Escrito por: Luiz Carvalho

Governo precisa se reencontrar com bases que o elegeram

Para organizações, Dilma deve abandonar estratégia de construir pauta focada no Congresso e precisa recompor base social

Roberto Parizotti
Douglas (ao microfone) ressaltou que movimentos cobrarão compromisso com agenda progressista


A ideia de que o fim da crise passa por abandonar o afago aos setores conservadores, especialmente ao PMDB, e acena para uma reconciliação com os movimentos sindical e sociais norteou a entrevista coletiva hoje (1º) sobre a mobilização que tomará as ruas do Brasil neste sábado (3).

Durante entrevista em São Paulo, organizações que compõem a Frente Brasil Popular falaram sobre os atos agendados em 30 cidades de 18 estados e que terão como eixo a defesa da democracia, da Petrobras e o repúdio ao ajuste fiscal.

Até esta quinta, estavam confirmadas atividades na Bahia, Ceará, Minas Gerais, Rondônia, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Paraíba, Pará, Piauí, Distrito Federal, Mato Grosso, São Paulo e Santa Catarina.

Em quatro estados, as manifestações convocadas por 60 organizações dos movimentos sociais ocorrem já nesta sexta (2): Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Goiás e Sergipe.

São Paulo terá o maior número de mobilizações, com ato marcados para a Avenida Paulista, a partir das 14h, e mais oito cidades no interior.

Presidente da CUT-SP, Douglas Izzo, reforçou que as manifestações não representam uma defesa cega do governo, mas sim uma pressão para que a presidenta Dilma Rousseff cumpra a base do programa apresentado à nação.

"O que faremos é a disputa para que projetos que signifiquem distribuição de renda e ampliação dos programas sociais sejam aprofundados", explicou.

Educação em risco

Dirigente com base na educação, Izzo disse também que os trabalhadores do setor farão um ato na Avenida Paulista, no dia 29 de outubro, contra a reforma na organização do ensino público que o governador Geraldo Alckmin (PSDB) tem implementado no estado.

"Com a reorganização, o aluno que mora em um determinado bairro, está sendo deslocado muitas vezes para outro a 3km. Já soubemos que houve manifestações nas unidades escolares contra essa medida que não tem sustentação pedagógica. O que o governo está implementando aqui visa fechar 30% das unidades", explica.

Aniversário da Petrobras - No dia 2, os movimentos também irão celebrar os 62 anos da Petrobras e, como parte da festa, a frente dará início à mobilização diante da sede da estatal na Paulista com a peça teatral "Somos todos petroleiros".

Segundo a secretária de Juventude da CUT-SP, Cibele Vieira, o texto remete à histórica greve de 1995 e mostra que o cenário da época é semelhante ao momento atual pelo qual passa a estatal. "Pouca gente duvida que há interesse internacional do petróleo no Iraque, no Oriente Médio, mas muita gente duvida que exista esse mesmo interesse no Brasil. Como o pré-sal, passaremos de 12º para 5º no ranking de produtores de petróleo, tem muita coisa em disputa", alertou.

Ela lembrou ainda que a categoria já aprovou uma greve geral que tem como pauta a defesa dos investimentos na companhia e alertou para ataques contra o patrimônio nacional, como o mais recente deles, o Projeto de Lei do Senado 555, que abre o capital de todas as estatais.

Como Douglas Izzo, ela também alertou para a independência dos movimentos expressa em cobranças como a própria defesa da estatal e os ataques ao ajuste fiscal. Mas reforçou que a Frente tem lado. "Fosse outro governo, não estaríamos contra um plano de negócio, mas contra a privatização", pontuou.

Estratégia suicida

Ao comentar a recente dança de cadeiras nos ministérios, o coordenador estadual da CMP (Coordenação dos Movimentos Populares), Raimundo Bonfim, defendeu que o governo comete um erro ao montar uma pauta política baseada apenas no Congresso Nacional e recomenda ao governo olhar para quem o elegeu.

"Para barrar o impeachment e enfrentar a crise é preciso recompor a base social responsável pela vitória em 2014. Ou o governo vai continuar sendo chantageado com a pecha do impeachment e com uma plataforma que não foi a da eleição passada", falou.

Raimundo disse, ainda, que a Frente já solicitou uma audiência com Dilma e foi mais uma vez explicar, didaticamente, como ocorreu em todas as coletivas prévias às mobilizações, a independência dos movimentos que vão às ruas no sábado. "Não flertamos com o impeachment, somos a favor da democracia, contra o golpe, mas isso não significa apoio ao ajuste fiscal. Nós pedimos voto, apoiamos a presidenta, mas o programa e o discurso eram outros".

Compromisso com acertos                             

Presidenta da UNE (União Nacional dos Estudantes), Carina Vitral lembrou que o governo tem a obrigação de manter o compromisso com a distribuição de renda para aprofundar as conquistas que ele mesmo implementou nos últimos 12 anos.

"O objetivo é disputar a agenda política e econômica para que a vida dos estudantes, trabalhadores, petroleiros, movimentos de bairro continue mudando e tendo conquistas e vitórias".

Para isso, defendeu, é preciso impedir que as denúncias de corrupção na Petrobras não sejam usadas para privatizar a empresa, como defendem setores ligados ao lobby internacional das petroleiras, e que o governo assume realmente a ideia de pátria educadora. Princípio que demanda investimentos e vontade política, definiu.

"Para nós, a ideia de pátria educadora seria o PNE (Plano Nacional de Educação) implementado, 10% do PIB para a educação em prática até 2024, duplicar as vagas no ensino superior. Por isso, a superação da crise política é fundamental para discutir o país, porque hoje o debate público está interditado por um impeachment sem pé nem cabeça."

A certeza, conforme definiu o membro da direção nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), João Paulo Rodrigues, é que a ação do governo será proporcional à pressão das ruas. "Acredito que teremos um outubro bastante avermelhado pelas lutas em todos o país."