Escrito por: Paulo Donizetti de Souza, da RBA

Para Aragão, próximas semanas são decisivas

Ex-ministro aponta para "julgamento teatrológico" e os recursos possíveis. Advogado diz que direito a candidatura é assegurado. Wadih Damous vê fascistização do sistema de Justiça

Ricardo Stuckert

São Paulo – As próximas duas semanas serão decisivas para a estratégica jurídica de defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A avaliação é do jurista Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, que classificou o Julgamento do dia 24 de janeiro, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre, como uma farsa. Em reunião da direção nacional do PT na sede da CUT em São Paulo, Aragão afirmou nesta quinta-feira (25) que os três desembargadores atuaram como advogados de defesa do juiz de primeira instância Sérgio Moro – até mesmo na decisão de ampliar a pena antes de nove anos e meio para 12 anos e um mês.

“Foi um julgamento teatrológico. Dentro do TRF a gente sabe que o ambiente é conflagrado. O relator chegou a falar em autodefesa do Judiciário, como se colocassem vitimas de uma agressão”, criticou. “Chegou a ser um escândalo. O Tribunal assumiu as dores do juiz Moro. Os magistrados funcionaram mais como advogados de Moro do que como magistrados”, afirmou, lembrando que os desembargadores se utilizaram de “um quadro geral”, como se houvesse uma prática consistente de crime. “O acórdão não diz qual é o fato. Do que foi dito no voto do relator, o presidente Lula não se defendeu. Viram a fragilidade da questão do apartamento e foram por outros caminhos que não eram matéria da acusação, do julgamento.”

Para o ex-ministro, o julgamento “com sua truculência” impõe caminhos que deverão ser seguidos no âmbito processual (leia destaque ao final deste texto).

Lula candidato

O advogado Luiz Fernando Pereira afirma que não há como impedir antecipadamente o registro da candidatura do presidente Lula. O pedido de registro é feito em 15 de agosto. É de competência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e isso só vai acontecer lá”, disse Pereira, especialista em legislação eleitoral.

Segundo ele, a condenação criminal diz que a suspensão dos direitos políticos só tem efeito depois do trânsito em julgado. “Ou seja, o presidente está em pleno gozo dos direitos políticos. A chance vai depender do que vai acontecer de hoje até o momento do registro da candidatura. Cabem recursos ao STJ, ao STF. A decisão favorável de reversão da condenação pode se dar a qualquer momento e isso restabelece a legibilidade do presidente Lula.”

O advogado explicou que o parecer solicitado pelo PT não é uma construção em favor de Lula ou do PT. “É um parecer que diz precisamente sobre o que diz a lei, a jurisprudência do TSE. Não se trata de criar uma tese em favor de uma candidatura. É assim há muitos anos, e é assim, porque a lei diz que é assim”.

Pereira contou que essa constatação foi vista com alguma surpresa por alguns até dentro do partido, mas os especialistas concordam. “Desde que se tornou conhecido no meio jurídico este parecer jamais foi contestado”, observou, acrescentando que mais de 140 candidatos a prefeito em 2016 disputaram eleições sob efeito de condenações inconclusas e muitos deles conseguiram assegurar sua posse após o trânsito de seus recursos. E se desculpou: “Pode até parecer que eu disse o óbvio, mas às vezes nesse país é preciso dizer o óbvio”.

Nos tribunais e nas ruas

Para o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil em seu estado, o julgamento foi absolutamente “coerente com o que acontece no Brasil, quando o sistema jurídico é a linha de frente da fascistização de setores da Polícia Federal, do Judiciário e do Ministério Públicos hoje hegemônicos.

“Essa turminha playboy, fascista, tenta levar os métodos da Operação Lava Jato para outros países, interferindo na política por meio da judicialização. Temos uma linha de frente do Judiciário e do Ministério Público bem assentada. E é nas ruas que nós temos de barrar isso”, afirmou.

Damous disse ter aprendido muito com o ato frealizado em São Paulo logo após o fim do julgamento. Cerca de 50 mil pessoas reunidas na Praça da República decidiram sair em passeata rumo à Avenida Paulista, fechada para a manifestação de pouco mais de 100 pessoas contrárias a Lula. O que aconteceu ontem com a desobediência da ordem do governador (Geraldo Alckmin, do PSDB) de não ir à Paulista foi muito importante. Não cabe a nós ficar de braços cruzados, respeitando decisões inconstitucionais. Ontem pra mim foi uma lição, um exemplo de como devemos enfrentar o fascismo. O fascismo se enfrenta nas ruas.”

O que pode ser feito na esfera criminal e na eleitoral

O TRF4 deve emitir nos próximos dias o acórdão oficializando a decisão do julgamento desta quarta-feira em Porto Alegre.

A defesa de Lula tem dois dias, após o acórdão, para ingressar com embargos de declaração, em que solicitam esclarecimentos sobre os motivos da sentença.

Os embargos são então apreciados pelo TRF4, e segundo Aragão serão provavelmente rejeitados muito rapidamente.

É possível ainda ingressar com recurso especial junto ao presidente do TRF4 pedindo a nulidade da sentença dos desembargadores da 8ª Turma. Uma vez rejeitado, a defesa pode interpor um pedido de agravo junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O problema, explica Aragão, é que a súmula que determina prisão tão logo se publique a conclusão da segunda instância após o trâmite dos recursos. 

Caberão ainda medidas cautelares, pedidos de habeas corpus, possibilidade de contestação da prisão após segunda instância, já que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendimento controverso sobre o tema.

A obtenção, junto ao STF, de um efeito suspensivo à execução da pena deixaria suspensa também a inelegibilidade (a Lei da Ficha Limpa veta a eleição de condenados em segunda instância).

A interposição e a tramitação desses recursos – ainda que a Lei da Ficha Limpa seja levada em conta pelo TSE – pode proporcionar também o ingresso de recurso junto ao Tribunal Eleitoral para que a candidatura possa ser registrada e seja viabilizada a participação de Lula na campanha e até mesmo sua posse, em caso de vitória.