim?
Agentes penitenciários e agentes de escolta e vigilância. Eles são maioria, mas também em número insuficiente. Aliás, não há nenhuma determinação, na lei, que indique quantos profissionais devem trabalhar em relação a um determinado número de presos. Salvo uma portaria interministerial, (dos Ministérios da) Saúde e Justiça, que indica que a cada 500 presos deve haver uma equipe de saúde completa: um médico, enfermeiro, psicólogo.
Imagino que nem isso seja cumprido.
Não.
Mas se o sistema estivesse funcionando como imaginado por você, haveria condições de recuperação da população carcerária, algo que hoje é impossível?
Pouco provável (em resposta à palavra impossível). Hoje existe a possibilidade de alguns poucos, muito mais por esforço pessoal. Existe outra questão: as famílias elegem um de seus membros para ser o prisioneiro, o penitenciário, o criminoso daquela família. Inclusive há relatos, especialmente por parte das presas mulheres, que se relacionam mais conosco – os homens têm mais resistência – da pressão que sofrem da família, quando saem da cadeia, para continuar no crime. Porque essa pessoa, como já foi presa, já está estigmatizada, então não haveria muito problema (em ser preso novamente). E ter alguém no crime é muitas vezes a forma de aquela família ter condições mínimas de sobrevivência ou melhora de vida. Cito um caso como exemplo: uma jovem que teve uma saída temporária me contou que, ao chegar em casa e dizer à família que não queria mais voltar para o crime, passou a ser discriminada. Reservaram o melhor quarto da casa e, depois de ela falar isso, colocaram pra dormir no sofá, coisas assim.
Se o trabalho funcionasse como desejado, você se arriscaria a dizer que uma facção criminosa como o PCC não teria sido criada?
Não me arrisco a dizer que não teria surgido, mas certamente teria muito menos poder. Teria muito menos braços Brasil afora. Se você pegar a carta de princípios do PCC, o texto é absolutamente justo. Você vê ali que o texto teve a participação de doutos. A carta diz que se a lei de execuções penais não é cumprida e se o Estado não cumpre a sua parte, o PCC está ali para garantir paz, justiça e liberdade. O que surgiu como um movimento para denunciar que o Estado não cumpria sua parte no sistema prisional, ao longo do tempo, por uma série de fatores, descobriu seu potencial como facção criminal. E aí vêm as megarrebeliões e revanches e o Estado começa a transferir presos. Criam-se então os presídios federais. E neles se misturam integrantes de diferentes facções. Daí nascem associações entre elas e, depois, rivalidades. Essa ausência do Estado e a tentativa de resolver o problema através do aumento da punição e da repressão só pioraram as coisas. Hoje, se não vivêssemos na pele, diríamos que o que tem acontecido é história da carochinha.
A população costuma repetir que preso custa caro demais e que as folgas de Dia das Mães e Natal, por exemplo, são um erro brutal. O que você pensa dessas duas coisas?
Fernanda: o sistema penal rígido custa muito mais caro. Foto: Roberto Parizotti
Quantos por cento?
Às vezes três, às vezes cinco, segundo dados do começo dos anos 2000. Tem mais isso: com o crescimento das facções, não podemos ser hipócritas, a própria facção não quer que o preso se evada. Parece irônico, mas é real. Mas, enfim, é uma minoria que vai cometer novos delitos. A vivência na prisão é muito degradante. Esse discurso midiático de direita, que diz que os presos estão lá de férias, numa boa...Passa uma horinha lá pra ver como é que é. Ou então essa coisa de reclamar ‘é o meu dinheiro’. Então vamos lá, vamos usar o nosso dinheiro em políticas públicas. Hoje, o que temos, vai na contramão do bom senso. E aí vem esse ministro da Justiça Alexandre Moraes defendendo essas coisas horrorosas de aumento do aparato repressivo. Cadastro por sangue, cadastro digital... Uma tentativa aí de reproduzir o filme Minority Report. É uma forma totalmente equivocada, porque impede qualquer chance de quem passou pelo sistema se recompor. Então, uma coisa que a gente defende, embora difícil, é o amparo para que a pessoa possa se reconstruir.
Então você acredita que, mesmo diante do cenário atual, se houver uma mudança, teremos uma transição que em alguns anos transforme o sistema penitenciário?
É por isso que a gente continua trabalhando. Porque acreditamos. Isso também vai da tua crença pessoal no que é o humano. Quando ouvimos barbaridades como ‘mais humano ou menos humano’, é errado. Todos somos humanos. O indivíduo cometeu um delito, algo perverso, ok, eu não vou negar isso. Mas é importante pensarmos sobre as causas que o levaram a fazer aquilo e como fazemos investimentos para mudar esse estado de coisas. Claro que há características de personalidade, não dá só pra tratar do ponto de vista social, há elementos que precisam ser observado. Mas, sim, fazendo mudanças no modelo social, mudanças na forma de intervenção, podemos ter outra realidade.
Bom, agora estamos diante de uma iniciativa do governo que é congelar os investimentos públicos por 20 anos, com a PEC 55. Isso só vai piorar o quadro, não?
Certamente que sim. Parte das famílias dessa população carcerária se utiliza da rede estatal para assistência social. Teremos um problema enorme porque isso está sendo desmontado. Além disso, a retirada de dinheiro das políticas públicas vão fazer essas políticas concorrerem entre si na disputa por verbas. E eu não tenho dúvida que o orçamento do aparato repressivo vai ganhar a disputa. Por tudo que tenho visto, inclusive pelos sinais que são emitidos no interior dos presídios, acho que essa crise tende a piorar. No meu entendimento, a população carcerária deveria ser separada por tipo de delito. E hoje não, ela é separada dependendo de qual facção pertence.