Escrito por: Hylda Cavalcanti, da RBA

Governo falta a debate, e alunos da UnB mantêm ocupação da reitoria

Assembleia programada para terça-feira (24) vai decidir pela realização ou não de greve geral na universidade e um ato de protesto contra o MEC. Déficit orçamentário para este ano é de R$ 92,3 milhões

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Depois da realização de uma mesa de debates que teve o propósito de discutir os problemas da Universidade de Brasília (UnB) com todos os setores e que registrou a ausência, justamente, de representantes do Ministério da Educação (MEC), estudantes decidiram manter a ocupação do prédio da reitoria, onde se encontram acampados desde a última semana em protesto contra a crise financeira da entidade. Eles programaram uma assembleia geral na próxima terça-feira (24) para decidir sobre a aprovação ou não de greve na instituição e a realização de um ato público na Esplanada dos Ministérios, em frente ao MEC, na quinta (26).

O objetivo de todas as iniciativas é questionar os cortes da UnB, que tem um déficit de R$ 92,3 milhões no orçamento deste ano e passa por uma situação complicada para a manutenção dos principais serviços nos vários departamentos. Alunos e professores também são contrários às medidas alternativas adotadas pela administração da universidade, que incluem redução do número de servidores terceirizados e de estagiários, por meio de demissões.

“Não vamos sair daqui. A luta pela melhoria da universidade é a luta pelo nosso futuro e só conseguiremos resistir a esse projeto de governo que corta gastos para o ensino público se nos unirmos”, disse Maria Curvelo, estudante do curso de Filosofia. Os alunos que iniciaram a ocupação (aproximadamente 500 pessoas) também pediram maior adesão ao movimento por parte dos colegas.

“Temos uma universidade que está mudando sua base social e tirando o compromisso social que tem. A solução para esse problema não passa por redução de estagiários nem de terceirizados, mas de ações junto ao MEC e a outros ministérios como os da Fazenda e do Planejamento para mudar esse quadro, criado pela emenda que congela os gastos públicos. A UnB foi a primeira universidade a ser pensada enquanto comunidade”, protestou outro aluno, Bruno Lima.

Nos vários discursos, alunos e professores destacaram que o que está por trás da redução de orçamento para as universidades públicas é um projeto privatista de ensino encampada pelo governo Temer, e que tem caráter bem mais amplo.  “Passa por redução nas aposentadorias dos professores, fechamento de laboratórios, diminuição de terceirizados e muito mais. Por isso a ação precisa ser coletiva. A crise econômica não pode recair sobre a classe trabalhadora e a comunidade acadêmica”, afirmou a aluna de Direito Ana Fonseca.

Sem ‘lucro’

Um dos representantes do Comitê de Defesa da UnB, formado por professores e demais servidores, o servidor Cícero Aguiar pediu à reitoria para que não demita “nenhuma mãe de família ou pai de família que seja trabalhador terceirizado desta universidade”. Ele lembrou as palavras do ex-ministro Mendonça Filho – que deixou o cargo na última semana para disputar as próximas eleições pelo DEM no seu estado (PE) – quando este afirmou que “a universidade não dá lucro para a sociedade”.

Também o aluno Pedro Moraes, membro do Diretório Central dos Estudantes (DCE), disse que o momento exige uma ação da comunidade estudantil e acrescentou que está “com muito medo do que mais pode acontecer”. “Precisamos ir às ruas, para barrar este retrocesso.”

Dalva Sara Lu, integrante da União Nacional dos Estudantes (UNE) destacou que o que está em jogo é futuro do país. “Vivemos em um Estado de exceção que prende um ex-presidente da República sem provas, que permite o assassinato de uma vereadora atuante na área de Direitos Humanos e, passados mais de 30 dias, ainda não tem pistas sobre quem a matou e que decreta intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro, entre outras coisas”, lembrou.

“Não estou falando isso por falar, mas para lembrar que precisamos ter consciência de que tudo está integrado a um único contexto, que passa pela mudança do projeto de país. Um país mais privatista e obediente às regras do mercado. A gente precisa combater esse Estado de exceção, precisa se movimentar”.

A reitora, Márcia Abrahão, disse que tem orgulho de ter sido aluna da universidade e participado do projeto que expandiu o campus para outras cidades do Distrito Federal e ampliou o número de alunos. Contou que assumiu a reitoria no final de 2016 com a informação de que tinha sido destinado à universidade, naquele ano, um montante de R$ 80 milhões a mais no orçamento e que este montante não seria mais mantido em 2017.

“Abrimos os dados do nosso déficit para a comunidade acadêmica e começamos a discutir com a comunidade, com o MEC e a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) toda a situação orçamentária da universidade”, disse ela. “A UnB tem uma particularidade em relação a outras universidades porque arrecada recursos, mas até esses recursos são limitados em razão dos cortes do orçamento”, explicou.

Reitora pede prudência

A reitora só não conseguiu o apoio dos alunos quando afirmou que sua posição é pela não realização da greve e continuidade das negociações com o governo. “A UnB possui os melhores indicadores acadêmicos de todas as universidades brasileiras. Sou favorável a que continuemos com essa discussão, mas dando continuidade ao nosso trabalho, mostrando que estamos funcionando, reivindicando a melhoria orçamentária por meio de ações políticas externas, mas ao mesmo tempo mantendo a nossa qualidade”, argumentou.

“Concordo que precisamos de unidade e luta, mas precisamos ter responsabilidade para com a sociedade brasileira. Quero que vocês continuem nos seus cursos e que muitos dos alunos que aqui estão se formem e sejam os futuros líderes, para mudar esse país”, apelou Márcia.

Márcia Abrahão foi rebatida pelo professor Emílio Araújo que sugeriu adesão geral à greve. Araújo destacou que neste momento o inimigo principal da universidade é o MEC e, de acordo com ele, se houver unidade entre estudantes, professores e servidores, será possível vencer a luta. “Sei que a última coisa que a reitora quer é demitir essas pessoas, por isso peço à senhora: suspenda tudo, apoie a greve e confie em nós, professora”, pediu, em meio a aplausos.

A reunião, que foi organizada pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, teve como uma das mediadoras a deputada Erika Kokay (PT-DF). A avaliação feita pelos quase mil alunos presentes é que, apesar da maioria ter defendido a realização de greve, eles não representam o total da universidade, motivo pelo qual pretendem que a decisão seja tomada durante a assembleia.