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“Lula é vítima da guerra política”, afirma Cristiano Zanin

"São acusações sem materialidade que tem como objetivo tirar o ex-presidente da vida política", denuncia o advogado

Publicado: 11 Abril, 2018 - 10h17

Escrito por: André Vieira teleSUR

Filipe Araújo
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Em entrevista à teleSUR, o advogado de defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, Cristiano Zanin, afirmou que o ex-presidente é vítima do chamado lawfare, “um abuso e mau uso das leis para fins de perseguição política”, com o objetivo de impedir sua candidatura à presidência, em 2018.

O advogado chama atenção para o fato de situações semelhantes estarem ocorrendo em outros países da América Latina. “Alguns líderes políticos estão sendo acusados - muitas vezes sem nenhuma materialidade - e com finalidade política. E esse, ao nosso ver, é o caso do ex-presidente Lula”, concluiu.

Zanin aborda também a estratégia de defesa do ex-presidente e comenta o que esperar do julgamento no Superior Tribunal de Federal (STF) que analisará novamente, nesta quarta-feira (11), o tema da prisão após condenação em segunda instância.

Confira a íntegra da entrevista a seguir.

teleSUR: Como está o presidente Lula? E como ele vê essa mobilização em solidariedade a ele, não só no Brasil, mas também em diferentes cidades do mundo?

Cristiano Zanin: O presidente Lula se encontra bem. Ainda que indignado com uma prisão decretada com base em uma condenação ilegal, por contrariar a nossa Constituição Federal, que impede que haja a chamada "antecipação da pena" sem decisão condenatória final.

É importante lembrar que, contra o ex-presidente Lula, não há uma condenação definitiva. Ele foi condenado em segunda instância, mas ainda tem direito a um recurso nos tribunais superiores e nós temos a expectativa real de que esses recursos irão reverter essa condenação.

A condenação imposta ao ex-presidente Lula trata-se de atos indeterminados. Como uma pessoa pode ser condenada com base em atos indeterminados? Para se condenar uma pessoa é preciso identificar uma conduta imoral e mostrar que ela configura um crime. Mas, não foi isso que aconteceu. Essa situação, associada a diversas outras do processo, é o que nos leva a crer que haverá uma reversão da condenação. E, diante de tudo isso, a ordem de prisão que foi imposta é, ao nosso ver, um absurdo.

Como que Lula está reagindo a todo esse processo, a essa mobilização fora da sede da Polícia Federal, neste momento tão duro não só para ele mas para toda a democracia brasileira?

Evidentemente, esse grande apoio o sensibiliza. Ele agradece. Esse fenômeno que está acontecendo aqui no Brasil, especialmente com o ex-presidente Lula, lamentavelmente, se prolifera nos países da América Latina e em outros. É possível notar algumas semelhanças. Alguns líderes políticos estão sendo acusados - muitas vezes sem nenhuma materialidade - e com finalidade política. E esse, ao nosso ver, é o caso do ex-presidente Lula.

Temos dito que ele é vítima do chamado lawfare, ou a 'guerra política'. Um abuso e mau uso das leis para fins de perseguição política. São acusações sem materialidade que tem como objetivo claro tirar o ex-presidente Lula da vida política e impedir que ele seja candidato nas próximas eleições presidenciais.

Sobre a questão da condenação específica, não foram apresentadas provas concretas de que o triplex pertence a Lula. Então, porque ele está preso?

O Ministério Público apresentou uma acusação contra o ex-presidente Lula, que dizia que ele teria recebido um apartamento no Guarujá. Esse apartamento teria sido comprado com um valor proveniente de contratos da Petrobras. E que Lula teria recebido esse apartamento e, supostamente, se beneficiado com uma construtura.

Apresentada essa denúncia, com 23 audiências nas quais foram ouvidas 73 testemunhas de acusação e da defesa. Ao final de tudo isso, nenhuma prova de culpa. Ao contrário, o ex-presidente mostrou que não há recursos da Petrobras nessa situação e, que jamais teve a posse ou a propriedade desse apartamento.

O imóvel sempre pertenceu à construtora OAS. O ex-presidente jamais passou um dia ou uma noite lá. Ele foi uma única vez, para verificar se tinha interesse na comprar. Se tivesse, obviamente, pagaria pelo apartamento. Mas não houve. A partir daí, se construiu todo um falso enredo, apenas com o objetivo de incriminá-lo. E como já disse, para que alguém seja condenado, é necessário identificar uma conduta e mostrar que essa conduta configura um crime.

O próprio juiz, na sentença condenatória, disse que Lula praticou atos indeterminados. Então, insisto: ninguém pode ser condenado com base em atos indeterminados. Não houve a identificação de nenhum ato específico para beneficiar alguém e, tampouco, houve a demonstração de que o ex-presidente recebeu alguma vantagem indevida. Não recebeu o apartamento e nenhum outro tipo de vantagem.

Quais são as estratégias da defesa nesse momento?

Nós temos, em relação à decisão que condenou o ex-presidente Lula, um prazo para apresentar recursos aos Tribunais Superiores. Entendemos que a sentença será revertida, por ter uma grande fragilidade jurídica, por ter condenado o ex-presidente com base em dados indeterminados e sem comprovar que ele tenha recebido vantagens indevidas.

Desde 2016, nós enviamos um comunicado ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, onde discutimos as graves violações e as garantias fundamentais de direitos de Lula neste processo, que gerou suas condenações.

