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Lula: "Para este governo pobre não é gente"

Em Feira de Santana, Lula defende políticas para o semiárido e agricultura familiar.

Publicado: 20 Agosto, 2017 - 10h42

Escrito por: Cláudia Motta, especial para a RBA

Ricardo Stuckert / Instituto Lula
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O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou neste sábado (19) que o Brasil está sem governo e que políticas públicas que vinham mudando a qualidade de vida da população do Nordeste vêm sendo abandonadas. Em ato político que marcou a passagem da Caravana Lula pelo Brasil por Feira de Santana, a 100 quilômetros de Salvador, Lula fez a defesa de políticas públicas para o Semiárido e para a agricultura familiar durante os períodos de seu governo e de Dilma Rousseff. “Saímos de quase R$ 2 bilhões de financiamento da agricultura familiar para R$ 30 bilhões, quando a Dilma deixou o governo. Valorizamos o pequeno produtor, demos crédito para ele evoluir na sua capacidade produtiva”, disse.

Ao se referir aos períodos prolongados de seca que caracterizam grande parte das áreas do Nordeste, Lula citou 1,4 milhão de cisternas construídas na região nas gestões petistas e enfatizou que nenhum governo pode se resignar diante de obstáculos climáticos. Ironizou a falta de atitude de poderes públicos – “nunca vi o governo do Canadá dizer que ia acabar com a neve; eles estabeleceram uma política de convivência com o inverno rigoroso” – e afirmou que a preocupação com a vida das pessoas precisa pautar as políticas de Estado. “Começamos a provar que ninguém precisa morrer de sede se tiver um governo responsável. A água é mais que um direito, é uma necessidade e o Estado não tem o direito de permitir que as pessoas se submetam a indústria de caminhões pipa”, destacou.

“Governar qualquer um governa, cuidar do povo é que é difícil. Olhar para uma pessoa pobre, humilde e enxergá-la como um ser humano que precisa de carinho. É para essa gente que um Estado governa, é para essa gente que temos de dar atenção, não para os grandes empresários da vida”, disse, ovacionado pela multidão que tomava a Praça Estação da Música. “Se você der R$ 20 para uma pessoa humilde, ela fica agradecida e vai levar comida para dentro de casa. O rico vai abrir uma conta bancaria e fazer investimento lá no exterior”, comparou. “Nós podemos consertar esse país. A gente tinha saído do Mapa da Fome da ONU e agora voltamos. Porque para essa gente que governa o país, pobre não é gente, pobre é estatística. Quando vê estatística com 14 milhões de desempregados, aquilo é só um número. Para nós são seres humanos. Por isso estou fazendo essa caravana.”

A iniciativa de percorrer 25 cidades dos nove estados do Nordeste tem a finalidade, ressalta o ex-presidente, de “conversar com o povo”. “Ouvir, aprender e levar tudo que a gente ouvir e o que recebe de documento para fazer um programa para construir o futuro de vocês”, afirmou a centenas de agricultores que ocupavam o espaço vindos de cidades vizinhas. “Nosso programa não será feito com base em pesquisa eleitoral, mas naquilo que o povo brasileiro quer para o Brasil. Porque o que nós percebemos, é que o país está quebrado”, disse.

Feira de Santana foi a última cidade do estado a ser visitada pela caravana que começou na sexta-feira (17) em Salvador e passou por Cruz das Almas e São Francisco do Conde. “A verdade é que nós não temos governo. Mas temos de ter clareza que para o Brasil voltar a andar, a gente precisa, nesse momento de crise, levantar a cabeça, não desanimar. O Brasil tem jeito, esse país é extraordinário e já provou que através da agricultura familiar a gente pode sustentar a alimentação de 204 milhões de pessoas. O que nós queremos é saber quem é que está plantando feijão, arroz, alface, cenoura, pimentão, pepino, quem está criando peixe. É isso que sustenta esse país. É isso que dá dignidade a vocês”, destacou Lula.

Neste domingo (20), a caravana chega Sergipe, onde permanecerá por três dias. Antes de chegar à capital, Aracaju, o ex-presidente passará por Estância, Lagarto, Itabaiana e Nossa Senhora da Glória. 


