Escrito por: Rosely Rocha
Preços do gás de cozinha, energia e alimentos pressionam a inflação sentida no bolso das famílias mais pobres
O ano de 2022 não começou bem para as famílias de baixa renda que viram o poder de compra diminuir ainda mais com a alta de preços de produtos básicos como gás de cozinha, energia e alimentos, no caso deste último, embora os preços estejam mais estáveis, não baixaram. Em janeiro deste ano, inflação foi a maior em seis anos.
Para as famílias de renda muito baixa, a inflação em janeiro deste ano (0,63%), é o triplo em relação ao mesmo mês de 2021, que foi de 0,21%. Já nos últimos 12 meses, a inflação para essa faixa de rendimento e também para as famílias de renda média-baixa ficou 1% acima do custo de vida em relação a quem tem renda mais elevada.
Nestes 12 meses, o custo de vida dos mais pobres chegou a 10,5%; os de renda média-baixa a 10,8%. Já no caso das famílias de classe alta, a inflação ficou em um dígito: 9,6%, segundo o indicador “Inflação por faixa de renda”, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O IPEA considera renda alta, famílias que somam rendimento de mais de R$ 16.509,66 por mês; média-baixa, de R$ 2.702,88 a R$ 4.506,47; e muito baixa, as familias que somam rendimentos de menos de R$ 1.650,50.
Por que os pobres sentem mais a inflação
Os pobres sentem mais a inflação porque produtos básicos não podem ser substituídos, como são os casos da energia, da água e do gás de cozinha, que mais pressionaram os preços para esse estrato social, explica a técnica da subseção da CUT Nacional do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Adriana Marcolino.
Em 12 meses, as tarifas de energia aumentaram 27% e o botijão de gás de 13 quilos, 31%, diz a técnica, que lembra que os consumidores não podem trocar os fornecedores de produtos como energia e água e, portanto, as dicas para economizar tratam sempre de usar menos, fechar a torneira ou apagar a luz, por exemplo.
“Ninguém pode trocar a empresa que fornece energia e a água da sua casa, nem deve substituir o gás por querosene ou álcool, pelo risco de queimaduras e até mortes. Com a alta desses produtos e dos alimentos, que pararam de subir, mas num patamar ainda elevado, o poder de compra dos pobres cai. Já as classes altas, pelo rendimento que possuem, não sentem tanto esses reajustes”, diz Adriana.
“Quem ganha um salário mínimo (R$ 1.212) compromete 10% ou mais de sua renda num botijão de gás; quem ganha R$ 12 mil, dez vezes mais do que o mínimo, compromete apenas 1% do seu orçamento”, explica a técnica.
De acordo com o IPEA, os produtos que mais pesaram no bolso da classe mais alta foram a gasolina (42,7%) e do etanol (55%).
Mesmo os sem-casa e sem-carro sofrem com alta dos preços
Apesar de não precisar gastar com combustíveis, gás de cozinha e tarifa de energia por viver numa casa oferecida por uma Organização não Governamental (ONG), no bairro da Santa Cruz, zona sul de São Paulo, a vida de Mariayde Veloso, de 38 anos, separada, mãe de dois filhos, de 18 e 15 anos, só piorou no último ano.
Mary, como é conhecida, tinha casa e cursava pedagogia, que acabou por não terminar. Sem emprego, perdeu tudo e foi acolhida pela ONG que oferece hospedagem coletiva, mas os itens de higiene e alimentação são por conta dela, que atualmente sobrevive com algumas faxinas esporádicas.
A sua maior preocupação é com o filho mais novo que tem sérios problemas de obesidade e fazia tratamento gratuito com um renomado hospital privado, a partir de um convênio com o SUS. Sem o tratamento ele engordou novamente, apesar da dieta rigorosa que faz.
Mary teve que mudar alguns itens da alimentação do filho por causa do preço. Cortou o suplemento da manhã, não pode mais comprar pera e uvas e a geleia sem açúcar. O seu orçamento também não cobre o salmão e o atum grelhado, nem mesmo o ovo cozido que a criança precisa, por terem gorduras não saturadas, pois tudo o que ele come vai para a corrente sanguínea muito rapidamente.
“Eu como só o arroz com feijão e alguma mistura que a ONG oferece, mas gasto, no mínimo R$ 700 com a alimentação do meu filho. Para piorar o meu mais velho está com problemas de autoestima e eu ando deprimida, necessitando de remédios”, conta.
Até mesmo o antigo Bolsa Família ela perdeu em outubro passado, na mudança para o Auxílio Brasil, e tem de esperar até o próximo mês de março para ver se consegue retomar o benefício.
“Nós tínhamos casa, o nosso cantinho, e com tudo tão caro, sem emprego, só me resta ir à luta, manter a esperança e rezar por dias melhores”, diz Mary.
Dicas são para usar ou comprar menos ou deixar de usar ou comprar
A situação das famílias mais pobres se agravou tanto que até mesmo veículos de imprensa conservadores têm buscado dar informações sobre como economizar. Na edição da última segunda-feira (14), o colunista Claudio Considera ex-diretor do Ipea, usou seu espaço no jornal O Estado de S. Paulo para dar dicas de como economizar, entre elas, como disse Adriana, usar menos energia, deixando o carro em casa e até tomando menos café, que acumula alta de 56,87% nos últimos 12 meses.
Confira as dicas do economista: