Livraria Cultura realiza demissão em massa...
Demissões imotivadas começaram a acontecer após aquisição da livraria pelo grupo de investidores do banco Itaú
Publicado: 13 Abril, 2012 - 15h17
Escrito por: Tatiana Melim ? CUT-SP
No início do mês de abril, a Livraria Cultura demitiu 43 funcionários de uma só vez, sob a alegação de que está realizando uma reestruturação em sua rede, após a aquisição da livraria pelo Banco Itaú, conforme informou matéria do Valor Econômico. Segundo informações dos trabalhadores, até agora, já foram mais de 50 funcionários mandados embora. Ao todo, antes do corte, a equipe contava com 70 empregados na loja do Conjunto Nacional, em São Paulo.
Segundo informações da assessoria da livraria ao jornal Valor Econômico,"a empresa diz que outras 400 vagas serão criadas, devido à abertura de mais quatro unidades até o fim do ano: Rio de Janeiro, Recife, São Bernardo do Campo e Manaus". A pergunta que se faz agora é: por que demitir tantos funcionários de uma vez se a empresa está crescendo e prevê a contratação de mais trabalhadores? Seria a demissão com a causa: achatar salários e aumentar os lucros?
Empreendedores, empresários e executivos adoram criar factoides e mitos, como a tese da reestruturação, para justificar demissão em massa para achatar salários e retirar direitos. Daí, a importância da readoção da Convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) pelo Congresso Nacional, que proteje o trabalhador/a da demissão imotiva e lhe proporciona condições mínimas de proteção e segurança no trabalho.(Assista aqui ao vídeo que explica sobre a Convenção 158e a demissão imotivada)
Confira a crônica/desabafo, escrita por Vânia Viana, “ex-cliente” da Livraria Cultura, sobre as demissões ocorridas.
Mas Cadê o Cesar?
Quero aqui me solidarizar e compartilhar minha visão (tomara que alguém se importe também com ela) de cliente da Livraria Cultura. Assim, meio no desabafo, meio na crônica, escrevo algumas palavras, histórias e sentimentos, de estupefação e decepção diante da demissão de mais de 50 trabalhadores e trabalhadoras da Livraria Cultura.
Compro muito na Cultura. É um dos meus programas paulistanos favoritos: almoçar com as amigas (ou só), ir à Cultura, ler, comprar, ou somente circular pela linda loja, respirar conhecimento e depois pegar um cineminha, necessariamente nesta ordem.
Faz uns seis meses, uma carona me deixou em frente a uma loja concorrente. Entrei (não sem culpa) para conhecer e fui selecionando alguns exemplares.
Conforme o antebraço pesava refletia que há anos não comprava em outra livraria e tentava me convencer que não havia problema algum nisso. Com certa dificuldade e desorientada na minha primeira visita, circulava tentando alcançar as altas estantes, prá lá de perdida na minha busca e sem atendimento.
Aos poucos, fui sendo tomada por uma irritação, enquanto refletia que ali eu poderia até comprar livros, mas o "meu" lugar, o "meu" atendimento, aquela precisão, empenho, carisma, gentileza, competência só mesmo na Cultura - da Paulista, onde frequento.
Ainda um tanto atônita no desconhecido espaço da concorrência busquei ajuda, que primeiro não veio. Depois da terceira chamada, até veio, mas melhor seria não ter vindo. A "figura" trouxe na bagagem um péssimo humor, simpatia “menos zero” e conhecimento nenhum para as minhas perguntas, que nem eram tão complexas assim: queria alguns exemplares sobre corrupção para um estudo no meu curso de sociologia. Apenas isso.
Mas não foi só o péssimo atendimento, foi o desdém de me apenas indicar uma estante cuja minha pesquisa já havia sido feita e pouco ou nada foi localizado.
Fui ignorada pelos atendentes. Olhava ao redor absolutamente perdida enquanto eles, solitários, ficavam diante das telas dos computadores, como que pesquisando algo importante. Importante como eu não era, eles estavam totalmente indiferentes às minhas angústias.