Gisélia e o companheiro: orgulho de trabalhar na roça. Auana emocionada: 'Antes, a gente, pobre, trabalhava para os outros' 
(Foto: CLÁUDIA MOTTA/TVT/RBA)
 

Muitos camponeses que acompanhavam o ato público diziam estar ali para ver e matar a saudade do seu “ex”. Para Auana, trabalhadora rural de Conceição da Feira, era também a realização de um sonho: vê-lo. “Antes, a gente, pobre, trabalhava para os outros. Hoje, pobre pode ser patrão. Antes, a gente tomava conta do gado do rico, hoje podemos comprar o nosso. Rico e pobre trabalhando lado a lado. Isso é emocionante. Por isso eu sou fã de Lula”, diz, sem conter o choro.

Com um cesto cheio de verduras da sua horta orgânica para entregar ao ex-presidente, Giselia, do distrito de Ijaíba, comunidade de São Domingos, era só orgulho de sua trajetória de vida. “Tenho orgulho de trabalhar na roça, lavradora, produzir alimentos 100% naturais, sem agrotóxicos. Sou de uma família humilde. Minha mãe sempre trabalhou na roça, me criei na roça. Minha mãe levava a gente, ficávamos na cabana, embaixo do sol, no carro de mão. Isso foi um exemplo de vida.”

A ligação com a terra e seus valores é patrimônio familiar. “Fui amadurecendo, passo a passo no solo. Hoje sou casada, tenho duas filhas e vou passando para elas a importância de um agricultor, para que elas aprendam a valorizar o rural. A importância de crescer e se orgulhar do DNA delas, de lavradora”, conta Giselia. 

Essa relação também faz parte da história de Maria Natividade, mãe de cinco, avó de outros cinco, moradora de uma fazenda no município baiano de Inhambupe. “Sou trabalhadora rural, filha de trabalhador rural, nunca saí da agricultura familiar, nunca trabalhei de empregada para ninguém, vivo da agricultura”, diz.

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A 'margarida' Maria Natividade: 'Estamos passando dificuldade, mas o sol vai voltar a brilhar. E a gente vai à luta' 
(Foto: CLÁUDIA MOTTA/TVT/RBA)
 

Integrante do movimento Marcha das Margaridas, Maria foi uma das delegadas à Conferência de Mulheres, em maio de 2016, detidas num avião em Brasília sob a “acusação” de fazer manifestação em defesa do governo Dilma na aeronave. “Eu estava com minhas amigas. Sofremos, mas como trabalhadoras rurais fomos à luta e ficamos até o final do evento. Voltamos para casa todas em paz.”Plantadora de feijão, milho, batata, abóbora, amendoim e laranja, ela expressa reconhecimento em relação a suas conquistas. “A vida do agricultor familiar melhorou muito, ganhamos conhecimento, a gente chega a todos os lugares. Tenho um filho de São Paulo, ele tá voltando e eu espero que ele se encaixe aqui com a gente, porque o lugar dele é aqui na zona rural, onde ele nasceu. Estamos passando um pouquinho de dificuldade agora, mas tudo isso é uma chuva, vai passar e o sol vai brilhar. E a gente vai à luta, vamos continuar plantando porque, se a roça não planta, a cidade não janta.” 

Agricultura familiar sustenta 90% dos municípios do Brasil

A agricultura familiar tem a gestão da propriedade compartilhada pela família, que tem na atividade produtiva agropecuária a principal fonte geradora de renda.

O agricultor familiar tem uma relação particular com a terra, ao mesmo tempo seu local de trabalho e moradia. A diversidade produtiva também é marca desse setor.

Segundo dados do Censo Agropecuário de 2006, 84,4% do total dos estabelecimentos agropecuários brasileiros pertencem a grupos familiares. São aproximadamente 4,4 milhões, sendo que a metade na região Nordeste.

A agricultura familiar, de acordo com o censo, é a base econômica de 90% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes; responde por 35% do produto interno bruto nacional; e absorve 40% da população economicamente ativa do país. São esses orgulhosos brasileiros, com DNA de lavradores, os responsáveis pela produção de 87% da mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz e 21% do trigo do Brasil. Na pecuária, estão com 60% da produção de leite, além de 59% do rebanho suíno, 50% das aves e 30% dos bovinos do país. Por isso, não duvide: se a Dona Marina Natividade não planta, a cidade não janta mesmo!

 Assista também à reportagem da TVT: