Escrito por: Priscila Casale
Ação das multinacionais na Educação agride a soberania nacional
O grupo educacional norte-americano Laureate International Universities, controlado pelo grupo de investimentos estadunidense KKR, abocanhou mais uma importante instituição de ensino privada brasileira, a FMU.
Em comunicado divulgado esta semana, o Complexo Educacional FMU, que reúne as Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), Faculdades Integradas de São Paulo (FISP) e Faculdades Integradas Alcântara Machado e Faculdade de Artes Alcântara Machado (FIAM-FAAM), e possui cerca de 90 mil alunos matriculados, assume “protocolo de aliança”, com a multinacional. O valor da negociação foi de R$ 1 bilhão.
Com a compra da FMU, a múlti ultrapassa as 216 mil matrículas no ensino superior em diversas regiões do país, ampliando ainda mais a monopolização do setor em mãos estrangeiras.
A FMU é a 12ª aquisição realizada pela múlti norte-americana desde 2005, quando adentrou no mercado brasileiro a partir da compra da Universidade Anhembi-Morumbi, por cerca de R$ 2 bilhões.
Esse foi o segundo maior bloco de desnacionalização do ensino privado brasileiro, perdendo apenas para a fusão entre a Anhanguera e Kroton em abril deste ano. Com quase um milhão de alunos matriculados, este conglomerado tem como principais fundos de investimento o Blackstone Found e o Advent Internacional.
Se somados os números das matrículas nas mãos de grupos estrangeiros, teremos uma marca alarmante. São mais de 1,5 milhão de vagas do ensino superior brasileiro que estão à mercê dos interesses das multinacionais. Já que a educação privada não sofre qualquer regulamentação por parte do governo brasileiro.
O que, além de representar uma acentuada desnacionalização do setor, se configura como uma ameaça à soberania nacional.
Segundo os dados divulgados pelas próprias multinacionais, juntas elas possuem 1.535.300 matriculas do ensino superior. Superando em quase meio milhão as vagas das universidades federais brasileiras.
Hoje três grupos estrangeiros monopolizam o setor: o grupo Estácio, administrado pelo GP Investments, com 330 mil alunos; o grupo Kroton-Anhanguera, do Blackstone Found e Advent Internacional, com 989,7 mil alunos; e a Laureate, do fundo KKR, com seus, 216 mil alunos.
Tais conglomerados agem como descaradamente como cartel. Dividindo as suas áreas de atuação, combinando preços de mensalidades e adotando os mesmos métodos de espoliação dos alunos.
Os únicos órgãos que não reparam (ou não querem reparar) e não agem (ou não querem agir) contra essa malta, são justamente aqueles que deveriam atuar em defesa dos estudantes brasileiros e da livre atividade econômica no país.
O conjunto dessas transações devem ser autorizadas pelo Conselho de Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que rege as relações comerciais no país. Entretanto, o órgão está longe de ser um defensor da economia nacional.
O Cade jamais se opôs à aquisição das universidades brasileiras pelas múltis e inclusive não vê problemas na ideia. Tanto é que no último dia 07, aprovou a aquisição pela Anhanguera Educacional da totalidade das ações da Sociedade Educacional de Belo Horizonte Ltda., mantenedora da Faculdade Metropolitana de Belo Horizonte, e do Praetorium, Instituto de Ensino, Pesquisa e Atividade de Extensão em Direito Ltda..
E ao que tudo indica, para o Ministério da Educação o melhor seria se os estudantes brasileiros tivessem suas aulas ministradas diretamente dos EUA, por professores americanos e em videoaulas transmitidas simultaneamente na TV. Afinal, como já afirmara o atual ministro da Educação, Aloizio Mercadante, o inglês é “a língua das ciências internacionais”.
REPÚDIO
A aquisição da FMU pela multinacional norte-americana, foi rechaçada por entidades ligadas à educação brasileira.
Para a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) a operação anunciada na última sexta-feira é “desmedida sob todos os aspectos, ela subtrai do Estado o poder de disciplinar duas áreas estratégicas para o desenvolvimento da sociedade brasileira – a qualidade da formação dos estudantes e o nível da produção científica, setores nos quais, sabidamente, o que acontece na área privada é de uma mediocridade espantosa (guardadas as devidas exceções)”, afirma a entidade.
A Contee também cobrou a omissão dos Ministérios da Educação e Trabalho além da capacidade do Cade de avaliar sobre fusões nas área do ensino. “Não só as lideranças sindicais estão distantes disso como até mesmo os Ministérios da Educação e do Trabalho são omissos sobre o problema. Será que o CADE tem condições de opinar sobre fusões na área do ensino? Duvido”, ressalta a entidade por meio de nota.
Por fim a entidade condena o monopólio das multinacionais no ensino. “É por isso tudo que a concentração do capital, como já acontece em outras áreas, fere a soberania nacional” e reitera “olhando de perto, contudo, e ouvindo com atenção o que diz o governo federal sobre questões desse tipo e que envolvem a ação dos interesses privados, a sensação é a de que o assunto sequer é conhecido em toda a sua profundidade”.
Em nota, a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Estadual dos Estudantes de São Paulo (UEE-SP) repudiaram a compra da FMU pela Laureate.
“Como um carro sem freio, a desnacionalização da educação vai se apropriando velozmente dessa rede”, destacam as entidades.
Para UNE e UEE-SP a “universidade é estratégica para o desenvolvimento do país e o fortalecimento do seu caráter público, a democratização do seu acesso e a regulamentação do setor privado são eixos fundamentais para que a educação superior brasileira possa produzir conhecimento, pesquisa e extensão favoráveis ao Brasil”.
Segundo análise das entidades estudantis “os grupos internacionais, como precisam apresentar resultados financeiros aos seus investidores, optam por uma educação de baixo custo e isso acaba por mercantilizar o ensino superior privado, o que traz malefícios diretos a qualidade da formação oferecida aos alunos”, ratifica a nota.
“O cenário reforça a urgência da luta contra a desnacionalização da educação brasileira”, pontuam as entidades.