Apenas para citar algumas: o ex-presidente teve seus telefones interceptados e as conversas divulgadas, o que é proibido pela lei. Inclusive nós, seus advogados, tivemos o telefone principal do escritório interceptado, com a finalidade de acabar com a estratégia principal da defesa. Houve um série de violações que afrontam, não só a legislação nacional, como o pacto internacional de direitos civis e políticos adotados pela ONU.

Este comunicado busca que o comitê de direitos humanos possa julgar estas violações, às garantias fundamentais e ajudar ao Brasil a estabelecer a normalidade, o estado de direito, não só para o ex-presidente Lula, mas, também, para todo cidadão. O caso do ex-presidente é muito grave e não deve se repetir com nenhum cidadão brasileiro ou do mundo.

Por que vocês acusam de irregular este procedimento?

Nossa Constituição Federal é muito clara ao estabelecer que ninguém pode ser considerado culpado sem que exista uma decisão condenatória definitiva, sem a qual não caiba qualquer recurso. Ou seja, é necessário que haja uma decisão definitiva para se afastar a “presunção de inocência” e permitir que uma pessoa possa começar a cumprir uma pena.

Como já disse, no caso do ex-presidente Lula, não há uma decisão definitiva que o tenha condenado. Por isso, ele não deveria estar cumprindo uma pena.

O STF, em 2016, abrandou indevidamente , segundo nossa perspectiva, essa regra constitucional e passou a permitir que fosse possível a antecipação da pena a partir da decisão definitiva de segunda instância.

No caso do ex-presidente, Lula, sequer houve o esgotamento dos recursos em segunda instância. Mesmo com este entendimento mais estrito que foi adotado pelo STF, que hoje já me parece superado, não seria possível decretar a prisão, para que houvesse a antecipação da pena.

Lula não praticou nenhum crime. Por essa razão, ele não poderia estar cumprindo nenhuma pena antecipada. E por isso, dizemos que ele é um preso político. É um preso que não cometeu nenhum crime e foi levado à prisão fora das hipóteses estabelecidas na Constituição Federal e na legislação do país.

Os movimentos populares dizem que Lula hoje sofre uma perseguição judicial, midiática e política. Porque se fala em perseguição judicial? Há um tratamento diferenciado entre os políticos de esquerda e de direita? Você poderia explicar como tem atuado o sistema jurídico hoje no país?

Lula é o maior líder progressista brasileiro. Um dos maiores do mundo. O processo escapou de todos os trâmites legais. Teve uma tramitação recorde em primeira e em segunda instância.

Antes de julgar o recurso de apelação em segunda instância, o presidente do tribunal deu declarações públicas onde dizia que a sentença em primeira instância era irreparável, intocável e histórica. Quer dizer, foi um processo absolutamente fora daquilo que entendemos como “o devido processo legal”. E não vemos isso ocorrer com outras pessoas públicas. Tampouco deveria ocorrer. Não estou defendendo aqui que haja violações de processos políticos para ninguém. Muito pelo contrário. O que estou dizendo é que há violações, principalmente, em um espectro político.

Se fez uma espécie de corte a partir do mandato do ex-presidente Lula. Antes não. Uma das testemunhas disse, durante sua oitiva, que preparou uma tabela com base em supostos valores indevidos que teria recebido. Eu perguntei: “o senhor recebeu valores antes de 2003, antes do período do mandato do presidente Lula?” Ele respondeu que sim. “Por que não consta isso não consta em sua planilha?” Porque a Lava jato só investiga só investiga situações a partir de 2003. Isso me deu claridade em relação à narrativa e também uma delimitação temporal com relação à operação Lava jato.

Foi votado semana passada o Habeas Corpus do ex-presidente Lula. O que se espera para essa semana?

Existe no Brasil duas Ações Diretas de Constitucionalidade, que discutem o tema da possibilidade ou não de que ocorra a chamada antecipação da pena antes de uma decisão condenatória definitiva.

O supremo, em 2016, decidiu que essa decisão provisória poderia ocorrer a partir de uma condenação em segunda instância. Contudo, depois chegaram decisões, pelos ministros da corte, que voltavam a decisão anterior.

Afirmavam que era necessário uma decisão definitiva para que haja o início do cumprimento da pena. Frente esta instabilidade, algumas entidade propuseram Ações Diretas de Constitucionalidade. Desde dezembro de 2017, o relator, Marco Aurélio, liderou estas Ações na pauta para que o supremo pudesse ter uma decisão definitiva nessa matéria. Uma orientação que deveria valer para todos os cidadãos brasileiros.

No entanto, essas Ações não foram levadas à pauta. E o habeas corpus do ex-presidente foi julgado antes dessas ações diretas de constitucionalidade.

Isto demonstra que o assunto está longe de ser uma unanimidade no Supremo. E uma das ministras, Rosa Weber, segundo o que saiu na imprensa, tinha um entendimento diferente, mas queria aguardar o entendimento das chamadas ADCs para proferir seu voto.

Então, não sabemos dizer se ela, realmente, tem um entendimento diferente ou não. Do ponto de vista lógico, seria melhor ter julgado primeiro as ações objetivas, para todos, e não uma ação subjetiva, como foi o caso do HC de Lula. Agora o supremo tem que definir esse tema e fará no julgamento destas Ações Diretas de Constitucionalidade.