Metalúrgicos fazem passeata contra fechamento da Ford, em São Bernardo
Enquanto nos EUA, sindicalistas negociavam com a Ford Mundial, trabalhadores da multinacional caminhavam em São Bernardo para explicar a situação à população - fechamento impactará muito a economia da cidade
Publicado: 07 Março, 2019 - 15h52 | Última modificação: 07 Março, 2019 - 18h30
Escrito por: Érica Aragão
Metalúrgicos e metalúrgicas da Ford organizaram uma passeata na manhã desta quinta-feira (7) em protesto contra o fechamento da planta de São Bernardo do Campo, anunciado pela montadora no dia 19 de fevereiro. Os manifestantes saíram, por volta das 10h20, da frente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SMABC) e caminharam até a Praça da Matriz, onde foi realizado um ato inter-religioso.
No mesmo horário, o presidente do SMABC, Wagner Santana, o presidente do Instituto Trabalho, Indústria e Desenvolvimento (TID-Brasil), Rafael Marques, e o coordenador do Comitê Sindical na Ford, José Quixabeira de Anchieta, se reuniam com a direção mundial da Ford, em Dearborn, nos Estados Unidos, para tentar reverter decisão e manter empregos na região. Na próxima terça-feira (12), eles vão informar o resultado da negociação, em uma assembleia no pátio da Ford.
A passeata
Os trabalhadores e trabalhadoras caminharam até a Igreja da Matriz empunhando faixas e cartazes com dizeres como “não vou desistir do meu emprego”, “a Ford só pensa no lucro” e “minha família depende do meu emprego”. Eles também estão fazendo uma campanha para que as pessoas deixem de comprar veículos da Ford enquanto a situação da planta de São Bernardo não for resolvida.
Durante os 4 quilômetros de caminhada, dirigentes do SMABC, deputados federais e estaduais e o ex-prefeito da cidade, Luiz Marinho, discursaram no caminhão de som para explicar a população o motivo da luta dos trabalhadores e das trabalhadoras da Ford e convidar a todos para participar da luta.
“Nós conseguimos reverter uma decisão da Ford parecida com esta em 1998 e tenho fé que conseguiremos revogar mais essa. 20 anos se passaram e a luta não foi só da direção do sindicato, nem da comissão de fábrica, nem minha, foi uma luta de toda sociedade por empregos e por dignidade”, disse Marinho.
A secretária da Mulher Trabalhadora da Federação Estadual dos Metalúrgicos de São Paulo (FEM-CUT), Andréa Souza, também ressaltou que a luta deve ser de todos e todas porque os impactos da decisão da Ford são alarmantes e afetarão muita gente.
“As vendas dos comércios vão cair, a compra na padaria vai diminuir e a economia da região será fortemente impactada. Além disso, vocês [se referindo aos lojistas da Rua Marechal Deodoro, uma das principais ruas comerciais da cidade] também podem perder seus negócios se não tiverem comprador dos produtos que vocês vendem. Todo mundo sofrerá com a saída da Ford de São Bernardo do Campo. O #FicaFord é uma luta de todos e todas”.
Bancários, professores, servidores, rodoviários, trabalhadores e trabalhadoras da saúde, movimentos sociais e diversas outras categorias e de outras fábricas e parlamentares da região estiveram presente na caminha e no ato inter-religiosos em solidariedade aos trabalhadores da Ford e ao Sindicato dos metalúrgicos do ABC.
“Outras categorias vão se espelhar na luta de vocês a qualquer sinal de ataque contra emprego, direito ou mesmo qualquer ato de irresponsabilidade como este da Ford. A empresa precisa investir sim, dar melhores condições de trabalho e garantir esses empregos de pais e mães que dedicaram seu trabalho para aumentar a riqueza desta multinacional”, afirmou o coordenador da CUT no ABC, José Almeida Freire.
As falas dos sindicalistas e parlamentares eram saudades com gritos de #FicaFord e de “trabalhador unido jamais será vencido”.
“Vamos lutar pelo nosso emprego e exigir do presidente faça seu papel e governe esse país, trabalhe e discuta com todas montadoras, principalmente com a Ford para se manter em SBC e com empregos para que os trabalhadores e as trabalhadoras continuem sonhando com dias melhores”, “A disse a coordenadora do macrossetor da Indústria da CUT, Cida Trajano.
Ato inter-religioso
No final da manhã, os trabalhadores e trabalhadoras da Ford e de outras categorias profissionais que se uniram a luta pelos empregos chegaram a Igreja Matriz, o maior símbolo de resistência e luta por transformações sociais nas décadas de 1970 e 1980.
E, no ato inter-religioso, organizado pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SMABC), espíritas, umbandistas, católicos, evangélicos, mulçumanos e candomblecistas, unidos, fizeram suas orações pela revogação da decisão unilateral da multinacional.
