Escrito por: André Accarini
Privatização da gestão dos portos de Santos, São Sebastião e Itajaí deve ser avaliada pelo TCU em breve. O de São Sebastião deve ser analisado até o fim deste mês
A gestão de três importantes portos brasileiros está na mira das privatizações do governo de Jair Bolsonaro (PL), que quer vendê-los para a iniciativa privada no 4º trimestre deste ano sem levar em consideração os prejuízos para o Brasil e para os brasileiros, como perda de soberania nacional, queda na qualidade da infraestrutura que dá acesso aos portos, riscos para o desenvolvimento social e econômico local e aumento do contingente de desempregados.
Em reunião realizada nos dias 17 e 18 de maio para debater uma estratégia contra a privatização da Autoridade Portuária, representanres dos trabalhadores aprovaram um plano de lutas com o indicativo de Estado de Greve em todos os portos do país. Confira calendário no final do texto.
Ofensiva privatista
Assim como foi com a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), cujo leilão ocorreu em março deste ano, o Tribunal de Contas da União (TCU) deverá analisar os modelos de concessão dos portos de Santos (SP), São Sebastião (SP) e Itajaí (SC) até julho deste ano. No caso do porto do litoral norte paulista – São Sebastião – a análise deve ocorrer ainda no fim deste mês após parecer da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).
É um jogo de cartas marcadas, diz o presidente a Federação Nacional dos Portuários (FNP) e diretor da CUT, Eduardo Guterra, se referindo a análise que o TCU fez sobre o processo de privatização da Eletrobras e, apesar dos alertas de irregularidades do ministro Vital do Rêgo, foi aprovado pelos demais ministros da corte.
“Assim como foi com a Eletrobras, na quarta-feira [18], o TCU certamente avalizará a privatização sem se preocupar com as consequências que a privatização deve trazer ao longo dos anos”, ele diz.
No caso da Eletrobras, muitos sabem que a privatização significa aumentos ainda maiores nas contas de luz, já no caso dos portos, avalia Guterra, a maior parte da população brasileira talvez não saiba o que significa a privatização e nem sobre como é a operação portuária no Brasil.
Segundo Guterra, ao privatizar a gestão dos portos, o Brasil estará entregando a chave de suas portas para a iniciativa privada atuar da maneira que quiser, colocando em risco, sobretudo, a soberania do país.
“Hoje os portos já tem todas as suas operações privatizadas. Quando se fala na movimentação de cargas, de containers, se fala sobre empresas privadas que fazem essas operações. Todos os portos são assim. E não só no Brasil”, diz Guterra, ressaltando: “No mundo todo é desta forma, mas em nenhum porto de nenhum país a autoridade portuária [a gestão dos portos] foi entregue à iniciativa privada. Fica na mão do Estado por se tratar de segurança nacional”.
Além de prejudicar a infraestrutura que dá acesso aos portos, privatizar a gestão também vai resultar em perda de postos de trabalho. Somente na Codesa, foram e em todo o Brasil são mais de 4 mil trabalhadores.
“Eles estão tocando esse processo sem sequer negociar a situação desses trabalhadores e sem ouvir, nem a nós do movimento sindical e nem especialistas que nos subsidiam e que confirmar o retrocesso que se dará com a privatização da gestão dos portos”, diz Guterra.
Uma das condições para o leilão da Codesa, por exemplo, foi a garantia de estabilidade no emprego por 12 meses para os trabalhadores concursados, o que para os sindicatos é uma afronta já que os trabalhadores têm garantida por lei a estabilidade justamente por serem servidores públicos. “E depois, eles serão demitidos?”, questiona Guterra.
Nada que justifique
De acordo com Guterra, a privatização da gestão dos portos também traz riscos para o desenvolvimento social e econômico local, nas cidades onde estão os portos. Esse desenvolvimento é fomentado por meio de políticas de atração de cargas, de incentivo a pequenos e médios empresários, movimentação que gera receita tributária a esses municípios,
Uma vez fora do controle do Estado, o resultado é queda na arrecadação de impostos. Prefeitos, governadores, parlamentares, e até uma grande parte do setor empresarial também são contrários ao projeto de privatização.
“A iniciativa privada já atua em várias instâncias dos portos, desde o trabalho portuário, gerindo a mão de obra avulsa, até a Comissão Paritária e o Conselho de Autoridade Portuária. Eles estão lá. Não tem justificativa dizerem que precisa modernizar para aumentar a produtividade por que eles já cuidam disso. A maior parte já está na mão deles”, diz o dirigente reforçando que a gestão em si tem de ser, fundamentalmente, do Estado por se tratar de uma questão de segurança nacional.
Análise
Pelo aspecto econômico, a avaliação do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), é de que o modelo de exploração dos portos com uma Autoridade Portuária, geralmente municipal ou estadual, tem o papel de fiscalizar e regular a atividade.
Nesse modelo, os investimentos em infraestrutura portuária, administração do porto e propriedade da terra e dos ativos são públicos, enquanto os investimentos em superestrutura e em equipamentos, assim como a operação portuária, são privados.
Se privatizada a autoridade portuária, os operadores de terminais passarão a ser apenas clientes da empresa controladora do porto, prejudicando outras empresas, diz Guterra. Sem a regulação do Estado, as operações migram para ‘quem oferecer melhor preço’ e assim, outros portos sofrem consequências.
"A privatização da Codesa vai esvaziar a política portuária no Espírito Santo e beneficiar o Porto Açu, no Rio de Janeiro, e a bancada capixaba está conivente com essa situação", disse Guterra.
Categoria mobilizada
Confira todos os pontos do plano de lutas contra a privatização dos portos definidos pela FNP e demais entidades - Federação Nacional dos Estivadores (FNE) e a Federação Nacional dos Trabalhadores na Atividade Portuária (Fenccovib):
- Permanente solidariedade e prontidão para dar o necessário apoio, a qualquer instante, aos companheiros dos portos que já estão sendo – ou serão - ameaçados por esse nefasto processo de privatização;
- Estender o protesto contra a recusa de órgãos de gestão de mão de obra e sindicatos de operadores portuários em fazer o necessário aumento de quadro de TPAs (trabalhadores portuários avulsos);
- Contra o descumprimento da legislação portuária, especialmente pela contração, pelos operadores portuários e terminais arrendados, de empregados de fora dos quadros dos OGMOs (Órgãos Gestores de Mão de Obra);
- Pelo reconhecimento e cumprimento da previsão legal da categoria diferenciada, principalmente pelos terminais de uso privado.
- Apoio ao movimento nacional dos caminhoneiros.
O encontro teve a participação da deputada federal (PR) e presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, que reafirmou a posição da categoria sobre a gestão dos portos.
“É estratégica no papel do país. A natureza do ‘privado’ é buscar o lucro, mas o Estado serve para mediar essas relações para que promovam equilíbrio. Achamos que o Brasil tem legislação equilibrada nessa questão e temos que voltar a ela [lei dos portos] com respeito e defesa dos direitos”, disse Gleisi se referindo ao papel exercido pela gestão portuária.