Senti-me péssima e com uma saudade enorme do atendimento da Livraria Cultura, especialmente do Cesar que sempre ocupado, me deixava à vontade escolhendo, mas era de uma presteza nas respostas e seriedade, incomparáveis. Nunca trocamos uma só palavra que não fosse sobre livros. Nada. Nem sobre frio ou calor, costume tão paulistano! Nem sobre eleições, candidatos, gestores. Nada, não somos amigos. Mas ele sempre sabia o que eu precisava! Ele lia a minha alma!E sempre me fazia comprar sem jamais induzir.
De repente, com meia dúzia de livros nas mãos, na loja concorrente senti uma falta do Cesar tão grande, que tímida e constrangidamente, depois de mais de uma hora de pesquisa, larguei os livros sobre o balcão.
O constrangimento, no entanto, deu lugar ao alívio em perceber que nenhum dos livreiros sequer notou a pilha de livros ou a minha saída.
Aliviada, mas triste, refleti que ali eu não significava nem mesmo um número.
Eu simplesmente, não significava!
E então, novamente aliviada embarquei no metrô sentido Consolação, rumo finalmente à Cultura. Ufa!!!
Naquela noite, quando de longe avistei o Cesar, senti uma alegria incrível.
Meu cumprimento a ele foi prá lá de entusiasmado, foi mesmo "Over" (como se diz) e percebi que até o surpreendeu e para minha surpresa ele respondeu:
_Oi Vânia.
Caramba!!! Ele sabia o meu nome!!! E não estava com a tela aberta procurando no meu cadastro. Ele simplesmente SABIA o meu nome. Fiquei emocionada, de verdade. E comprei, comprei, comprei, "até ficar com dó da concorrência" (plagiando Cauby Peixoto). Naquela noite, não me despedi dele, apenas fui embora, feliz e (pensava eu) eternamente fiel à Livraria Cultura.
E voltei outras tantas vezes. Dava uma passada de olho e se ele não estava sempre tinha outros e outras atentos/as, simpáticos/as e profissionais, muito profissionais.
Nem mais, nem menos, nem nos ignoram, nem invadem o prazeroso e intimista universo silencioso e reflexivo do leitor. Profissionais no conhecimento certo, no tom de voz certo, na simpatia do trabalhador e da trabalhadora que entende, respeita e zela. O próprio prazer no trabalho. Sim, ele existe!
Tudo certo. Tudo perfeito.
Então, na semana passada lá fui eu novamente. "É um vício", todos me dizem. Ao subir as escadas do terceiro piso encontrei um professor meu que sabe TUDO sobre Marx. Ao olhá-lo, me lembrei de uma aula sobre a tal "Mais Valia". Era um presságio! Cumprimentamos-nos sorridentes e me pus a circular as estantes em busca de livros sobre desenvolvimento com sustentabilidade. Escolhi quatro exemplares e fui perguntar... claro... ao Cesar qual "aquele" livro que não dá para viver sem ler nesta área ambiental. Ele certamente saberia!
Olhei, olhei, olhei de novo e nada. Deve ser folga dele, bom para ele, merece! pensei. Então, fui consultar com os demais e não menos queridos atendentes. Novamente olhei, olhei, olhei e ... nenhum, ninguém. Foi então que percebi uma série de rostos novos, e de repente, me assustei: ERAM TODOS NOVOS!!!
Assustada, circulei o olhar e encontrei um habituè cliente da loja, mas com quem nunca troquei sequer um aceno de cabeça. Dirigi-me a ele, no entanto, como se fosse uma antiga amiga e com intimidade perguntei: Cadê todo mundo, cadê o pessoal atendente daqui? São todas caras novas! Ao que ele respondeu: soube que demitiram 15 funcionários aqui da Livraria.
Assustei-me e pensei o que é isso? Cadê a galera brilhante que atende a gente? Uma gente linda, moderna, diferente, inteligente, simpática. Cadê??? Mas cadê o Cesar?
Rumei para o caixa, escrevi uma reclamação e postei na urna, absolutamente indignada. Depois também escrevi no Facebook da loja.
Reclamei, questionei, cobrei. Uma breve pesquisa e confirmei aquilo que no fundo já imaginava. Foram mesmo demitidos. Não 15, como relatou o “conhecido” cliente, e sim mais de 50. E na parte administrativa, mais vários. Funcionários e funcionárias com mais de 20 anos de casa, na rua. R U A!!! E a razão?
Investidores do banco Itaú na livraria, sabe aquele banco "FEITO PARA VOCÊ", pois é eles resolveram promover uma “REESTRUTURAÇÃO” na Livraria. Uma “READEQUAÇÃO” de SALÁRIOS!!!
NÃO uma readequação dos juros exorbitantes que são cobrados dos clientes desde que estes colocam os pés nas suas agências para abertura de uma conta. NÃO uma readequação nas taxas exploratórias do cheque especial; NÃO uma readequação nas taxas cobradas para uma simples consulta de saldo ou extrato DO MEU DINHEIRO. NÃO uma readequação nas taxas cobradas quando o cliente precisa de um empréstimo e lhe enfiam goela abaixo seus malditos produtos bancários, NÃO. Isto não pede readequação alguma, nem financeira, nem moral. Mas o salário de trabalhadores e trabalhadoras competentes e comprometidos que há anos se dedicam a construir uma carreira com dedicação, atendendo diariamente uma clientela exigente, com presteza e competência, este sim é "READEQUADO".
Pois saibam vocês malditos "INVESTIDORES" que isso NÃO é readequação é IMORALIDADE; Isso NÃO é readequação é GANÂNCIA; Isso não é readequação é ASSALTO aos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras. Que vergonha!
Saber que por uma única e exclusiva razão economicista, mesquinha em nome do lucro A QUALQUER PREÇO, trabalhadores e trabalhadoras são demitidos, num momento em que o Brasil enfrenta com dignidade e crescimento uma crise internacional que assola e sacrifica trabalhadores na maior parte do mundo. E vocês COVARDES “INVESTIDORES” só pensam em LUCRO. E quanto mais ganham, mais mesquinhos, medíocres e miseráveis tornam-se. ESPECULADORES: aprendam a reconhecer o valor, a importância da classe trabalhadora na conquista dos seus lucros. Reconheçam malditos miseráveis “INVESTIDORES”o investimento pessoal de cada trabalhador ou trabalhadora em cursos, leituras, formação acadêmica, idiomas (exigência na contratação da Livraria Cultura) aprendam a VALORIZAR as carreiras destas pessoas que vocês demitem despudoradamente em nome do lucro de banqueiros. Aprendam “INVESTIDORES” do Brasil. Aprendam a VER e a SER gente!
Como falei para a humana e competente funcionária da Livraria que me atendeu e acolheu minha reclamação, com quem desabafei (e até chorei) há pouco, não se trata de ter outra pessoa competente para me atender. Não é de mim e do meu consumismozinho obsessivo por livros que estou tratando. É do desrespeito, da violação e da violência vivida por cada trabalhador ou trabalhadora que foi demitido por ser competente e por ganhar compativelmente à sua competência. É disto que estou falando. É DE INJUSTIÇA QUE ESTOU FALANDO!
É da DESRESPEITOSA, DESUMANA E DESAVERGONHADA DEMISSÃO EM MASSA QUE EU ESTOU FALANDO. E por fim, é com muita dor que eu afirmo e reafirmo que apesar do costume de anos, do prazer e das centenas de livros que lá comprei, da história estabelecida com a Livraria Cultura que garanto: NÃO PISO MAIS LÁ ATÉ QUE TODOS OS TRABALHADORES E TRABALHADORAS DISPENSADOS INJUSTA, IMOTIVADA E IMORALMENTE SEJAM READMITIDOS.
Trabalhador e trabalhadora merece respeito. O acúmulo, o conhecimento, a dedicação de cada profissional não se vende nem se troca. São patrimônios inegociáveis.
Na Livraria Cultura, seus livreiros são amantes do livro, como nós clientes. Essa afinidade é que nos aproxima. Este era o diferencial da Cultura, se isso se perdeu, eu não tenho mais razão também para lhes ser fiel. Eu simplesmente vou tratá-los da mesma forma como vocês trataram seus funcionários: LIVRARIA CULTURA: EU DEMITO VOCÊ E SEUS MALDITOS (DES)INVESTIDORES!!!