Os religiosos deram um duro recado à direção da Ford. A empresa precisa se sensibilizar e cumprir sua responsabilidade social tanto para com seus trabalhadores e suas trabalhadoras, quanto para com a cidade e com o país, onde a multinacional lucrou muito e explorou a mão de obra dos brasileiros e das brasileiras.
“Não se pode tomar uma decisão que prejudique toda sociedade, com aumento do desemprego e fome, e sair ileso. Quando a Ford precisou de vantagens de impostos para lucrar mais ela teve e agora tem que honrar com sua responsabilidade social. Fica Ford é uma demanda da justiça, da verdade e da ética”, afirmou o Pastor Ariovaldo, da Frente dos Evangélicos pelo Estado de Direito.
Para o Padre Joel, que representou os católicos, nenhuma injustiça e maldade é maior que o amor e a solidariedade. “Amai-vos uns aos outros como Jesus nos ensinou. Temos que sair daqui e convidar mais gente para luta, porque o amor não é egoísta e só juntos conseguiremos mudar o rumo deste país”, afirmou o padre que citou outras lutas que aconteceram na igreja matriz. “A história do país foi mudada com unidade e solidariedade e assim devemos seguir”, finalizou.
Para Mãe Adriana, que representa o Candomblé, todas as religiões precisam estar unidas para que o resultado desta negociação nos Estados Unidos seja positivo para todos e todas. “Que Ogum, um trabalhador ferramenteiro, abra nossos caminhos e que a Ford não feche e não deixe tantas famílias desempregadas. Que Ogum abra a mente dos negociadores e traga fortuna, felicidade e solidarize com a dor dos seus filhos. E que nenhum metalúrgico seja dispensado”, concluiu.
Impacto negativo no ABC
“Mais de quatro mil empregos diretos e mais de 30 mil empregos na cadeia produtiva que serão impactados”, se a Ford fechar a fábrica de São Bernardo do Campo, afirmou o secretário-geral do SMABC, Aroaldo Oliveira.
“A região do ABC já tem mais de 100 mil desempregados e mais 30 mil seria uma tragédia. A cidade deixará de arrecadar 300 milhões de reais, um impacto direto no desemprego, na queda de arrecadação e nas políticas públicas da cidade”.
Fake news
O secretário-geral da CUT São Paulo, João Cayres, que também é trabalhador na Ford, alertou sobre os fakes news (notícias falsas) que estão rolando de pessoas mal intencionadas.
“As mentiras que estão dizendo por ai de que o Sindicato é responsável por esta decisão da Ford são cruéis e irresponsáveis. Os trabalhadores e as trabalhadoras da multinacional são testemunhas que o SMABC está num esforço total para revogar esta decisão da Ford e manter os empregos de milhares de pais e mães de famílias. Nós estamos firmes e fortes na luta, que é de todas e todos”, afirmou.
O presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos, Paulo Cayres, reafirmou a indignação do João e disse que qualquer informação sobre o resultado da reunião nos Estados Unidos é só com o Sindicato.
“Não vamos acreditar em boatos, qualquer informação virá do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e será preciso dialogar e convidar as famílias para, no dia 12, saber o resultado da reunião e decidir os próximos passos da luta. Porque independente do resultado a luta continua”, disse Paulão, finalizando o ato na Praça da Matriz.
Trabalhadores e trabalhadoras da Ford estão preocupados, mas têm esperanças
O olhar de esperança de cada trabalhador e cada trabalhadora da Ford expressado na luta não esconde a preocupação deles e delas, caso a decisão da Ford seja mantida.
Geovane José Marques, que trabalha há 24 anos na Ford, é um dos 4 mil trabalhadores que serão impactados diretamente com a decisão da empresa em fechar a planta em São Bernardo do Campo.
Segundo ele, só a luta pode mudar o destino dele e de outros milhares de trabalhadores, mas Geovane disse que não quer nem pensar na possibilidade da decisão da empresa não ser revogada, já que além de ser a única renda da família, ficou doente durante estes anos de trabalho na Ford.
“Dediquei minha vida a esta empresa e ganhei duas hérnias de discos e problema nos dois ombros como é que vou arrumar outro trabalho? Eu queria que a Ford desse essa resposta”, afirmou.
Eliane Aparecida da Conceição, operadora de produção da Ford há 5 anos, é arrimo de família e disse que o que a mantém de pé é a luta. “Foi um baque muito grande a notícia do fechamento da Ford, porque minha família depende da minha renda. Se essa situação não se reverter vai impactar a vida da minha mãe e dos meus irmãos. Eu to com muita esperança que a Ford vá reverter essa decisão que ela tomou, muita mesmo”, disse Eliane emocionada.