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Golpe admitido por Temer no Roda Viva foi ponte para o Bolsonaro, diz Dilma

Ex-presidente usou duas vezes em um minuto o termo "golpe" para definir o impeachment de Dilma Rousseff. "Tentou se esquivar, mas projeto econômico o entrega", diz Dilma

Publicado: 17 Setembro, 2019 - 17h07 | Última modificação: 17 Setembro, 2019 - 17h09

Escrito por: Redação RBA

REPRODUÇÃO/TV CULTURA
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A participação do ex-presidente Michel Temer (MDB) no programa Roda Viva, da TV Cultura, na noite de ontem (17) ganhou as redes e rodas de discussões políticas em todo o país. O destaque foi o momento em que chama o impeachment da ex-presidenta reeleita em 2014, Dilma Rousseff (PT), de “golpe”. O reconhecimento veio junto de uma tentativa dele de se desvincular da articulação golpista.

Dilma afirmou que a fala de Temer foi um “sincericídio”. “Admitiu que eu sofri um golpe de Estado e disse que se Lula tivesse ido para o meu governo não teria havido o impeachment”, completou a ex-presidenta, ao mencionar a continuação da fala de Temer de que seLula não tivesse sido impedido pela Justiça de assumir a Casa Civil naquele ano, o golpe fracassaria. O impedimento de Lula veio na esteira de uma jogada do ex-juiz Sergio Moro e da força-tarefa da Lava Jato, que vazaram conversas entre Lula e Dilma.

Pouco tempo depois, após a prisão de Lula, Moro foi premiado por sua ação contra os petistas; foi nomeado ministro da Justiça e da Segurança Nacional pelo maior beneficiado das investidas contra o PT: o presidente Jair Bolsonaro (PSL). A narrativa que beneficiou a extrema-direita contou com amplo apoio do Judiciário, articulado em um conluio para favorecer o posicionamento ideológico hoje dominante. Tais manobras ficaram às claras após a série de matérias conhecida como Vaza Jato começar a circular, com trabalho de jornalistas do The Intercept Brasil e outros parceiros.

Temer e o golpe
Vice na chapa com Dilma, Temer tentou se esquivar de seu papel de protagonismo no golpe. “Jamais apoiei e fiz empenho pelo golpe. Aliás, muito recentemente, o jornal Folha detectou um telefonema que o ex-presidente Lula me deu, onde ele pleiteava, e depois esteve comigo, para trazer o PMDB para impedir o impedimento. Eu tentei. Mas a essa altura, eu confesso que a movimentação popular era tão grande e tão intensa que os partidos já estavam vocacionados, digamos assim, pela ideia do impedimento (…) Esse telefonema do Lula revela que eu não era adepto do golpe“, disse.

Dilma discorda e relaciona o programa político implementado por Temer em seu curto período como presidente com o subsequente, de Bolsonaro. “Temer não disse, contudo, que o Golpe de 2016 foi para enquadrar o Brasil no neoliberalismo. E, claro, negou ter participado diretamente do golpe. Nenhuma menção dele a seus dois auxiliares mais próximos: Moreira Franco e e Eliseu Padilha. A Ponte para o Futuro é a matriz do programa de governo de Bolsonaro.”

Reações
Um dos jornalistas responsáveis pela Vaza Jato, o laureado Glenn Greenwald, após a entrevista do Temer, fez uma declaração que caminha no sentido do argumento da Dilma. “O impeachment de Dilma – além de ser uma piada óbvia (gangsters [Cunha/Aécio] fingindo ser moralmente ofendidos por *pedaladas*)- está finalmente sendo reconhecido como a 1ª tentativa de alcançar objetivos fora da democracia. Era a 1ª pedra que construiu o caminho para Bolsonaro”, disse.

Dilma caiu, teoricamente, pela assinatura de decretos de créditos suplementares, que ficaram conhecidos como “pedaladas fiscais”. Uma manobra contábil para garantir o orçamento de certos setores. Uma questão técnica usada como desculpa. Temer mesmo utilizou dos recursos, presidentes anteriores e governadores costumeiramente recorrem a tal tipo de jogada. Mesmo uma das autoras do impeachment, hoje deputada Janaína Paschoal (PSL-SP), reconheceu a fraude no processo. “Alguém acha que Dilma caiu por um problema contábil? As fraudes contábeis foram praticadas para encobrir o rombo gerado pelos desvios!”, disse via redes sociais.

Peso histórico
Em análise sobre a entrevista de Temer, o jornalista Kennedy Alencar aponta o alto “peso histórico” da fala. “Fica claro que houve, sim, golpe parlamentar, expressão que sempre usei em relação ao impedimento e que foi negada por parcela do país. Torna-se evidente o papel de Moro e da Lava Jato na derrubada de Dilma, o que foi uma interferência política ilegal do Judiciário no Executivo (…) Numa democracia plena, isso não poderia ter ocorrido. O relato de Temer tem forte peso histórico. Ele diz que o motivo de Lula para virar ministro era evitar o impeachment, o que derruba o argumento da Lava Jato e do STF para impedir a ida do petista para Casa Civil.”