Governo Bolsonaro autoriza verba para 'ONGs de prateleira' de Sheik e Daniel Alves
Sheik e Daniel Alves driblaram exigências legais e usaram “ONGs de prateleira", entidades inativas que existem há pelo menos 3 anos, para poder firmar acordos com o governo federal
Publicado: 05 Abril, 2022 - 09h55 | Última modificação: 05 Abril, 2022 - 10h37
Escrito por: Redação CUT | Editado por: Marize Muniz
O governo de Jair Bolsonaro (PL) autorizou o repasse de R$ 6,2 milhões a duas organizações não governamentais (ONGs) inativas e recém-assumidas pelo ex-jogador Emerson Sheik e pelo lateral-direito Daniel Alves, da Seleção Brasileira e do Barcelona.
De acordo com o jornal Folha de S. Paulo, mesmo sem experiência comprovada, essas ONGs tiveram aprovados projetos sobre cursos de esportes, em 2021. Tanto Sheik quanto Dani Alves ignoraram as exigências legais para assinar os convênios, diz o jornal.
Ainda de acordo com a reportagem, isso só foi possível porque os atletas recorreram às chamadas “ONGs de prateleira", entidades usadas para driblar a regra que estabelece a necessidade de uma sociedade civil existir há pelo menos três anos para firmar acordos com o governo federal.
Em dezembro de 2019, a ONG ligada a Sheik, o Instituto Qualivida, assinou o convênio com o Governo Federal para a instalação de três núcleos esportivos em Mangaratiba e Queimados, ambos no Rio de Janeiro, pelo valor de R$ 2,7 milhões.
A ONG ligada a Daniel Alves, o Instituto DNA, assinou convênio em dezembro, no valor de R$ 3,5 milhões, para instalação de três núcleos de basquete nos estados da Bahia, Pernambuco e também no Distrito Federal.
Os recursos repassados às organizações têm origem em emendas parlamentares solicitadas por deputados da base do governo. Nos dois casos, a verba já foi empenhada (reservada no Orçamento). O pagamento, contudo, ainda não foi realizado.
Amizades que valem ouro
Sheik, ex-ídolo do Corínthians, é amigo do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho 01 do presidente da República.
O ex-jogador é amigo também da primeira ex-esposa de Bolsonaro, Rogéria, envolvida no escândalo da rachadinha. Tem parentes dela entre asw seis pessoas que trabalharam no gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados e, anos depois, foram assessorar Flávio, na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj); e o filho zero dois, Carlos Bolsonaro, na Câmara Municipal do Rio, que devolviam a maior parte dos salários para os políticos.
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Instituto Emerson Sheik
Emerson Sheik assumiu em dezembro de 2019 o Instituto Qualivida, fundado há 26 anos, mas que nunca realizou projetos sociais voltados aos esportes. Em seguida, o ex-jogador alterou o estatuto, os membros e o nome da entidade que virou Instituto Emerson Sheik.
O Instituto apresentou em julho do ano passado seu primeiro projeto ao governo federal. Em dezembro, foi assinado o convênio para a instalação dos três núcleos esportivos no Rio de Janeiro. A verba foi alocada a partir de uma emenda parlamentar da bancada do Rio de Janeiro a pedido do deputado Hélio Lopes (PL -RJ), conhecido como Hélio Negão ou Hélio Bolsonaro, um dos políticos mais próximos de Bolsonaro.
Sheik aparece com frequência em fotos ao lado de Flávio, apoiou Rogéria na campanha para vereadora do Rio em 2020 e é próximo do deputado estadual bolsonarista Anderson Moraes (PL-RJ), que emprega Rogéria em seu gabinete.
Daniel Alves e o Instituto DNA
O instituto DNA de Daniel Alves, também beneficiado com verba milionária, chamava-se Instituto Liderança até maio do ano passado e tinha como responsável Leandro Costa de Almeida, ex-treinador de basquete. Ele afirma que a ONG estava inativa havia cinco anos, após ter realizado alguns projetos sociais bancados por apoios privados.
Leandro disse ter sido procurado por um amigo em comum com Daniel Alves e que abriu mão da entidade após ouvir os planos do lateral direito. "Por que não vou ceder [a entidade] para alguém que quer fazer o bem?"
A sede do Instituto Daniel Alves foi inaugurada oficialmente na sexta-feira (25/03) em Lauro de Freitas (BA). Valentim disse que a ONG começou a oferecer cursos esportivos um mês antes com cerca de R$ 2 milhões disponibilizados pelo jogador, atendendo a 700 crianças.
A verba federal foi obtida por meio de emenda do relator do Orçamento, a pedido da deputada Celina Leão (PP-DF). A deputada emprega em seu gabinete Ana Cristina Valle, ex-mulher de Bolsonaro.
O Ministério da Cidadania afirmou, em nota, que "não há ilegalidade na celebração das parcerias".
"As duas entidades apresentaram atestado de capacidade técnica e possuem histórico de projetos realizados na área do esporte", diz a pasta. Instado a informar qual é o "histórico de projetos realizados", o ministério não respondeu até a publicação desta reportagem.
O gabinete de Hélio Lopes disse que o parlamentar pediu a emenda após gostar do projeto apresentado. Celina Leão não respondeu aos questionamentos.
Emerson Sheik foi procurado no dia 23 de março em Mangaratiba, onde mora, mas até o momento não respondeu à reportagem.
Daniel Alves afirmou à Folha que assumiu o Instituto Liderança para ampliar a capacidade de absorção de crianças em seus projetos.
Ele afirmou que conseguiu um convênio com valor expressivo em razão da "dimensão dos projetos apresentados e pela seriedade dos trabalhos por mim desenvolvidos".
"Atualmente, atendemos 650 crianças e adolescentes em dois núcleos, com recursos exclusivamente privados, provenientes de meu aporte pessoal. Pretendo fazer o que estiver ao meu alcance para aumentar o número de projetos sociais e o número de crianças atendidas", disse ele.
Segundo ele, os dirigentes do instituto fizeram contato com vários deputados para obter recursos. "A deputada Celina, por priorizar o esporte, nos apoiou."
Com informações da Folha