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Museu da Lava Jato reúne memória de abusos, ‘lawfare’ e resistência democrática

Museu virtual registra, com fartura de documentos, “a operação que passou de uma iniciativa de grande apelo popular para um escândalo internacional”

Publicado: 08 Agosto, 2022 - 09h11 | Última modificação: 08 Agosto, 2022 - 18h51

Escrito por: Redação RBA

Francisco Proner
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Lançado no início do mês, o Museu da Lava Jato (MLJ) é uma iniciativa que reúne historiadores, juristas e jornalistas para registrar a sucessão de fatos da “operação que passou de uma iniciativa de grande apelo popular para um escândalo internacional a partir do conluio entre procuradores e o magistrado”. O magistrado em questão é o ex-juiz federal de primeira instância Sergio Moro, cujos objetivos e métodos são cuidadosamente expostos e analisados durante a visita às galerias virtuais do MLJ.

Todos os processos no âmbito da Lava Jato que levaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à prisão na sede da Polícia Federal em Curitiba – o que o tirou da eleição presidencial de 2018 e levou à eleição de Jair Bolsonaro prisão foram desmontados. Também ficou atestada na Justiça a parcialidade de Moro, em articulação com a força-tarefa formada por procurados do MPF na capital paranaense e, sobretudo, com grande parcela da mídia do país.

O acervo digital reúne documentos organizados entre temas: jornalístico, jurídico e acadêmico, além de registros da Vigília Lula Livre, tomados durante os 580 dias de prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Ao cabo de uma semana, calculava-se que 7 mil pessoas haviam passado pelo acampamento. A ao final calcula-se que mais de 200 mil pessoas passaram pela Vigília em eventos, atos, caravanas e aqueles que permaneceram durante todo o período na luta”, destaca o estudo.

Memória e vigília

Entre os nomes que passaram pela Vigília, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, o ex-presidente do Uruguai José Pepe Mujica, o ator e ativista norte-americano Danny Glover, os músicos Martinho da Vila e Chico Buarque, o vencedor do Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel, a religiosa Monja Coen, um dos maiores pensadores da comunicação do mundo, o linguista Noam Chomsky, o ex-presidente da Colômbia Ernesto Samper, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, o ex-presidente do Parlamento Europeu Martin Schulz, entre outros.

A historiadora Maitê Ritz, coordenadora do MLJ, explica como o registro da vigília foi estruturado na prática para a visitação dentro do Museu da Lava Jato. “Temos uma linha do tempo dos 580 dias. com mais de 8 mil fotos (…) Gravamos depoimentos exclusivos com lideranças que estiveram lá. A ideia é mostrar como este movimento social, tão importante para a história do Brasil, foi feito pelo povo”, disse.

Ainda sobre o papel de preservar a memória do que foi a luta legalista contra os desmandos da Lava Jato, Maitê reforça o papel da Vigília e do MLJ. “Precisava de um lugar para colocar isso tudo na memória. Não só pela importância social, mas pelas pessoas (da Vigília Lula Livre). Muita gente fala que eram vagabundos, que não faziam nada. A vigília tinha todo um trabalho, toda a movimentação de cursos, atividades. Tem muito material sendo produzido sobre isso. Vendo os depoimentos, é impossível não se emocionar. Teve ataques, tiros, gente queimando bandeiras”, relata.

Lava Jato e Lawfare

O MLJ ainda conta com o Grupo Interdisciplinar de Pesquisas da Lawfare. “Vamos promover palestras, encontros, publicações. Vamos promover bolsas de mestrado, doutorado, incentivar pesquisas, revistas. Vai ser a parte mais acadêmica do museu”, explica. Lawfare, em síntese, é a utilização da máquina do Judiciário para perseguir determinado objetivo criminal. No caso da Lava Jato, as consequências da distorção do Direito promovida por Sergio Moro, Deltan Dallagnol e os demais atores da operação, foi motivada por objetivos políticos.

“Temos um centro de documentação. No núcleo jurídico reunimos 45 processos relativos à Lava Jato e ao presidente Lula. Temos mais de 100 mil notícias dos mais diversos portais. Nestes dois acervos, temos filtros, em que os pesquisadores podem acessar por ano, portal, por autor, tipo da matéria. A mesma coisa com os processos”, explicou a pesquisadora.

Futuro presencial

Justamente por este caráter popular de mobilização, a pesquisadora lembra que o MLJ tem uma natureza colaborativa. “No site tem uma página de ‘Eu na Vigília’. As pessoas vão poder mandar os depoimentos, vídeos, fotos, tudo que quiserem. Vamos colocar tudo isso no site para mostrar o olhar da história no tempo presente. É uma pontinha de história que merece a lembrança, então vamos aceitando colaborações”, disse.

Maitê, que na quinta-feira (4) foi entrevistada pela jornalista Talita Galli no Bom pra Todos, da TVT, contou que, por enquanto, o museu poderá ser visitado em ambiente virtual. Contudo, existe a expectativa de um espaço físico, que pode ser inaugurado até 2024. A historiadora disse já iniciou a busca por patrocínios. “Buscamos mais estabilidade para termos uma sede física digna. Também temos o fato de estarmos em ano eleitoral. mas (o MLJ) não é um instrumento de campanha ou coisa assim. Mas a ideia é termos uma sede, especialmente na ‘República de Curitiba’. Seria um fato incrível, temos esse plano”, completou.