Escrito por: Vanessa Ramos e Walber Pinto
Católicos, protestantes, muçulmanos e pai de santo dizem que medida não conterá violência
O palco do Vale do Anhangabaú recebeu neste 1º de Maio Popular diferentes representantes de segmentos religiosos que defendem o fortalecimento da democracia no país. Ao canto de um coral com ex-usuários do crack, em sua maioria de jovens negros, a mística despertou o primeiro ato público do Dia dos Trabalhadores.
A Petrobrás como patrimônio brasileiro e o fim do Projeto de Lei 4.330/04, que prevê a terceirização ilimitada – que representaria a retirada de direitos ao trabalhadores e o fim da CLT - foram defendidos pelos líderes de fé. Na mesma direção, também se colocaram contrários à PEC 171, de 1993, que propõe a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.
Pelo Candomblé, religião de matriz africana, pai Leonardo de Toy Doçu disse que a sociedade não pode deixar que a juventude seja encaminhada para as cadeias. “Existem leis e normas que já punem os jovens infratores. Temos que reforçar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que representa uma conquista para o País. Ampliar a punição aos adultos criminosos que aliciam esses menores talvez seja um caminho”, avalia.
Ele também destacou a intolerância religiosa que, segundo ele, afeta a democracia. E criticou o aparato policial que vai contra os terreiros e a classe trabalhadora.
O pastor presbiteriano Paulo Roberto atua há quase dois anos com jovens que estão nas ruas da região central da cidade de São Paulo conhecida como Cracolândia. Assim como pai Leonardo, ele não acredita que a punição de adolescentes em prisões fechadas seja o caminho para resolver a violência estrutural na sociedade. “Essa medida é um absurdo. Sabemos que os menores que estão nas ruas têm histórico de famílias desestruturadas e a gente percebe que eles precisam de educação, amor e compreensão. Eles perderam o afeto”.
Neide Tameirão fala ao público que começava a chegar ao Anhangabaú
Líder da Igreja Adventista do Sétimo Dia, Marcos Cordeiro reforça o equívoco que pode ser votado pelo Congresso. “A redução é um grande erro. No Brasil, nada será resolvido se não houver investimento na formação das crianças, jovens e adolescentes”.
Frente aos temas apontados pelos líderes religiosos, Sheik Mohamed Albukai, da União Nacional Islâmica, lembrou que o 1º de Maio não é apenas um data de comemoração, mas um dia de luta. “Defendemos um país mais justo. A nossa religião ensina que só vamos ter segurança interior com a fé e segurança exterior quando houver justiça”, conclui,
Religiões politizadas
“Nosso inimigo é o capital e acredito que todas as religiões devem disseminar uma cultura da paz que esteja intimamente ligada à construção de uma outra sociedade, a um processo de mudança estrutural”, afirmou o secretário Geral da Federação da Agricultura Familiar (FAF/CUT), Élvio Aparecido Motta.
Também coordenador de Habitação da Federação Nacional da Agricultura Familiar (Fetraf), Élvio tem quase 30 anos de militância no movimento sindical e 23 anos de feitura de santo, termo usado no Candomblé para se referir a quem se iniciou aos cultos dos orixás. Ele é o zelador de santo do terreiro Ylê Asè de Yansã de Araras, interior de São Paulo. “Eu sou de uma comunidade de terreiro que está dentro de uma área de assentamento rural. A reforma agrária está dentro disso e é uma questão que deve estar na pauta das reparações, principalmente ao povos indígenas e quilombolas que historicamente tiveram o acesso negado à terra”, pontuou Élvio.
A mulçumana Neide Tameirão também aproveitou a ocasião para discursar em defesa da Petrobras. “Não estamos defendendo a direção que esteve no comando da empresa, mas os direitos dos trabalhadores e os avanços sociais no Brasil. Defender o maior patrimônio do país é uma forma de adorar a Deus. Não podemos deixar que interesses internacionais interfiram nos nossos direitos”, ressaltou.
Secretária de Formação da CUT São Paulo, Telma Aparecida acompanhou os líderes religiosos no palco. Como professora da rede estadual, criticou a violência do governo paulista e a falta de diálogo que, segundo ela, em nada contribuiu para uma cultura de paz. “Clamamos por democracia, com a valorização dos professores, com a melhoria da educação no nosso país”.