Como o Uruguai veta a redução da maioridade penal
Uruguai pode ser exemplo de combate à redução da maioridade penal
Publicado: 16 Julho, 2015 - 15h01 | Última modificação: 16 Julho, 2015 - 16h39
Escrito por: Érica Aragão
Com ajuda da grande mídia Uruguaia alertando sobre o grande índice de violência no País, cerca de 75% da população local era a favor da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes graves, proposta do Senador, Pedro Bordaberry, em 2011.
Aqui no Brasil a mesma ideia está inserida na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171/93, reapresentada para votação pelo atual presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. O argumento do presidente da câmara é o mesmo de Pedro no Uruguai, diminuir a violência.
Discutir a redução como salvação para a diminuição dos crimes no mês que comemoramos os 25 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) tem tudo a ver com o debate que acontece por todo o Brasil nestas mobilizações contra a redução.
Segundo o Secretário Nacional de Juventude da Central Única do Trabalhador (CUT), Alfredo Santos, esse é o momento de reafirmar a necessidade de cumprir os direitos e deveres que o ECA já prevê para as crianças e adolescentes, visto que ele sequer foi implementado de verdade. “Já existem sanções aos jovens infratores. O problema não é a legislação, mas a execução dela”, afirma o dirigente.
Para o coordenador da Frente Nacional Contra a Redução da Maioridade Penal, Leonardo Duarte, no Brasil a grande maioria da população é a favor porque a mídia, em seus programas policiais de televisão desinforma com notícias mentirosas.
“Os programas policiais que passam na TV todas as tardes deveriam ser responsabilizados. Eles não podem ir a nível nacional e dizer que adolescente pode roubar e matar e não vai acontecer nada com ele, isso é mentira”, afirma Leonardo. “No ECA, legislação para crianças e adolescentes reconhecida mundialmente, o adolescente é responsabilizado a partir dos 12 anos, é só ler o estatuto”, propõe o coordenador da frente.
Segundo a Secretária de Comunicação da CUT, Rosane Bertotti, a mídia sequer abriu o debate com a população."A imprensa tomou um partido e por isso faz reportagens induzindo a população brasileira a ter a opinião dela. Nem se quer abriu um debate em âmbito nacional para discutir o tema", afirma Bertotti.
Leonardo também cita o caso do Uruguai como grande fonte de inspiração para as mobilizações no Brasil. “Quando começou estas discussões lá, as pesquisas indicavam que a maioria da população era a favor da redução da maioridade penal. Teve mobilizações por todo o País, como as que estamos articulando, mostrando os males da redução da maioridade representa pra sociedade e pra nossa juventude”, relembra ele.
Entenda como foi o processo de comunicação popular no Uruguai
O Senador, Pedro Bordaberry, tomou a redução da maioridade de 18 para 16 anos como campanha para diminuir a violência de olho nas eleições em 2014 e propôs um plebiscito, consulta popular para saber a opinião da população como forma de intervir sobre o tema.
Com o objetivo de levar informações relevantes para a população em torno do tema, em 2011 e 2012 o trabalho da população contrária à redução foi de construção de coletivos para construir argumentos com intelectuais e com o público que já dizia não para esta medida. Depois os coletivos foram tomando “corpo” com a participação de sindicados e centrais sindicais assumindo a causa junto com os movimentos já inseridos na campanha, tornando-se a Comissão No a La Baja, em português “Comissão Não à redução”.
Com as assinaturas necessárias para o plebiscito, partidos políticos, igrejas e outros movimentos sociais incorporaram a mobilização de uma Comissão plural e única para enfrentar o retrocesso.
A população contrária à redução achou importante levar a luta para todos os lugares, com dados que mostrassem que a mídia não dizia a verdade. Garotos de 13 a 17 anos já são penalizados e submetidos à privação de liberdade em centros de reclusão que não deixam a desejar aos presídios.
A participante da Comissão no Uruguai, em entrevista para o Blog Outras Palavras, Verónica Silveira, defendia o debate com a população sobre o tema. “Não porque houvesse chance de ganhar, mas porque precisávamos nos posicionar, dar respostas, e, se a população fosse votar, que ao menos soubesse o que estava fazendo”, afirma ela.
Nos dois anos de campanha até o plebiscito, em 2014, a campanha foi feita com vários especialistas na área de direitos, neurociência, sociólogos, da área jurídica e do sistema penal adolescente.
Também optaram por narrativas que incluísse todos e todas, como estratégia de comunicação. Palestras de todo tipo, shows nas ruas, marchas cheias de alegrias e cores, teatro dos oprimidos, debates na vizinhança com objetivo de tirar a sensação de medo e fazer um contraponto a grande mídia.
Além dos debates, a comissão também elaborou propostas que depois eram lidas e o público interagia opinando sobre elas ou até sugerindo outras. Em cada articulação destas nas cidades do Uruguai, o coletivo criava novos núcleos da frente No a La Baja, fortalecendo o movimento no país.
Em outubro, no mesmo momento das eleições que escolheriam o sucessor do presidente, José Mujica, a pergunta foi feita para a população uruguaia através de um plebiscito e mais de 52% disseram não à redução.
Para os movimentos sociais aqui no Brasil, a única maneira de mudarmos os rumos das pesquisas, que também indicam a maioria da população a favor da redução, será com muitas mobilizações populares. “É isso que estamos vendo em todo país, o Uruguai pode ser nossa inspiração e a nossa esperança”, conclui Leonardo.