Escrito por: Ana Carolina Vasconcelos Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG)
Locais onde serviço foi entregue para iniciativa privada, tarifas aumentaram e população convive com maior falta de água
Uma das prioridades da gestão de Romeu Zema (Novo) é a entrega das estatais mineiras para a iniciativa privada, entre elas a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). Porém, experiências de privatização de empresas públicas desse setor ao redor do Brasil demonstram que, além do serviço não melhorar, a população é duramente impactada.
Aumento das tarifas, queda na cobertura e menor controle público são algumas das consequências. Para observar exemplos negativos, nem é preciso ir muito longe. Em Ouro Preto, município da região Central do estado, moradores lutam pela remunicipalização do tratamento e distribuição de água.
Eles relatam que, desde que a empresa privada Saneouro passou a ser responsável pelo serviço, a população convive com cortes de abastecimento e cobranças de tarifas abusivas.
Ao considerar as experiências de outros estados do país, os efeitos da privatização também foram ruins. No Rio de Janeiro, por exemplo, após a venda da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), o percentual de tratamento de esgoto caiu 7% entre 2020 e 2021. Além disso, cresceu a quantidade de reclamações por falta d’água.
Em Manaus, onde o serviço é privatizado há mais de 20 anos, a realidade, segundo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS 2020), é de 80% da capital amazonense sofrendo com falta de esgotamento sanitário.
No Tocantins, a privatização da Saneatins em 1998 também gerou consequências negativas, fazendo com que, em 2010, o governo do estado começasse a buscar a reestatização do serviço. A empresa voltou a ser pública em 2013.
Em Alagoas, Ceará e Rio Grande do Sul, a população também lida com problemas como a queda de cobertura de água tratada, altas tarifas e falta de transparência por parte das empresas.
Na avaliação de Lucas Tonaco, do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado de Minas Gerais (Sindágua/MG), não existem aspectos positivos na entrega do patrimônio público para a iniciativa privada e quem mais sofre é justamente quem mais precisa do Estado.
“Não tem nenhuma vantagem e é só prejuízo para a população como um todo. Mas, os mais vulneráveis socialmente e economicamente são mais atingidos. Na lógica de lucro das empresas privadas, não existe preocupação em resolver o saneamento enquanto direito social. O saneamento enquanto mercadoria é vendido numa lógica de troca de capital”, comenta Lucas, que também é membro da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU).
Diante desse balanço, a questão que fica é: por que motivo o governo de Minas quer vender a Copasa?. Na avaliação do diretor do Sindágua/MG, os interesses da gestão de Romeu Zema são ideológicos e fruto de uma concepção ultrapassada sobre os serviços públicos e da falta de conhecimento sobre o saneamento em Minas.
“Zema quer vender a Copasa porque ideologicamente é um ultraliberal. Então, ele não enxerga políticas públicas em um prisma mais avançado, ele enxerga como se fosse mercadoria. E aí começam as contradições. Zema diz, por exemplo, que onde foram privatizados os serviços melhorou a eficiência, mas isso não é verdade”, argumenta.
Para Lucas Tonaco, a postura do governador de Minas ainda é parte de uma estratégia para ocupar espaço político. Ele acredita que Zema tenta disputar com o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas, a herança do bolsonarismo.
“Para conquistar votos, o que Zema pode fazer é mexer na política econômica. Porque ele não é um político tradicional, ele não tem aquele carisma. Esse discurso privatista dele é da década de 70. Já foi aplicado e deu errado. No Chile, por exemplo, a população está lutando pela reestatização de vários serviços”, avalia.
No final de maio, o governador afirmou, durante uma atividade no município de Passos, no Sul de Minas, que a privatização da Copasa trará mais condições financeiras para que o Estado invista em saneamento básico.
“Essas empresas [Cemig e Copasa] não têm condição de investir mais porque o principal controlador, o acionista delas é um Estado que não tem condições financeiras. Quando nós privatizarmos, teremos condições de trazer para Minas Gerais milhares de investimentos, tanto no saneamento básico quanto no fornecimento de energia, que são dois gargalos que nós temos hoje”, declarou Romeu Zema.