Juíza que negou aborto para menina estuprada é promovida em SC
A juiza deixou o caso porque foi promovida e mudou de cidade. Justiça tirou a menina de abrigo onde era mantida para “aguentar” a gravidez para casa
Publicado: 21 Junho, 2022 - 17h39 | Última modificação: 22 Junho, 2022 - 11h58
Escrito por: Redação CUT | Editado por: Marize Muniz
A juíza Joana Ribeiro Zimmer não é mais a responsável pelo caso da menina de 11 anos que ficou grávida após ser estuprada. A garota também não está mais no abrigo para onde foi encaminhada após ter o pedido de aborto legal negado por Zimmer. A Justiça de Santa Catarina determinou, nesta terça-feira (21), que a menina volte a morar com a mãe.
Mas, Zimmer não deixou o caso por causa da sua decisão que colocou em risco a vida e a saúde mental da menina. Ela foi promovida e não estava mais como titular da Vara Cível da comarca de Tijuca desde a última sexta-feira (17). No dia 15 de junho, ela foi promovida em uma sessão do Órgão Especial, que faz a gestão de carreiras dos magistrados, segundo o Universa.
Agora, a juiza atua na comarca de Brusque, no Vale do Itajaí. A mudança ocorreu antes da repercussão do caso da garota que, segundo especialistas em direitos humanos, foi torturada na audiência realizada para pedir o aborto legal que foi negado.
A promotora Mirela Dutra Alberton também negou o direito ao aborto da menina.
A Corregedoria-Geral da Justiça do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) apura a conduta da juíza.
O Conselho Nacional de Justiça também recebeu uma reclamação disciplinar contra a magistrada.
Segundo a advogada da família Daniela Felix, já existe uma decisão que autoriza a interrupção da gravidez da menina. Mas o fato de a criança estar um abrigo impedia que a execução. Essa autorização continua em vigor. A menina está grávida de 29 semanas.
O deputado federal e ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha (PT-SP) anunciou hoje que entrará com representação no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra a promotora Mirela Dutra Alberton e a juíza Joana Ribeiro Zimmer, por manterem a menina de 11 anos, grávida após ser vítima de estupro, em um abrigo, na Grande Florianópolis, há mais de um mês, para evitar que fizesse o aborto, autorizado por lei.
Reportagem do site The Intercept Brasil produzida em conjunto com o portal Catarinas, e divulgada nesta segunda-feira (20) revelou que a promotora e a juíza de Santa Catarina vêm pressionando a vítima e sua mãe, contra a vontade delas, a seguir com a gravidez e realizar o parto antecipado.
As profissionais do Direito defendem que a gestação prossiga para que o bebê seja entregue à adoção, a despeito dos riscos à saúde da criança, apontados em laudos médicos anexados ao processo.
O caso chegou à Justiça após a equipe médica do Hospital Universitário Professor Polydoro Ernani de São Thiago, ligado à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), se recusar a realizar o procedimento, em 4 de maio. A unidade alegou que, pelas normas do hospital, o aborto só era permitido até a 20ª semana de gestação. A menina, que à época tinha 10 anos, segundo os veículos, estava com 22 semanas e dois dias. O Código Penal permite, no entanto, o aborto em caso de violência sexual, sem impor qualquer limitação de semanas da gravidez ou exigir autorização judicial.
‘Quer escolher um nome?’
A partir daí, o Ministério Público do estado pediu o acolhimento institucional da menina em um abrigo, longe de sua família, o que foi autorizado pela juíza. Nas audiências para autorizar o aborto, no entanto, Joana Zimmer e Mirela Alberton sugerem à criança que mantenha a gravidez “por mais uma ou duas semanas”. O aborto é mencionado pela promotora, mas comparado à eutanásia. “A gente mantinha mais uma ou duas semanas apenas a tua barriga, porque, para ele ter a chance de sobreviver mais, ele precisa tomar os medicamentos para o pulmão se formar completamente”, recomenda.
A juíza prossegue, acrescentando a ideia de que a gestação prossiga para que o bebê seja entregue à adoção. Joana chega a perguntar à criança se ela acha “que o pai do bebê concordaria pra entrega para adoção”. A magistrada diz ainda para a mãe da vítima que “essa tristeza de hoje para a senhora e para a sua filha é a felicidade de um casal”. Ela também pergunta se a criança quer escolher um nome para o bebê.
De acordo com a reportagem, diante do desejo da vítima e de sua mão de realizar o aborto, a resistência da juíza em tirar a menina do abrigo aumentou. E, desde então, ela vem sendo mantida na instituição. Apenas na última sexta (17) a mãe pôde ficar com a filha – que, segundo laudos psicológicos, afirma estar se sentindo “muito triste por estar longe de casa”.
Direito negado
Para Padilha, “é um absurdo” que a juíza e a promotora “induzam uma criança a gestar o resultado de um estupro”. O deputado federal observa que a conduta das profissionais do direito contrariam a Lei 12.845 de 2013, conhecida como Lei do Minuto Seguinte. A legislação determina que hospitais da rede pública ofereçam às vítimas “atendimento emergencial, integral e multidisciplinar, visando ao controle e tratamento dos agravos físicos e psíquicos decorrentes do abuso”. “É um direito”, destacou o parlamentar em suas redes. “Estou indignado pois trabalhei na criação da lei que prevê atendimento humanizado nesses casos.”
O deputado afirmou que apresentará também requerimento de informação ao Ministério da Saúde sobre o cumprimento da lei pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A magistrada do caso alega, no processo, que o aborto não pode ser realizado por conta da gravidez exceder as 22 semanas, definidas pelo ministério. Na reportagem, a jurista Deborah Duprat, ex-subprocuradora da República, frisou que o argumento não se sustenta. Isso porque, de acordo com a jurista, o Código Penal permite o aborto em qualquer época. “Ainda mais em uma criança”, ressaltou. “Além do impacto psicológico, tem a questão da integridade física. É um corpo que não está preparado para gravidez”, explicou.
Laudos médicos também recomendam a interrupção da gestação da menina alegando riscos como anemia grave, pré-eclâmpsia, maior chance de hemorragias e até histerectomia – a retirada do útero, consequência irreversível.
Com informações da RBA e do Universa.