Governo do RS privatiza Corsan. Empresa vencedora era conhecida desde o dia 16
A vencedora foi a Aegea, como havia previsto a direção do Sindiágua-RS, que, na sexta (16), registrou documento em cartório prevendo que a empresa venceria o leilão
Publicado: 21 Dezembro, 2022 - 09h28 | Última modificação: 21 Dezembro, 2022 - 11h15
Escrito por: CUT-RS
Em leilão relâmpago, com lance único e suspeitas de favorecimento, o governo do Rio Grande do Sul realizou o leilão de privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, na manhã desta terça-feira (20).
O grupo Aegea levou a empresa pública do povo gaúcho por R$ 4,151 bilhões, o que representa um ágio de 1,15%, um pouco acima do preço mínimo de R$ 4,1 bilhões. A Aegea já atua em nove municípios da região metropolitana de Porto Alegre no formato de parceria público-privada (PPP).
A vitória da Aegea não foi novidade para a direção do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgoto do Estado do Rio Grande do Sul (Sindiágua-RS).
Na última sexta-feira (16), os diretores do Sindiágua-RS registraram documento em cartório prevendo que a Aegea seria a vencedora do leilão. Além disso, o Sindiágua-RS publicou um card na página da entidade no Facebook nesta segunda-feira (19), dizendo quem venceria o leilão. Foi uma crônica de uma venda anunciada.
O governador Ranolfo Viera Jr. (PSDB) acompanhou o leilão de forma virtual no Palácio Piratini, em Porto Alegre. Coube à secretária do Meio Ambiente e Infraestrutura, Marjorie Kauffmann, representar presencialmente o governo gaúcho.
“Vamos anular esse leilão”, afirmou o presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgoto do Estado do Rio Grande do Sul (Sindiágua-RS), Arilson Wünsch. Ele sustenta que o valor mínimo estipulado para a venda da Corsan foi equivalente à arrecadação de 1 ano e 3 meses da empresa, e pelo preço equivalente ao lucro de apenas quatro anos.
“A água é pública e não pode ser privatizada. Vamos anular esse leilão”, declarou após a venda da Corsan. A afirmação, diz ele, está baseada na ofensiva judicial que o Sindicato tem empreendido nas diferentes esferas.
“Há quatro medidas liminares que proíbem a assinatura do contrato com a arrematante exatamente porque afloram indícios de irregularidades neste processo. Agora vamos comprovar que essas irregularidades são reais e causam um enorme prejuízo ao Estado e ao povo do Rio Grande do Sul”, declarou o dirigente.
A assinatura do contrato está prevista para 20 de março de 2023, mas está proibida pela Justiça de ocorrer antes do julgamento de mérito das ações em andamento.
“A companhia foi vendida por preço pífio, a um único licitante, que era de todos conhecido muito antes sequer da publicação do edital. É a legítima crônica de um prejuízo anunciado”, afirmou o dirigente, que estima o valor patrimonial da companhia em R$ 120 bilhões.
“Entregar a Corsan pelo preço pago pela Aegea é um presente de Natal do governo do Estado aos empresários privados. O Sindiágua vai provar que o valor pago fica abaixo do valor real da companhia”, completou Arilson.
"Leilão ajeitado"
Para o presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Água Pública, deputado Jeferson Fernandes (PT), a privatização foi um "leilão ajeitado".
"Palhaçada. Essa privatização foi um esquemão. Um único lance de uma empresa que sabidamente ganharia. Fez esse lance com dinheiro público ainda", afirmou.
Segundo o deputado, “o governador não só torrou a empresa de água e saneamento como fez questão de transformar o leilão em ato político, com discursos exaltando o que considera um feito”.
Jeferson alertou que segue em vigor a decisão do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS), que proíbe o governo de concluir a venda até o julgamento dos processos judiciais dos contratos aditivos assinados por um conjunto de prefeituras, pois a titularidade dos serviços é dos municípios.
Além disso, uma liminar do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4) havia suspendido o leilão na última quinta-feira (15), mas uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) anulou a medida, a pedido do governo do Estado, na noite desta segunda-feira (19). Mesmo com a liberação, contudo, o TST manteve vedada, por hora, a assinatura do contrato de compra e venda das ações.
Luta não acabou
“Não consideramos a luta encerrada. Esta foi apenas mais uma batalha. Temos certeza de que, no decorrer do julgamento dos processos que estão em andamento, os tribunais vão se convencer de que a venda da Corsan é um péssimo negócio para o povo gaúcho”, afirmou o parlamentar.
Hoje a Corsan atua em 317 municípios gaúchos por meio da realização de estudos, projetos, construções, operações, exploração e ampliação dos serviços públicos de abastecimento de água potável e de esgotamento sanitário.
É uma empresa altamente lucrativa, que leva água de qualidade ao povo gaúcho, através do subsídio cruzado, fórmula em que as maiores cidades compensam os investimentos nas menores cidades, para que todas elas possam ser atendidas.
A companhia também possui a tarifa social que garante o fornecimento de água para a população de baixa renda. “Não temos a menor dúvida que o governo comete um grave erro ao leiloar a companhia, comprometendo a qualidade de serviços essenciais à saúde da população e ao meio ambiente”, avaliou o líder da bancada do PT, deputado Pepe Vargas.
