Escrito por: Redação CUT

Nove jovens morreram pisoteados em ação policial em Paraisópolis

Polícia Militar de São Paulo invadiu baile funk às 3 da madrugada em ação chamada de “controle de distúrbios civis”, jogou bombas, deu cacetadas nos jovens e provocou enorme tumulto, mortes e ferimentos

Reprodução

Em uma ação violenta e cruel, a Polícia Militar de São Paulo, invadiu, na madrugada de domingo (1º), um baile funk, conhecido como 'Baile da 17', que estava sendo realizado na favela Parisópolis, na Zona Sul de São Paulo, e o resultado trágico: nove jovens mortos, entre eles um de apenas 14 anos, e dezenas de feridos.

A “ação de controle de distúrbios civis”, segundo definição da PM, tinha o suposto objetivo de perseguir dois homens em uma moto que teriam atirado contra policiais do 16º Batalhão da Polícia Militar Metropolitano (BPM/M). 

De acordo com o tenente-coronel Emerson Massera, porta-voz da PM, os policiais entraram na comunidade durante uma perseguição a dois suspeitos de roubo de motocicletas. O roubo teria ocorrido fora da favela, mas os suspeitos teriam entrado no local apra se esconder.  

"Esses criminosos entraram no baile e usaram as pessoas como escudo", disse o porta-voz. Segundo ele, os suspeitos atiraram na direção dos policiais e os frequentadores da festa teriam jogado pedras nos agentes que teriam revidado com bombas de efeito moral e balas de borracha. Isso em um local onde tinha mais de cinco mil jovens.

Reportagem do site Ponte, que ouviu vários moradores, contradiz a versão oficial. De acordo com os relatos, as mortes ocorreram após um mês em que policiais militares fizeram ameaças diárias aos habitantes da favela, por conta da morte do sargento da PM Ronald Ruas Silva, ocorrida em 1º de novembro de 2019. Ele foi baleado na barriga durante uma troca de tiros na avenida Professor Alcebíades Delamare, nas imediações de Paraisópolis, e a PM anunciou, no dia seguinte via redes sociais a realização de "uma Operação Saturação" no bairro. Essas operações, que não têm prazo apra terminar costumam reunir policiais de diferentes unidades. 

Tumulto e violência

As agências de notícias e os vídeos postados nas redes sociais mostram muito tumulto e a violência gratuita da polícia contra jovens que estavam apenas se divertindo. Ao Fantástico, da TV Globo, uma jovem que não quis se identificar com medo de represálias disse que viu um policial jogar uma garrafa na cabeça de uma garota que levou vários pontos além de cassetadas nas costas de vários outros.

Já os vídeos divulgados nas redes sociais mostram os jovens emboscados nas vielas da favela apanhando durante da polícia que, inclusive, deu tapas na cara de uma pessoa que estava caída no chão. Outro vídeo mostrava um garoto morto que depois foi desesperadamente procurado pela família que nem sabia que ele estava no baile, mas o reconheceu nas imagens e muitos apanhando dos PMs.

Nos vídeos era possível ver a fumaça das bombas de efeito moral jogadas pela polícia, a correria e os jovens caindo no chão, desmaiando e policiais agredindo e pisando pelo menos dois garotos já dominados

“Essa é a política de segurança dos tucanos?”, questionou o ex-ministro Luiz Marinho nas redes sociais. “Orientei nossa bancada do PT na Assembleia Legislativa que acompanhe a investigação muito de perto”.

O governador João Doria disse que lamentava o fato, também via redes sociais e que determinou que o secretário de Segurança Pública, General Campos, apure os fatos de forma rigorosa “para esclarecer quais foram as circunstâncias e responsabilidades deste triste episódio”. 

Mas, duas horas depois, durante solenidade de filiação do ex-ministro Gustavo Bebianno ao PSDB do Rio de Janeiro, Doria afirmou, segundo o UOL, que "hoje, São Paulo tem uma polícia preparada, equipada e bem informada".

"Não há hipótese de uma comunidade, uma população, uma cidade, um estado ou uma grande região ter paz sem ter segurança. Em São Paulo, isso se faz com seriedade, com planejamento, com estruturação, com inteligência para permitir a ação preventiva do crime, com respeito aos policiais”, disse o governador de São Paulo.

Segundo a Rede Brasil Atual, a bancada do PT na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) divulgou nota afirmando que vai acompanhar as apurações relativas ao caso.

“Há meses a Polícia Militar tem atacado os bailes funk, com apreensão de motos, carros e detenção de jovens, numa clara atuação preconceituosa e de marginalização da juventude negra periférica. Há cerca de um mês uma jovem perdeu a visão de um olho, alvejado com bala de borracha numa ação policial de opressão à baile funk”, diz a nota.

Os parlamentares afirmam que vão pedir explicações ao governador João Doria (PSDB). “Logo no início desta semana questionaremos o governador do Estado, secretário de segurança pública e comandante da PM e, acompanharemos com rigor este assombroso caso, para que estas mortes não caiam na vala da impunidade.”

Integrantes do Psol também se manifestaram. “Inadmissível o que ocorreu nessa madrugada em Paraisópolis. 9 pessoas mortas por pisoteamento em decorrência de uma operação policial num baile funk. Nosso mandato vai acionar o Ministério Público e cobrar explicações à PM. Nossa solidariedade às vitimas”, afirmou a deputada federal Sâmia Bomfim (Psol-SP).

Já o ex-candidato à presidente da República Guilherme Boulos, também do Psol, se manifestou por meio de seu perfil no Twitter. “A ação da PM para ‘dispersar’ um baile funk em Paraisópolis deixou 9 mortos. Os relatos e vídeos são estarrecedores. Ainda há imagens de um espancamento covarde após a ação. Quando quem deveria proteger leva o terror há algo muito errado. Solidariedade às vítimas e familiares.”

Em entrevista coletiva na tarde de hoje (1º), o porta-voz da PM, tenente-coronel Emerson Masseira, disse que algumas imagens divulgadas nas redes sociais  “sugerem excessos”. O ouvidor das polícias, Benedito Mariano, disse que vai oficiar para que a Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo tome frente da investigação interna sobre a tragédia.

Baile da 17

O Baile da 17, criado no início dessa década nas ruas de Paraisópolis, faz referência ao número de um bar de drinks que existia no local e, no começo era apenas uma roda de pagode. Nos intervalos, os frequentadores ouviam funk em carros estacionados na rua. 

Com o funk a festa cresceu e já chegou a reunir cerca de 30 mil pessoas de vários bairros da cidade e atrai jovens até do interior do estado.

 

Ao longo das vielas, DJ's estacionam carros com aparelhos de som acoplados. Grupos de jovens se reúnem no entorno desses veículos para dançar e se divertir.