Escrito por: Murilo Pajolla Brasil de Fato | Lábrea (AM)
Ocupantes não indígenas terão um mês para saírem voluntariamente; região é marcada por conflitos envolvendo fazendeiros
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começa nesta quarta-feira (3) a remover invasores da Terra Indígena (TI) Alto Rio Guamá, no nordeste do Pará. A área foi reconhecida como terra indígena ainda em 1945, mas só foi regularizada em 1993. O território tem o tamanho de 280 mil campos de futebol e é lar dos povos Tembé, Timbira e Kaapor.
É a segunda desintrusão - como é chamada a retirada de intrusos - feita pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) desde o início do ano. A primeira ocorre há três meses na Terra Indígena Yanomami, onde o governo enfrenta a resistência violenta dos garimpeiros remanescentes para concluir a expulsão, diante de recente escalada de mortes.
A retirada dos não indígenas na TI Alto Rio Guamá (PA) será feita por uma grande operação envolvendo diversos órgãos, mas tende a ser menos complexa se comparada ao território Yanomami (RR). Em Roraima, estima-se que os invasores eram 20 mil, contra cerca de mil estimados pela Funai no território do Pará.
Os invasores estão sendo avisados sobre o prazo para deixarem o território: 31 de maio. Depois, as forças de segurança poderão fazer a remoção forçada. A diretora de Proteção Territorial da Funai, Maria Janete de Carvalho, afirmou nesta terça-feira (2) que espera que o processo ocorra de forma pacífica.
“O processo está bem coordenado e nós estamos iniciando com base no diálogo, esperando que dê tudo certo e que a missão da Funai de promover e proteger os direitos dos povos indígenas possa ser bem sucedida nessa ação integrada”, disse Carvalho.
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, reafirmou que o objetivo é fazer a expulsão sem violência. Ela ressaltou que o presidente Lula está reassumindo a responsabilidade de garantir os direitos indígenas, após um período de retrocessos para os povos sob a gestão de Jair Bolsonaro (PL).
"É importante que o Estado brasileiro reassuma essa responsabilidade, como o presidente Lula está fazendo. Estamos num momento em que o planeta está discutindo as emissões dos gases de efeito estufa e, com essa iniciativa, estamos cumprindo esse importante papel para o equilíbrio climático", afirmou Guajajara.
Os ocupantes ilegais da TI Alto Rio Guamá (PA) provocam conflitos violentos pela posse da terra. Além de utilizarem os recursos naturais exclusivos dos indígenas, alguns invasores usam a área protegida para plantar maconha, extrair madeira e cultivar gado de forma ilegal.
Sem apoio do governo federal, os indígenas criaram um grupo de monitoramento e defesa contra invasores. Em 2021, o professor Isac Tembé, de 24 anos, foi morto pela Polícia Militar (PM). Em uma carta, lideranças do povo acusaram os policiais de pertencerem a uma milícia privada paga por fazendeiros que invadiram a terra indígena.
Ainda em 2003, a Justiça determinou em caráter liminar que os invasores fossem expulsos da TI Alto Rio Guamá. A determinação foi confirmada por sentença em 2014. Em 2018, o judiciário exigiu que a Funai apresentasse um plano de desocupação, exigência que só foi cumprida agora, pela gestão Lula.
O Ministério Público Federal (MPF) exigiu no ano passado que prefeituras locais encerrem apoio a não indígenas dentro da Terra Indígena Alto Rio Guamá (PA). Conforme o MPF, o Executivo de Garrafão do Norte (PA) fornecia tratores para os invasores conduzirem atividades agrícolas no interior da área protegida.
Segundo a Funai, as famílias não indígenas que viviam na TI Alto Rio Guamá antes da demarcação já foram indenizadas. Algumas foram reassentadas ainda nos anos 1990. Cerca de 1,1 mil ocupações foram consideradas de boa-fé e por isso tinham direito à indenização, pois haviam sido construídas antes do processo demarcatório.
Até 2007, os donos de 903 ocupações de boa-fé foram indenizados. A Funai afirma que os responsáveis pelas outras construções não foram localizados para receberem a compensação financeira.
O órgão indigenista diz ainda que 522 famílias que ocupavam a área indígena foram assentadas em projetos de reforma agrária da região, das quais 191 receberam crédito específico para esse fim.
Embora tenham recebido compensações, muitas famílias se recusaram a sair. Outras foram embora, mas voltaram posteriormente. Por isso, foram consideradas ocupantes ilegais pela Justiça Federal e precisaram deixar até o fim do mês a terra dos Tembé, Timbira e Kaapor.
“A presença desses não indígenas, além de trazer insegurança para os indígenas, ainda agride, destrói o meio ambiente e provoca esses conflitos que ocorrem permanentemente”, enfatizou Sonia Guajajara.