Escrito por: CUT-RS
Protesto foi realizado em em frente ao mercado público de Porto Alegre por grupos Kaingang, Mbya Guarani, Charrua e Xokleng
Sob os gritos de “demarcação já”, “fora Bolsonaro” e “o Brasil é nosso”, integrantes de povos indígenas realizaram ato contra a tese jurídica do marco temporal e por justiça para Bruno Pereira, Dom Phillips e todos os que morreram em defesa da vida e dos direitos indígenas, na tarde desta quinta-feira (23), no centro de Porto Alegre.
Grupos dos povos Kaingang, Mbya Guarani, Charrua e Xokleng da região metropolitana se concentraram em frente ao Mercado Público, levantando faixas e cartazes, e entoando cânticos e palavras de ordem em linguagens tradicionais.
Depois saíram em caminhada pelo Centro Histórico, passando pela Rua dos Andradas até a Praça da Alfândega, indo em seguida até a Esquina Democrática.
A mobilização reforçou o dia nacional de luta, que aconteceu também em outros pontos do estado e do país. Nesta quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) voltaria a julgar a tese do marco temporal. No entanto, o adiamento da pauta decidido, no início do mês, pelo presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, fez deste 23 de junho um dia de manifestações dos povos originários de todo o Brasil.
O cacique Jeremias Eufrásio, da comunidade Kaingang Por Fi Ga, de São Leopoldo, afirmou que a mobilização dos povos originários se dá em conjunto com outras regiões do estado. "Os caciques vieram todos com seus grupos, vamos trabalhar juntos. Queremos o nosso direito. É um dever nosso, a terra é dos nossos filhos e netos. Nós vamos morrer, mas eles vão continuar na mesma luta", disse.
Solidariedade aos povos originários
O presidente da CUT-RS, Amarildo Cenci, falou da importância de prestar solidariedade. “É um dia nacional de luta pela demarcação das terras indígenas, que são objetos de tanta ganância e cobiça no sistema capitalista, por conta do agronegócio que mais quer destruir, do que produzir, somando as mineradoras aos interesses mais escusos, que destroem a floresta, ocupam áreas dos povos originários. Com toda legitimidade e toda justiça, os povos indígenas estão aqui para pedir que essas terras sejam demarcadas e aquelas que foram ocupadas de forma ilegal, que sejam devolvidas”, destacou.
Para ele, essa luta é de todos e todas. “A luta indígena é a luta de todo brasileiro consciente dos seus direitos, das suas obrigações, no sentido de termos uma pátria que reconheça os povos originários e defenda a sua cultura, que preserve essa cultura e que a gente possa falar para o mundo, que aqui é um país justo e soberano”, defendeu Amarildo.
Marco temporal expulsa indígenas das suas terras
O cacique Maurício Salvador, da retomada Kaingang na Floresta Nacional de Canela, ressaltou que a decisão das terras indígenas passa pelos povos originários. "Essa mobilização aqui é para dizer que, antes de qualquer decisão sobre as terras ancestrais e direitos indígenas, os povos originários precisam ser consultados. Pedimos também paz dentro dos territórios, pois o que vem acontecendo é muita violência contra os apoiadores e lideranças", protestou.
O vice-presidente da CUT-RS, Everton Gimenis, também levou solidariedade a todos os povos originários. “Todo o nosso apoio à luta contra o marco temporal e pela demarcação das terras indígenas. Porque nós entendemos que a demarcação deve ser feita pela vivência dos povos indígenas nessas terras e não por um determinado tempo. Esse marco temporal só vem para tentar tirar e expulsar os índios da sua terra. Só vem para atacar o meio ambiente e favorecer as grandes mineradoras, o garimpo ilegal e os grileiros”, denunciou.
Gimenis denunciou a política de Bolsonaro. “Por isso, temos que lutar contra o marco temporal. Tudo isso que está acontecendo tem um culpado. Quem se lembra que, nas eleições de 2018, o Bolsonaro dizia que não tinha que falar mais em demarcação de terra, porque os índios, na visão dele, já tinham muitas terras? Ele disse que o que tinha era para dar espaço para as mineradoras e grileiros. Ele cumpriu com isso”, criticou.
Justiça por Bruno Pereira e Dom Phillips
A cacica Collung, da retomada Konglui, explicou que a manifestação era também sobre memória. "O ato é contra a morte do Bruno e do Dom, que foram sequestrados lá no Amazonas, que perderam suas vidas pela causa indígena, assim como amigos e parentes que trocaram suas vidas por sangue e deixaram uma saudade para os povos indígenas. Estamos aqui firmes e com coragem para continuar a luta", avisou a cacica do povo Xokleng, que luta pela sua terra na Floresta Nacional em São Francisco de Paula.
Amarildo chamou a atenção para o aumento da violência. “A gente vive num país com aprofundamento da violência, que matou o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips, que estava aqui expondo ao mundo as barbaridades que são feitas com a Amazônia e os povo ali existentes”, observou.
O presidente da CUT-RS apontou que temos que buscar justiça. “Mais do que nunca, nós temos que estar junto para que essas questões sejam esclarecidas, os mandantes sejam revelados e a gente se una na defesa dos povos originários, de suas terras e na preservação da nossa Amazônia”, defendeu.
Gimenis enfatizou que “a morte do Bruno e do Dom tem culpados: a política genocida do governo Bolsonaro. O Bolsonaro está com as mãos sujas de sangue com a morte de Bruno e Dom, como de milhares de índios nesse país porque ele, com essa política, incentivou esse tipo de ataque, incentivou a invasão das terras indígenas e o desmatamento. Por isso, ele é culpado sim e nós temos que lutar muito para derrotar Bolsonaro e essa política genocida”.
O representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Roberto Liebgott, relatou que os indígenas estabelecem uma relação transcendental com aqueles que se unem à luta de seus povos.
"O Bruno cumpriu um papel essencial no indigenismo. Primeiro, no indigenismo oficial, na Funai, de onde foi exonerado exatamente por cumprir sua função institucional. Ele representa mais um daqueles que tombaram em defesa da causa indígena. É uma relação que se faz com quem lutava lá no Amazonas, distante do Rio Grande do Sul. Os indígenas falam em uma conexão espiritual", apontou.