Escrito por: Redação CUT
Decisão do Tribunal Regional do Trabalho de Brasília atende reivindicação que a CUT e demais centrais fizeram ao Ministério Público do Trabalho, que entrou com a ação
Quase três anos depois da denúncia feita pela CUT e demais centrais ao Ministério Público do Trabalho (MPT), o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 10ª Região, de Brasília, deu ganho de causa a ação impetrada pelo MPT e anulou o Parecer 03/17 do Conselho Federal de Medicina (CFM), que autorizava os médicos do trabalho a acessar os dados dos prontuários dos trabalhadores e das trabalhadoras.
No despacho divulgado na quinta-feira (27), a juíza substituta do Trabalho Elysangela de Souza Castro Dickel, da 4ª Vara do Trabalho, anulou também o inciso VIII do artigo nono, parágrafo primeiro da resolução 2.183/2018 e proibiu o CFM de editar atos normativos que permitam aos médicos o livre acesso as informações contidas nos prontuários dos trabalhadores, resalvadas as demais hipóteses permitidas nos artigos 73 e 89 do Código de Ética Médica.
“A decisão da Justiça do Trabalho é uma conquista da classe trabalhadora”, comemorou a Secretária de Saúde do Trabalhador da CUT, Madalena Margarida da Silva Teixeira, que ressaltou os esforços dos representantes dos trabalhadores e das trabalhadoras para anular o parecer do CFM.
Assim que o parecer foi editado, o Fórum Nacional de Saúde do Trabalhador das Centrais Sindicais, movimentos sociais, ONGs e órgãos e associações convidadas e atuantes na defesa da segurança e saúde do trabalhador e trabalhadora entraram com representação no MPT e divulgaram uma nota condenado a medida.
O parecer do CFM é mais um projeto “perverso de desmonte dos direitos trabalhistas e sociais conquistados a duras penas pela sociedade brasileira”, diz trecho da nota.
As entidades disseram ainda que a medida comprometia “quaisquer possibilidades de reparação dos agravos à saúde decorrentes das condições e do ambiente de trabalho”.
A Secretária de Saúde do Trabalhador da CUT reafirma as críticas feitas na época e acrescenta que a medida do CFM era claramente favorável aos patrões. Para ela, além de violar os direitos fundamentais de cidadania, “o parecer desvirtuava o dever constitucional do próprio Conselho Federal de Medicina, contrariando o código de ética profissional ao submeter os médicos do trabalho à defesa dos interesses do empregador, preterindo claramente a defesa da saúde pública, desvirtuando assim os princípios relacionados à saúde dos trabalhadores”.
De acordo com Madalena Margarida da Silva Teixeira, desde o golpe de 2016, que destituiu a presidenta Dilma Rousseff, os ataques contra os direitos da classe trabalhadora vêm de todos os lados. O primeiro foi à aprovação da reforma Trabalhista, em 2017, que legalizou o bico e tirou vários direitos conquistados. Depois, vieram mais tentativas de ataques, em especial na área da saúde do trabalhador.
“A nossa luta é para impedir que seja negado ao trabalhador o direito à vida, à saúde, o acesso a serviços públicos que garantam a promoção, proteção e reabilitação da saúde, bem como, a normatização de mecanismos de saúde e segurança nos locais de trabalho e sua implementação”, diz a secretária.
Entenda porque a CUT e demais centrais lutaram contra o Parecer do CFM:
Em 13 de fevereiro de 2017, o Conselho Federal de Medicina (CFM) editou o Parecer 3/17, liberando o acesso aos prontuários dos trabalhadores aos médicos do trabalho. “O médico do trabalho não está impedido de fundamentar a contestação do nexo técnico científico e dados do prontuário do trabalhador, especificamente atinente ao caso”.
O texto alterou o Parecer 13/2016, que garantia o sigilo do prontuário do trabalhador quando houvesse contestação do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NETP). “O médico perito não pode ter acesso ao prontuário do funcionário (paciente) e expor o sigilo contido no mesmo, principalmente quando este for responsável pelo prontuário resguardada às informações contidas no mesmo e não pela sua exposição, estando o médico impedido de revelar o sigilo que exponha o paciente.”
Para a CUT e demais centrais, a redação do Parecer 3/17, anulada pelo TRT da 10ª Região, permitia que o médico perito liberasse as informações confidencias que o trabalhador e a trabalhadora haviam feito durante as consultas em um claro desrespeito ao próprio Código de Ética Médica. Na nota divulgada em 2017, as entidades alertavam quanto “a violação” da privacidade do trabalhador, o que comprometia a dignidade e a necessária relação de confiança entre paciente e médico.
“Os médicos do trabalho são contratados pelos patrões e as informações prestadas pelo paciente/trabalhador e trabalhadora, se repassadas pelo médico, eximem as empresas de adotarem as medidas necessárias para a promoção da saúde e prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho”, alertaram a CUT, demais centrais e movimentos da área da saúde.
O Plenário do Conselho Nacional de Saúde considerou legítima a nota das entidades e divulgou nota lembrando artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos que garante proteção à vida privada, honra e reputação. A nota também reforça que existe um na Constituição Federal que diz que “ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, e que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Para finalizar, o Conselho Nacional de Saúde recomendou ao Conselho Federal de Medicina (CFM) a revogação do Parecer 3/17 e ao Ministério Público do Trabalho (MPT) a apuração da violação dos direitos e impactos na saúde dos trabalhadores e das trabalhadoras que esta medida poderia acarretar.
Resolução 2.183/2018
O Art. 9º da Resolução 2.183/2018 estabelece que: na contestação de nexo estabelecido pela perícia médica previdenciária, se o médico do trabalho detém elementos de convicção de que não há relação entre o trabalho e o diagnóstico da doença, deverá fazê-lo com critérios técnicos e científicos.
Parágrafo 1º Anulado
Inciso anulado pela decisão
VIII – relatórios e documentos médico ocupacionais, inclusive dados do prontuário, que poderão ser usados nos casos em que a contestação depender daquelas informações e enviá-las em caráter confidencial ao perito previdenciário.
Confira aqui a nota da CUT e demais centrais e aqui a nota do Conselho Nacional de Saúde.