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Líder comunitário que denunciou vazamento em Barcarena é assassinado

As ameaças de morte feitas às lideranças da Associação dos Caboclos Indígenas e Quilombolas da Amazônia, que denunciaram o crime ambiental da Hydro Alunorte, foram comunicadas ao poder público, que nada fez

Publicado: 12 Março, 2018 - 16h50 | Última modificação: 12 Março, 2018 - 19h05

Escrito por: Tatiana Melim

O vazamento das bacias de rejeitos da empresa Norsk Hydro Alunorte, em Barcarena, nordeste do Pará, deixou de ser apenas um problema ambiental. Após o assassinato do líder Paulo Sérgio Almeida Nascimento, da Associação dos Caboclos Indígenas e Quilombolas da Amazônia - Cainquiama, nesta segunda-feira (12), a situação se agravou e agora o caso é também de investigação criminal.

O líder comunitário foi morto com quatro tiros dentro de sua própria casa, por volta das 4h da manhã. A tragédia já tinha sido anunciada. Paulo Sérgio, 47 anos, e as demais lideranças do Cainquiama estavam sendo ameaçadas de morte desde o ano passado, antes mesmo das recentes denúncias de vazamento na barragem da mineradora, no dia 17 de fevereiro.

O advogado da Associação, Ismael Moraes, em entrevista à imprensa local no dia 5 de março, explicou que protocolou uma representação criminal na Promotoria de Justiça Militar do Pará sobre o caso de Bosco Oliveira Martins Júnior, um dos diretores da Cainquiama, que também estaria na lista de ameaçados.

Segundo Ismael, em dezembro de 2017, a Polícia Militar invadiu, sem mandado, a casa de Maria do Socorro da Silva, presidente da Cainquiama, à procura de Bosco. “Temos a ideia de que iriam sequestrá-lo e matá-lo”, disse o advogado à imprensa.

Tanto Paulo Sérgio como Bosco faziam parte da Associação que estava à frente das investigações e denúncias dos crimes ambientais em Barcarena e haviam cobrado da prefeitura a autorização da Hydro para a construção das bacias de rejeito.

Para o secretário de Meio Ambiente da CUT, Daniel Gaio, é mais um trabalhador morto pela sanha do capital que quer lucrar às custas da preservação ambiental e do direito dos trabalhadores e das comunidades locais, afetados pela contaminação da mineradora. "Trabalhador que denuncia esses crimes é tratado dessa forma pelos gananciosos que só pensam no lucro e desprezam o direito à vida", criticou.

Gaio ressalta que a situação de extrema violência no campo, que tem se agravado nos últimos dois anos, é reflexo da falta de garantias por parte do governo golpista de Michel Temer (MDB-SP). Em 2017, foram 65 assassinatos em conflitos no campo, com registro de quatro chacinas durante o ano, sendo que a maioria se encontrava em territórios de alto interesse do capital e das corporações. 

Poder público nega proteção às lideranças

Em documento protocolado pelo segundo promotor de Justiça Militar, Armando Brasil Teixeira, em 19 de janeiro, foi solicitada a “garantia de vida aos representantes da referida associação", diante das ameaças que estavam recebendo. O pedido foi negado pelo Secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup), Jeannot Jansen.

DivulgaçãoDivulgação

Entretanto, diante das novas ameaças via whatsapp, com mensagens oferecendo recompensa de R$ 40 mil pela captura de Bosco, o advogado do Cainquiama protocolou novo pedido de proteção no dia 1º de fevereiro. Apesar de relatos que citavam o capitão da PM, identificado como "Gama", e outro militar, identificado como José, o parecer de Jeannot foi negativo novamente.

 
O vazamento

O relatório do Instituto Evandro Chagas (IEC), vinculado ao Ministério da Saúde, confirmou no dia 22 de fevereiro o vazamento das bacias de rejeitos da empresa Hydro Alunorte, em Barcarena. O laudo mostrou que houve vazamento de resíduos líquidos junto à lama vermelha, o que contaminou o meio ambiente e colocou em risco a saúde de comunidades rurais e quilombolas da região.

A denúncia foi feita pelos próprios moradores que ficaram preocupados com a mudança de coloração das águas dos rios próximos, que apresentaram tons avermelhados. A suspeita foi de que as bacias de rejeitos teriam ultrapassado os seus limites.

Após a confirmação do IEC, o relatório da diligência realizada no município no dia 23 de fevereiro, com o objetivo de investigar as causas da lama avermelhada, recomendou que fosse decretado estado de calamidade pública em Barcarena. O documento, com 41 páginas, solicitou também a suspensão do tratamento tributário diferenciado concedido à empresa pelo Governo do Estado e o afastamento dos executivos da Hydro por conduta dolosa.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), no dia 28 de fevereiro, impôs uma multa de 20 milhões de reais à mineradora norueguesa Hydro Alunorte por considerar que a empresa "realizou atividades potencialmente contaminadoras sem licença válida”, além de operar tubulações de drenagem também não licenciadas. O órgão ainda embargou um depósito de resíduos sólidos e as tubulações utilizadas para a drenagem na área industrial de propriedade da Hydro Alunorte.