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Incidência de infecções por HIV nas mulheres tem como causa a violência sexual

Combate e prevenção ao HIV nas mulheres são lutas que fazem parte da Campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres

Publicado: 03 Dezembro, 2024 - 17h32 | Última modificação: 04 Dezembro, 2024 - 14h31

Escrito por: André Accarini

Ahead/CUT
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Ao contrário dos estigmas e preconceitos enraizados em nossa sociedade, o HIV, vírus da imunodeficiência adquirida, não infecta apenas a população LGBTQIA+. Homens e mulheres heterossexuais também são infectados. De acordo com os dados da Unaids, agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para o tema, em todo o planeta, em 2023, 44% das novas infecções foram entre mulheres e meninas.

No Brasil, também em 2023, de um total de 16.281 novos casos de infecção pelo vírus, 4.702 foram em mulheres. No ano anterior, 2022, os números foram maiores. O total de casos foi de 36.753, sendo 26.123 em homens e 10.623 em mulheres.

A infecção por HIV nas mulheres faz parte das pautas de luta da Campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres. Deve-se ao fato de que as mulheres estão mais vulneráveis à infeção por diversos fatores sociais, de gênero e culturais. Entre eles destacam-se:

- a desigualdade de gênero nos mais diversos setores da sociedade, em especial dentro do ambiente doméstico em que a estrutura patriarcal impede que elas tenham autonomia para, por exemplo, evitar a violência sexual e exigir o uso de preservativos; 

- o estigma social que impede as mulheres de buscaram tratamento;

- os tabus culturais que a obrigam a deixar de lado o uso de métodos de prevenção;

- a dependência econômica que faz com a mulher seja submissa ao parceiro e o acesso ao tratamento, mais difundido entre os homens;

- os altos índices de violência sexual praticados contra a mulher: uma mulher sofre violência sexual no país a cada 46 minutos, segundo o Atlas da Violência 2024, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O Relatório de Monitoramento Clínico do HIV, do Ministério da Saúde, aponta que as mulheres apresentam piores desfechos em todas as etapas do cuidado com a doença. Enquanto 92% dos homens estão diagnosticados, apenas 86% das mulheres possuem diagnóstico; 82% dos homens recebem tratamento antirretroviral, mas 79% das mulheres estão em tratamento; e 96% dos homens estão com a carga viral suprimida – quando o risco de transmitir o vírus é igual a zero – mas o número fica em 94% entre as mulheres.

“A desigualdade de gênero está na raiz do problema. O enfrentamento à incidência de infecções sexualmente transmissíveis [IST´s] e HIV/AIDS entre mulheres, especialmente, as mais jovens, deve ter como base uma política pública que envolva não apenas o Ministério da Saúde. É preciso enfrentar, por exemplo, no âmbito da educação, posições retrógradas que dificultam a abordagem da educação sexual nas escolas”, afirma a secretaria de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT Nacional, Jandyra Uehara.

Ela explica que a educação é ponto fundamental para combater a discriminação e desconstruir os preconceitos que acompanham o tema.

No mesmo sentido, a secretária de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora da CUT, Josivania Ribeiro Cruz Souza, afirma que é papel da CUT atuar para promover e proteger a saúde das mulheres em relação ao HIV.

“É uma questão de saúde pública e de direitos humanos, que afeta diretamente a vida das trabalhadoras e a sua capacidade de se manterem inseridas no mercado de trabalho de forma digna” diz a dirigente, elevando os principais motivos:

  1. Desigualdades de gênero: as mulheres enfrentam barreiras específicas no acesso à prevenção, diagnóstico e tratamento do HIV. Além disso, muitas vezes estão sujeitas a situações de violência e desigualdade que aumentam sua vulnerabilidade;
  2. Impactos no trabalho: a infecção por HIV pode prejudicar a saúde física e mental, além de gerar estigma e discriminação no ambiente de trabalho. Isso compromete a manutenção do emprego e o acesso a direitos trabalhistas;
  3. Estigma e discriminação: Mulheres vivendo com HIV enfrentam preconceitos que podem levá-las ao isolamento social, dificultando sua organização e luta por melhores condições de vida e trabalho;
  4. Falta de políticas específicas: muitas políticas de saúde e segurança no trabalho não contemplam adequadamente a dimensão de gênero ou as necessidades específicas das mulheres no enfrentamento ao HIV.

Promover a conscientização

A atuação sindical, diz Josivania, é essencial para informar, educar e mobilizar as trabalhadoras sobre direitos relacionados à saúde, prevenção e acesso ao tratamento, além de fortalecer o combate ao preconceito no local de trabalho.

