Escrito por: Rosely Rocha e André Accarini
Em dois anos de mandato da CNTSS-CUT na presidência do Conselho Nacional de Assistência Social, entidade retomou papel de destaque nas políticas públicas em defesa das populações em vulnerabilidade
Desde 2016 quando a direita tomou o poder no Brasil com o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, os governos seguintes que assumiram a presidência do país relegaram a assistência social a um segundo plano dentro das políticas públicas voltadas para as pessoas em vulnerabilidade social.
Até a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram seis anos de muita luta para manter as funções do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), órgão vinculado ao Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS).
Em especial, nos últimos dois anos, o órgão, sob a presidência da secretária de Políticas Sociais da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS/CUT), Margareth Alves Dallaruvera, viveu um período histórico de realinhamento de diretrizes para cumprir com o papel essencial da assistência social no país – um período em que à CUT e sua entidade filiada estiveram à frente da reconstrução do conselho.
O mandato da dirigente no CNAS termina no mês de junho deste ano. O governo federal deverá assumir a presidência também por dois anos. O revezamento no cargo ocorre entre o Executivo e entidades da sociedade civil organizada.
“Fui eleita por unanimidade entre a sociedade civil e o governo. Então, são dois anos onde, pela primeira vez na história do Conselho Nacional, um trabalhador do chão do SUAS [Sistema Único de Assistência Social] - uma sindicalista - está à frente desse Conselho, que consegue conduzir matérias importantes para a sociedade brasileira”, diz Margareth, que também é dirigente da Federação Nacional da Assistência Social (Fenas) e diretora executiva da CUT Nacional.
Apesar do curto período na presidência do CNAS e dos percalços antes da posse de Lula, em 2023, foi possível, com muita luta, retomar a importância do Conselho e valorizar os trabalhadores e trabalhadoras da assistência social.
Ela destaca que a assistência social é um direito do cidadão e dever do Estado, e vai muito além da caridade e do assistencialismo, e que hoje ela está na Constituição Federal, no tripé da Seguridade Social, Saúde e Previdência.
“Nós trabalhamos com essa política para as pessoas que dela necessitam, principalmente, em situação de vulnerabilidade social. O Conselho é o guardião dessa política, porque é lá, que a gente discute e elabora, através das comissões e do plenário, resoluções que também vão reverberar nos estados e nos municípios do país”, explica a dirigente.
A tarefa foi árdua, principalmente, no início, ainda no governo de Jair Bolsonaro (PL), que não tinha dentro das suas prioridades a assistência aos mais pobres, além disso a pandemia da Covid-19 impediu que os conselheiros se reunissem presencialmente, prejudicando a atuação do órgão, apesar dos esforços.
Segundo ela, quando não há uma direção política em nível nacional dentro da sociedade, o reflexo se dá diretamente nos estados e municípios 'onde a vida acontece'.
“Foi a treva, um momento muito ruim, entre as dores e as amarguras. Então, em meu mandato voltar às reuniões presenciais, na perspectiva de reconstrução do Brasil, de reconstruir o SUAS [Sistema Único de Assistência Social], foi muito importante”, diz.
Resoluções
Nesses dois anos de mandato foram mais de 80 resoluções aprovadas, que dão uma direção política aos estados e municípios. Um exemplo é a resolução sobre comunidades terapêuticas, de que elas não devem ser certificadas nos conselhos municipais porque o dinheiro não pode ir para essas comunidades em que estão internadas pessoas dependentes de drogas e álcool. Essa foi uma das primeiras quebras de braço no Conselho Nacional.
“Entendo que conseguimos dar um salto qualitativo muito grande. Aprovar uma resolução é algo muito importante” diz Margareth. Ela esclarece também que ‘dar dinheiro para essas comunidades não é assistência social’.
“Nós temos nossos equipamentos, os CRAS, que são os Centros de Referência de Assistência Social, temos os Centros POP, as casas de acolhimento. Então, a assistência é ampla. Todos os nossos serviços são tipificados por essa política e, nesse sentido nós temos que orientar a população em situação de vulnerabilidade social para que procure os nossos equipamentos”, diz.
Margareth ressalta que o tratamento para os usuários de drogas e álcool precisa dialogar com as demais políticas porque essas pessoas têm rompimentos de vínculos afetivos, familiares e desproteções sociais, o que torna essa situação um caso de saúde e não de polícia.
Para ela, os sistemas de justiça são muito importantes, mas enquanto você tem num CRAS um trabalhador que não ganha um salário mínimo, você tem outro do Poder Judiciário ganhando oito vezes mais e, por falta de condições financeiras aquele trabalhador que não cumpre uma decisão judicial pode ir preso.
“Quando se bota o dedo na ferida a gente consegue fazer uma resolução ouvindo o Conselho Nacional de Justiça, ouvindo o Ministério Público. É dialogando que nós fazemos parcerias nessas lutas e conseguimos resoluções e protocolos”, destaca.
“Você tem que cuidar das pessoas, trabalhar para que possam voltar ao convívio na sociedade e quando você olha a pessoa na rua, você começa a estigmatizar. É preciso resgatar essas vidas, cuidar dessas pessoas, porque são seres humanos, e que, por algum motivo, também foram parar nas ruas”, defende.
Ela conta que há pessoas que fazem parte de um movimento nacional da população em situação de rua, que já estiveram naquela situação e hoje fazem parte do Conselho Nacional de Saúde.
“São grandes lideranças e um deles foi convidado para atuar dentro do Ministério de Direitos Humanos numa coordenadoria para a população de rua, que o governo Lula vai criar”.
A assistência social é resgate de vidas, de projetos de vida das pessoas. E quando a gente fala numa nova ordem societária no país, ela tem que começar a mudar a vida das pessoas- Margareth DallauveraA valorização dos trabalhadores da assistência social
Uma das lutas da dirigente é a valorização dos trabalhadores da assistência social e para isso será realizado um seminário nacional de todos os trabalhadores do SUAS, neste mês abril no Rio de Janeiro.
De acordo com Margareth será a primeira vez que um encontro das secretarias executivas. São elas que dinamizam e dão uma alma para o controle social no país.
Campanha contra o assédio moral no SUAS
Margareth destaca que será lançada uma campanha contra o assédio moral aos profissionais que trabalham na proteção social e, que na verdade, estão desprotegidos. Para isso houve conversas com o ministro Wellington Dias e com o secretário nacional do MDS, André Quintão.
“De pronto eles concordaram com essa campanha contra o assédio moral no SUAS. O trabalhador não pode sofrer assédio moral, seja hierárquico, e do próprio atendido. Esse problema tem levado trabalhadores ao suicídio”, diz.
Outra conquista, segundo ela, é a criação de uma mesa nacional de negociação salarial do SUAS e que o seu mandato conseguiu dialogar com o deputado Reimont (PT-RJ), para apresentar um projeto de lei de criação do piso para trabalhadores de nível fundamental, médio e superior.
“Tem trabalhadores ganhando salário mínimo para exercer uma política tão importante. Então, o deputado já apresentou o projeto de lei a pedido do nosso mandato, para valorizar os nossos trabalhadores e trabalhadoras”, afirma.
A gente pode fortalecer a política do SUAS para termos um Brasil diferente. Um novo Brasil que cuida de quem cuida das pessoas- Margareth DallauveraOuça abaixo, em formato de Podcast, a entrevista especial com Margareth Dallaruvera. Ela conta com detalhes a atuação da representação dos trabalhadores, além de se aprofundar na importância da valorização dos trabalhadores na assistência social e o quanto isso se reverte em benefício para a sociedade.