A privatização da Corsan foi concretizada após um longo processo com diferentes decisões da Justiça. A última ocorreu nesta segunda-feira (19), véspera do leilão, com o ministro Lelio Bentes Corrêa, presidente do TST, atendendo parcialmente o pedido da Procuradoria-Geral do Estado (PGE-RS) de suspender a liminar concedida na última quinta-feira (15) pelo desembargador Marcos Fagundes Salomão, do TRT-4, que havia determinado a suspensão por 90 dias do processo de privatização da Corsan.
Na ocasião, Salomão também determinou a apresentação, por parte do governo estadual e da Corsan, de estudo sobre o impacto socioeconômico trabalhista, previdenciário e social da privatização nos contratos de trabalho em vigência, assim como no destino dos contratos de trabalho e direitos adquiridos em caso de liquidação da empresa, inclusive em relação à Fundação Corsan.
Na semana passada, ao decidir pela suspensão do leilão, o desembargador acatou os argumentos apresentados pelo Sindiágua-RS, que usou a privatização da CEEE como exemplo de prejuízo aos trabalhadores.
Agora, na decisão de véspera que autorizou o leilão da Corsan, a PGE argumentou que a modificação de controle da Corsan não causará alteração dos contratos de trabalho celebrados entre a empresa e seus empregados, “mas apenas a alteração do controlador, sem implicar qualquer consequência direta ou imediata nas relações contratuais de trabalho”.
Segundo a PGE, o próprio edital do leilão contém cláusula específica que impõe ao comprador a obrigação de fazer com que a Corsan “cumpra acordo coletivo de trabalho por ela celebrado, bem como observe todas as obrigações correspondentes aos contratos de trabalho em vigor”.
A PGE ainda afirmou que a privatização da companhianão irá causar risco em relação às obrigações patronais com o Funcorsan, pois tais obrigações decorrem do regulamento do Plano BD nº 001 da Funcorsan, “cujas regras não sofrerão nenhuma modificação em razão da alteração do acionista controlador”, garante o órgão.
Um dia antes da decisão do TRT-4 que suspendeu a venda da Corsan, outra decisão, dessa vez da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS), havia acatado uma manifestação da PGE e autorizado a continuidade da privatização da Corsan.
Naquele momento, a PGE argumentou que não houve constatação de irregularidades no processo de desestatização, que foi estruturado pelo Estado e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O desembargador Alexandre Mussoi Moreira destacou que a Lei Estadual 15.708/2021 autoriza o Poder Executivo a promover medidas de desestatização da Companhia.
Antes, no dia 9 de dezembro, o mesmo desembargador havia determinado a suspensão de todos os atos do leilão da Corsan, a pedido do Sindiágua, que alegou inconstitucionalidade no modelo de desestatização.
Relembre como votaram os deputados sobre a venda da Corsan
O projeto do ex-governador e agora reeleito Eduardo Leite (PSDB), que pediu a autorização da Assembleia para a privatização da Corsan, foi aprovado por 33 votos favoráveis, 19 contrários e 3 abstenções em 31 de agosto de 2021.
Dos que votaram a favor da venda da Corsan, 43,75% não foram reeleitos e ficarão sem mandato em 2023. Voto tem consequência.
Favoráveis à privatização (33)
Aloísio Classmann (PTB)
Dirceu Franciscon (PTB)
Elizando Sabino (PTB)
Kelly Moraes (PTB)
Luís Augusto Lara (PTB)
Eric Lins (DEM)
Adolfo Brito (PP)
Ernani Polo (PP)
Frederico Antunes (PP)
Issur Koch (PP)
Marcus Vinícius (PP)
Sérgio Turra (PP)
Neri O Carteiro (Solidariedade)
Ruy Irigaray (PSL)
Tenente Coronel Zucco (PSL)
Vilmar Lourenço (PSL)
Fran Somensi (Republicanos)
Sérgio Peres (Republicanos)
Gaúcho da Geral (PSD)
Beto Fantinel (MDB)
Carlos Búrigo (MDB)
Clair Kuhn (MDB)
Gilberto Capoani (MDB)
Vilmar Zanchin (MDB)
Faisal Karam (PSDB)
Mateus Wesp (PSDB)
Pedro Pereira (PSDB)
Zilá Breitenbach (PSDB)
Fábio Ostermann (Novo)
Giuseppe Riesgo (Novo)
Paparico Bacchi (PL)
Any Ortiz (Cidadania)
Rodrigo Maroni (PV)
Contrários à privatização (19)
Edegar Pretto (PT)
Fernando Marroni (PT)
Jeferson Fernandes (PT)
Luiz Fernando Mainardi (PT)
Pepe Vargas (PT)
Sofia Cavedon (PT)
Valdeci Oliveira (PT)
Zé Nunes (PT)
Eduardo Loureiro (PDT)
Gerson Burmann (PDT)
Juliana Brizola (PDT)
Luzi Marenco (PDT)
Luciana Genro (PSOL)
Dr. Thiago Duarte (DEM)
Capitão Macedo (PSL)
Patrícia Alba (MDB)
Dalciso Oliveira (PSB)
Elton Weber (PSB)
Airton Lima (PL)
Não votaram (3)
Tiago Simon (MDB)
Franciane Bayer (PSB)
Gabriel Souza (MDB) – Presidente da Assembleia (só vota em caso de empate)