Escrito por: Leonardo Severo
Mohamed Zrug, da Frente Polisário, agradece solidariedade cutista
Com prisões, assassinatos e desaparecimentos forçados, o reinado do Marrocos impõe sobre a República Saharauí o último caso de colonialismo da África. Para garantir a segregação, um muro de 2.725 quilômetros, ladeado por cinco milhões de minas e 150 mil soldados. Presente ao 12º ConCUT, Mohamed Zrug, representante da Frente Polisário no Brasil - organização que luta pela independência do povo saharauí - sublinha a importância do apoio brasileiro para a libertação de sua pátria da dominação estrangeira.
Em que pé se encontra a luta pelo reconhecimento da República Saharauí?
Em setembro do ano passado, a Câmara dos Deputados votou e aprovou uma indicação pedindo à presidente Dilma o reconhecimento da República Saharauí nos mesmos termos do que já feito à Palestina. Parlamentares de todos os partidos tomaram uma posição unitária e isso é importantíssimo. Infelizmente, o lobby marroquino é muito forte e ainda não houve resposta, mas temos a confiança de que a posição será tomada em consonância com a expressa pela União Africana, que expulsou o Marrocos em 1984 por invadir a República Saharauí. O reconhecimento também está de acordo ao manifestado pela imensa maioria dos países da América Latina. O posicionamento do Brasil será um aporte substancial para desobstruir o processo de paz, pois sem uma pressão internacional o reinado do Marrocos continuará se impondo.
João Felicio, presidente da CSI, com Mohamed Zrug
A história do Brasil é marcada por manter uma relação equilibrada com todos, portanto não há justificativa de que mantenha contato com apenas uma das partes. O reconhecimento da República Saharauí fortalecerá o intercâmbio cultural e a cooperação internacional nos mais diversos terrenos. Acredito que, neste momento histórico, a decisão da presidente Dilma pelo reconhecimento será muito bem recebida pela sociedade brasileira e internacional. Para isso, o apoio da CUT é fundamental.
Qual a dimensão da ocupação marroquina?
O Marrocos ocupa quase 70% do território saharauí, com um muro de 2.725 quilômetros, cinco milhões de minas, radares, artilharia pesada e 150 mil soldados. Com isso assaltam nossas jazidas e as vendem ilegalmente às empresas estrangeiras, enquanto mantém famílias separadas por mais de 40 anos. O muro da ocupação serve para espoliar basicamente o pescado e o fosfato e, mais recentemente, para favorecer as transnacionais do petróleo e do gás. O mais lamentável é que isso se produz agora mediante os olhos da ONU. A delegação das Nações Unidas chegou em 1991 para fazer o Referendo de Autonomia e acabou se transformando em guarda-chuva, em testemunha cega, surda e muda da ocupação ilegal, da espoliação do nosso povo. São anos de tortura, desaparecimento e prisões.
Há companheiros inclusive condenados à prisão perpétua.
Somente no último ano são mais de 50 presos políticos nas cárceres do Marrocos, 25 à prisão perpétua e a 25 e 30 anos de prisão por defenderem o direito à soberania e à liberdade. Esta realidade não pode continuar, daí a importância da presença dos observadores internacionais, das delegações sindicais
Uma delegação da Confederação Sindical Internacional (CSI) foi proibida recentemente pelo governo do Marrocos de fazer uma visita de solidariedade. Como aconteceu?
A delegação da CSI visitaria a República Saharauí e os territórios ocupados do Sahara Ocidental para nos ajudar a romper o cerco e exigir o nosso direito à autodeterminação, mas foi impedida pelo Marrocos. Este é o momento de perguntar se foi isso o que queria a ONU quando se transformou em guarda-chuva do colonialismo. Estamos mobilizando representantes de todos os países, e o Brasil também tem responsabilidade para mudar a situação atual, porque possui 11 oficiais na delegação das Nações Unidas. A visita servirá para uma maior aproximação, para que todos vejam com seus próximos olhos a realidade da ocupação, que já dura 40 anos, que deixa dezenas de milhares de pessoas refugiadas sem acesso à água e luz. É importante que vejam a resistência digna, que ouçam a organização sindical, as mulheres e jovens que lutam por sua emancipação, que dialoguem com o Alto Comissariado dos Refugiados. A partir desta presença, tenho a convicção, se pode levantar uma ampla campanha de denúncia contra este que é o último caso de colonialismo na África.