Inspeção do trabalho resgata 942 pessoas escravizadas e garante direitos e reparação
Para CUT, com Bolsonaro que reduziu pela metade as verbas deste ano para fiscalização do trabalho, situações análogas à escravidão irão aumentar, junto com desemprego e o desamparo social
Publicado: 28 Janeiro, 2021 - 13h14 | Última modificação: 28 Janeiro, 2021 - 15h41
Escrito por: Érica Aragão
No ano da pandemia, em que a necessidade de uma maior proteção social foi maior, o governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) retirou verbas da fiscalização do trabalho, incentivou invasões e se colocou ao lado de maus empresários que não cumprem a legislação trabalhista, e ainda debochou do trabalho escravo. Em novembro de 2020, o presidente defendeu fazendeiros dizendo que “ eles não podem perder suas terras por conta disso”.
Os valores de fiscalização caíram de R$ 55,6 milhões, em média, entre 2013 e 2018, para R$ 29,3 milhões no ano passado, e a previsão orçamentária para 2021 é de apenas R$ 24,1 milhões.
Embora não se tenha motivos para comemorar este 28 de janeiro, Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, com o processo de desmonte nas condições de fiscalização , em 2020 foram encontrados pela Inspeção do Trabalho, 942 trabalhadores explorados em condições de trabalho análogas às de escravo.
Foram 266 fiscalizações pelo país feitas pelos Auditores-Fiscais do Trabalho, também conquistaram na Justiça um total de R$ 3.063.596,48 de verbas salariais e rescisórias e a formalização de 1.267 contratos de trabalho durante as operações de combate ao trabalho escravo. Os dados são do Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil.
Os dados oficiais das ações de combate ao trabalho análogo ao de escravo no Brasil estão disponíveis no Radar do Trabalho Escravo da SIT. As informações também foram divulgadas pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), que comemora também nesta quinta-feira, o Dia Nacional do Auditor-Fiscal do Trabalho. Veja programação abaixo.
Coordenados por auditores fiscais em parceria com o Ministério Público do Trabalho, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União, entre outras instituições, as operações foram feitas por grupos especiais de fiscalização móvel. Equipes ligadas às Superintendências Regionais do Trabalho nos estados, que contam com o apoio das Polícias Civil, Militar e Ambiental, também participaram das fiscalizações.
Trabalho escravo nos estados
A maior parcela de casos de trabalho escravo foi registrada por equipes de 13 unidades regionais da Inspeção do Trabalho, na Bahia, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará, Piauí, Paraná, Rio de Janeiro, Rondônia, Rio Grande do Sul e São Paulo. O Grupo Móvel encontrou exploração de trabalho análogo à escravidão em 11 das 15 unidades de Federação onde atuou, nas áreas urbanas e rurais.
Minas Gerais foi o estado com mais ações fiscais de combate ao trabalho escravo no país, com 63 empregadores fiscalizados e com maior número de trabalhadores resgatados (351). Assim como em 2019, o maior resgate de trabalhadores em um único estabelecimento em 2020 ocorreu no Distrito Federal, onde 78 trabalhadores estavam trabalhando em condições degradantes para uma seita religiosa.
Segundo o subsecretário de Inspeção do Trabalho, Romulo Machado e Silva, o resultado ratifica o trabalho que vem sendo executado há 25 anos no combate ao trabalho escravo. Para ele a atuação, em termos da fiscalização de uma temática prioritária como essa, é extremamente técnica.
“Entendo que nossa atuação contribui efetivamente para a redução dessa que é a pior forma de trabalho no país. Nesta missão, contamos com os parceiros para ampliarmos a proteção dos trabalhadores mais vulneráveis e para que essa prática seja efetivamente abolida da nossa sociedade”, diz.
Além disso, segundo ele, uma nova estratégia da atuação da inspeção do trabalho, voltada para o diálogo com as cadeias produtivas, por meio da atuação setorial, estará sendo implantada
Combate ao trabalho escravo só com #ForaBolsonaro
A Secretária Nacional de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara, diz, que além de menor recurso para o combate ao trabalho escravo, o país vive uma pandemia junto com desemprego alarmante, a miséria, a destruição de políticas sociais somada ao desmonte dos mecanismos de fiscalização e a impunidade dos modernos escravizadores “criam as condições para o crescimento desta terrível violação de direitos humanos no Brasil”.
“Para criar as condições de acabar com a escravização no Brasil é preciso pôr fim o mais rápido possível ao governo de Bolsonaro e à política neofascista e neoliberal. Com Bolsonaro o poder e a impunidade dos escravizadores aumenta e é por isso que é urgente o Fora Bolsonaro”, destacou a dirigente.
Perfil dos resgatados
Em relação ao perfil social das pessoas resgatadas em 2020, dados do seguro-desemprego do trabalhador resgatado mostram que 89% eram homens; 64% tinham entre 18 e 39 anos; 70% residiam nas regiões sudeste ou nordeste; 44% tinham nascido na região nordeste e 77% se autodeclararam negros ou pardos, 18% brancos e 5% indígenas. Quanto ao grau de instrução, 21% declararam possuir ensino médio completo, 20% haviam cursado do 6º ao 9º ano e outros 20% até o 5º ano. Do total, 8% dos trabalhadores resgatados em 2020 eram analfabetos.
Em 2020 foram resgatados de condição análoga à de escravo 41 migrantes, sendo 15 paraguaios, 10 peruanos, 8 venezuelanos, 5 bolivianos, 2 chineses e uma filipina.
Atividades econômicas
As atividades econômicas onde houve constatação de mão-de-obra em condição análoga à de escravo em 2020, quanto ao número de resgatados, foram o cultivo de café (140), a produção de carvão vegetal (107), o comércio varejista (91), o cultivo de cebola (65) e a montagem industrial (63). Em 2020 prevaleceram as ocorrências de trabalho escravo no meio rural, com percentuais muito próximos de 2019. O quantitativo de vítimas de casos de trabalho escravo rural foi de aproximadamente 78% do total.
O trabalho escravo urbano teve 211 vítimas em atividades econômicas, dentre elas comércio varejista de produtos não especificados (78), montagem industrial (63), construção civil (38). No meio urbano foram resgatadas três vítimas de trabalho escravo doméstico.
Sobre o dia 28
O dia 28 de janeiro é o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, data instituída pela Lei nº 12.064, de 29 de outubro de 2009. 28 de janeiro também é celebrado o Dia Nacional do Auditor-Fiscal do Trabalho, conforme a Lei nº 11.905, de 20 de janeiro de 2009, em homenagem aos Auditores-Fiscais do Trabalho Erastóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e ao motorista Ailton Pereira de Oliveira, que foram assassinados em 28 de janeiro de 2004 quando se deslocavam para uma inspeção em fazendas da região de Unaí (MG), episódio que ficou conhecido como Chacina de Unaí.
Definição de trabalho escravo
Quatro elementos podem definir escravidão contemporânea, de acordo com o artigo 149 do Código Penal: trabalho forçado (que envolve cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida) ou jornada exaustiva (levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida).
Como denunciar
Denúncias de trabalho escravo podem ser feitas de forma remota e sigilosa no Sistema Ipê, sistema lançado em 2020 pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Programação
*Edição: Rosely Rocha