Liberdade de Padre Amaro é negada e movimentos contestam condenação política
“Todos que lutam por justiça e igualdade social são tidos como criminosos. Padre Amaro foi condenado por ser liderança. E isso hoje parece ser crime”, criticou advogada da CNBB
Publicado: 05 Junho, 2018 - 11h47 | Última modificação: 05 Junho, 2018 - 12h01
Escrito por: Érica Aragão
O pedido de Habeas Corpus (HC) do Padre Amaro, preso injustamente há mais de 70 dias, foi negado na manhã desta segunda-feira (4), em Belém, no Pará. Segundo o coletivo de advogados de defesa do caso, o resultado proferido pelo Tribunal de Justiça do Pará (TJ-PA) não foi novidade e mostra a parcialidade da Justiça em lidar com o caso, julgando o sacerdote com base apenas nos depoimentos de latifundiários da região. A defesa entrará com recurso de revogação da prisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a prisão do Padre Amaro é vista como armação para criminalizar a luta do sacerdote. A perseguição, de acordo com a CPT, foi motivada pelo fato de o religioso ser uma das principais lideranças da equipe pastoral da Prelazia do Xingu e os fazendeiros da região tentam de toda forma destruir o trabalho realizado pela CPT, além de desmoralizar os que lutam ao lado dos menos favorecidos para ver garantidos os seus direitos.
“Não existem provas dos crimes que estão dizendo que o Padre Amaro cometeu, não vamos ficar calados. Já estamos preparando um recurso no STJ e vamos questionar a decisão do julgamento, porque entendemos que a manutenção da prisão do Padre Amaro é política e não jurídica”, disse a advogada da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e coordenadora da regional do Pará, Andréia Silvério.
O Padre Amaro foi condenado por esbulho, organização criminosa e extorsão, entre outros crimes que não cometeu, explica a advogada.
“Todos os três desembargadores do TJ votaram contra o Padre Amaro com argumentos baseados nas afirmações de fazendeiros locais. Os donos de terras da região alegaram que os supostos crimes são graves e que ele não poderia responder em liberdade.”
Segundo Andréia, a decisão leva a crer que a polícia e a Justiça do Pará agiram de forma parcial durante todo o processo. “Se houvesse justiça mesmo, Padre Amaro já estaria livre. A justa liberdade de Padre Amaro não representa risco para as testemunhas do Ministério Público e muito menos para a ordem pública de Anapu, razão pela qual ele reúne todas as condições para responder às falsas acusações em liberdade”, contesta a advogada.
A ativista da Comissão de Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Mary Cohen, reforça a contestação da advogada da CPT e diz que a negativa do HC do Padre Amaro é um referendo da Justiça para a criminalização dos movimentos sociais.
“Todos que lutam por justiça e igualdade social são tidos como criminosos”, denunciou Mary, que também é advogada.
“Os desembargadores disseram que a prisão do Padre Amaro estava dando tranquilidade no campo, mas, na verdade, é a tranquilidade para o latifundiário e o grileiro fazerem o que bem entenderem. E a tranquilidade dos trabalhadores do campo?”, questionou a advogada.
Segundo Mary, o argumento utilizado pelos desembargadores é uma falácia, pois, na realidade, os trabalhadores é que são massacrados no campo. “E os que dizem donos da terra, que na verdade são terras públicas, ficam tranquilos referendados pela Justiça.”
“Padre Amaro foi condenado e julgado por ser liderança. Ser liderança hoje parece ser crime”.
Padre Amaro e Lula livres!
Durante o julgamento do HC do Padre Amaro, no TJ-PA, uma cena emocionou quem passava pelos arredores do Tribunal. A CPT, Frente Brasil Popular, que reúne mais de 60 movimentos sociais e sindicais, entre eles a CUT, e outros movimentos populares da região, de mãos dadas e em círculo, fizeram uma Vigília por Justiça e por Padre Amaro livre!
A paraense e vice-presidenta da CUT, Carmen Foro, compara a situação do Padre Amaro com a do ex-presidente Lula. “No Brasil de hoje, sem justiça social e mais desigual do que nunca, ser um líder popular incomoda a elite e os latifundiários. Mas, como disse Lula em São Bernardo naquele 7 de abril: podem prender uma pessoa, mas nunca prenderão suas ideias. Padre Amaro livre já”, disse.
Segundo a secretária de Comunicação da CUT Pará, Vera Paoloni, que participou da vigília em frente ao TJ, a prisão de Padre Amaro é o aprisionamento do sonho de um projeto que teima e resiste por inclusão, democracia, terra e liberdade.
“É uma prisão, injusta, arbitrária e sem qualquer motivação que não seja o de criminalizar os movimentos sociais, movimentos de lutadores e lutadoras que continuarão na luta contra o estado de exceção”, disse.
No Pará, com Padre Amaro, e em Curitiba, com Lula, o judiciário e a mídia golpista, aliados de Temer e do latifúndio, mantêm encarceradas lideranças de um país e de um modelo social que não suporta grilhões e chicote, critica Vera. “Mas continuaremos na resistência."
Violência no Campo
De acordo com o relatório anual Conflitos no Campo Brasil, divulgado nesta segunda-feira (4) pela CPT, o número de vítimas nos conflitos no campo aumentou. O registro de mortos em decorrência desses conflitos cresceu 16,4% em relação ao ano anterior - 61 pessoas assassinadas em 2016 e 71 em 2017. Foi a maior progressão de crimes políticos no campo desde 2003.
Pará e Rondônia, que registraram 22 e 17 mortes respectivamente, lideram a lista dos locais mais violentos. Juntos, os estados são responsáveis por mais da metade dos assassinatos, quase 55% do total. Em terceiro lugar, está o estado da Bahia, com dez mortos.