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Mortes em Petrópolis poderiam ter sido evitadas. ‘Faltou ação política’

Alertas foram emitidos antes da tragédia. Desde 2017, prefeitura tinha conhecimento das áreas de risco. Governo do Rio investiu metade do previsto em prevenção

Publicado: 17 Fevereiro, 2022 - 14h19

Escrito por: Redação RBA

Tânia Rêgo/EBC
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A tragédia em Petrópolis, no Rio de Janeiro, era evitável, assim como as 105 mortes confirmadas até as 11h desta quinta-feira (17). O professor Paulo Artaxo, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Física Atmosférica, aponta a falta de ação política e de coordenação como responsáveis pela situação de calamidade do município. Dos 101 corpos que estão no Instituto Médico Legal (IML), 65 são de mulheres, 36 homens e 13 crianças. Há ainda 134 registros de desaparecimentos até o momento.

Na terça-feira (15), Petrópolis registrou o maior volume de chuvas em 24 horas desde 1952, de acordo com dados do Instituto Nacional de Meteorologia do Rio. Foram 259.9 milímetros de chuva. Em apenas três horas, choveu um volume maior do que esperado para todo o mês de fevereiro. Mas, apesar da questão natural, houve um aviso sobre a magnitude do temporal no dia anterior pelo Centro Nacional de Monitoramento de Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), segundo a Folha de S.Paulo. Assim Artaxo avalia que, ao receber o alerta, as autoridades estadual e municipal deveriam ter evacuado as áreas de alto risco.

Desde maio de 2017, a prefeitura de Petrópolis tem em mãos um estudo que mostra 15.240 moradias com alto risco ou risco muito alto de destruição por consequência das chuvas no 1º distrito da cidade mais castigado pelo temporal. E entre as 102 regiões mapeadas no local, a que aparece com mais casas em perigo é justamente a que foi identificada como Oswero Vilaça, onde está o Morro da Oficina, local crítico da tragédia. Confira entrevista de Paulo Artaxo a Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual.

Mortes eram evitáveis

O professor da USP critica que “não adianta saber que aquele morro vai escorregar, mas ninguém agir”. De acordo com ele, o Brasil precisa ter uma Defesa Civil quatro a cinco vezes maior do que o corpo atual. “Mais rápida e mais bem equipada. Em particular nas zonas de alto risco, como foi o caso de Petrópolis e em São Paulo algumas semanas atrás”.

“Ou seja, essas tragédias são totalmente evitáveis, porque é possível diminuir a perda de vidas. Mas o Brasil precisa realmente ter ações de coordenação. Essas tragédias só atingem a população pobre, mais vulnerável. Você não vê uma mansão de qualquer pessoa rica sendo levada pela enxurrada nos morros. E como só atinge a população de baixa renda, nossos governantes não têm o menor interesse em realmente atuar nessa direção. Isso o Brasil tem que corrigir. Portanto, essas mais de 100 mortes que tivemos agora poderiam ter sido evitadas se tivéssemos políticos agindo quando necessário”, ressaltou Artaxo.

Além disso, o especialista explica que o trabalho de coordenação deve ser entre os municípios, o estado e o governo federal. E esse é o elo mais fraco, de acordo com ele. Pois junto com a falta de programa nacional para atuação nesses casos, dados do portal da transparência também indicam que os investimentos ficam abaixo inclusive do previsto. O governador do Rio, Cláudio Castro (PL), por exemplo, gastou metade do orçamento destinado ao Programa de Prevenção e Resposta a Desastres. Somente 47% do valor previsto em orçamento a ser investido no ano passado no setor foi empenhado. Dos R$ 407,8 milhões de dotação inicial, foram usados R$ 192,8 milhões.

Omissão das três esferas

Em viagem oficial da Rússia, o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL) disse que irá sobrevoar a área nesta sexta (18). O que Artaxo também contesta. “Ele não precisa gastar dinheiro público com isso, basta ligar a televisão como todos nós, brasileiros, estamos fazendo”. O especialista destaca que seria melhor para o país a realização de obras nesses locais de risco iminente e ainda aplicação de programas de reflorestamento com espécies que podem dificultar o escorregamento de terras em morros. Isso porque é uma técnica na qual o Brasil tem especialidade.

“Desse modo, não há dificuldade em minimizar os riscos dessa população que vive em encosta”, afirma. “Além disso, não custa caro. O gasto ordem é de grandeza menor do que os prejuízos que a população tem não só de vida, mas também econômicos. Milhares de pessoas perderam tudo, suas casas, tudo o que construíram ao longo de uma vida, isso não é pouca coisa”. Artaxo lamenta ainda a omissão, segundo ele, do poder judiciário em punir os responsáveis por essas mortes.

Mudanças climáticas

Em 2011, uma catástrofe atingiu Petrópolis, junto com Teresópolis e Nova Friburgo. Naquele ano, temporais em toda a região serrana deixaram 918 mortos e quase 100 desaparecidos. O caso foi classificado pela ONU como um dos 10 piores deslizamentos do mundo em 111 anos. Na época Petrópolis, especificamente, teve 71 mortos.

Também membro da coordenação do programa de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Artaxo garante que os eventos climáticos extremos serão cada vez mais maiores por conta da emergência climática. Portanto, o Brasil precisa se preparar muito mais, ele alerta.

“Nos últimos seis meses, tivemos enchentes na Bahia, em Minas Gerais e agora em Petrópolis, mais as secas que estamos observando no Rio Grande do Sul e no Brasil central, desde a metade do ano passado. Assim, fica muito claro que as mudanças climáticas estão aumentando a frequência e a intensidades de eventos extremos. Então, o Brasil como um país precisa se preparar, assim como cada município e estado precisa agir para proteger a população mais vulnerável”, conclui.

Redação: Clara Assunção