“Ao promover ações e campanhas, a CUT pode contribuir para reduzir o impacto do HIV na vida das mulheres, fortalecer sua autonomia e garantir que o ambiente de trabalho seja um espaço de acolhimento e respeito”, ela pontua.

HIV/Aids

Dia Mundial de Combate ao HIV/Aids, o dia 1° de dezembro está no calendário de lutas dos 21 Dias de Ativismo pelo fim da Violência Contra a Mulher, campanha da Organização das Nações Unidas (ONU) da qual a CUT faz parte.

De acordo com o Relatório Global de 2023 do Unaids, programa da ONU, cerca de 39 milhões de pessoas em todo o planeta vivem com o HIV. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mulheres que sofreram violência física e sexual tem 1,5 vez mais probabilidade de contrair o HIV do que as que não sofreram esse tipo de violência.

Ainda de acordo com a OMS, entre as populações marginalizadas, como profissionais do sexo ou mulheres transexuais, uma alta prevalência de violência está ligada a taxas mais altas de infecção pelo HIV.

No Brasil, cerca de 990 mil pessoas vivem com o HIV, sendo 350 mil mulheres. O Sistema Único de Saúde (SUS) garante acesso integral e gratuito aos medicamentos para tratar os pacientes, além de fazer campanhas de enfretamento, testagem rápida e gratuita e dezenas de outras ações, que contribuíram, ao longo dos anos, para reduzir taxa de transmissão e mortalidade.

Informação que salva vidas

Ao Portal CUT, em 2022, o psicólogo Eduardo Oliveira, do Projeto Demonstrativo PrEP1519, e integrante de grupo de ativistas que atua nas redes sociais com o nome de Doutor Maravilha (@doutormaravilha no Instagram), para orientar, acolher e desconstruir preconceitos contra pessoas que vivem com o vírus, afirmou que não existe um rosto para o HIV.

“O HIV pode acontecer com qualquer pessoa, independe da classe, cor, expressão ou identidade de gênero”, diz Eduardo, que também atua em um Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) na cidade de São Paulo.

De acordo com ele, é importante que toda a sociedade tenha consciência sobre isso para que grupos sociais, como os heterossexuais, não se sintam “imunes” ao vírus. “Lá nos anos 1980, quando apareceu o HIV, havia a ideia muito forte de que existiam grupos sociais disseminadores [os gays] e a concepção de peste gay, castigo divino e a gente vem combatendo essa ideia porque ela afasta esses grupos, como os heterossexuais, de acharem que podem se infectar”, diz o psicólogo.

O conceito principal, portanto, é de que ninguém está imune e os métodos de prevenção têm de ser praticados por todos e todas.

Estigmas e preconceito

Um dos principais objetivos das campanhas realizadas durante o Dezembro Vermelho é justamente o combate ao preconceito. Quem vive com o HIV sabe a dor que sente. E, muitas vezes, o medo de ficar estigmatizado, sofrer preconceito faz com que a pessoas não façam o teste por medo ser positivo e ser visto pela família, pelos amigos e pelos colegas de trabalho como alguém a ser evitado. 

Por isso acabar com o preconceito e garantir acesso ao tratamento e aos cuidados são fatores fundamentais para o enfrentamento ao vírus.

Indetectável = Intransmissível (I=I)

Quando a pessoa vivendo com HIV faz o uso correto dos medicamentos antirretrovirais, é muito provável que ela consiga o controle do HIV. Isso é medido regularmente pelo exame de carga viral, cujo resultado expressa a quantidade de vírus presente no sangue. Estima-se que, após seis meses do início do tratamento antirretroviral (TARV) adequado, o exame de carga viral tenha seu resultado “indetectável”.

O resultado indetectável quer dizer que não foi possível encontrar vírus naquela amostra de sangue. No entanto, as evidências científicas obtidas a partir de estudos que incluíram vários países, comprovaram que não há risco de transmissão do HIV por via sexual para as pessoas com adequada adesão aos antirretrovirais e com carga viral indetectável por pelo menos seis meses.

Significa, em outras palavras que a quantidade de cópias do vírus por mililitro de sangue é tão ínfima de modo que o HIV se torna intransmissível por vias sexuais.

De acordo com a Unaids, "a consciência de que o HIV não mais pode ser transmitido sexualmente pode dar a essas pessoas com carga viral indetectável um forte senso de que elas são agentes de prevenção em sua abordagem perante relacionamentos novos ou já existentes".