O agro não produz comida, nem emprego ou riqueza. E mal paga imposto
Dados analisados confirmam ainda que o agronegócio é agressivo ao meio ambiente, derrubando florestas, conaminando rios com agrotóxicos e está por trás de conflitos agrários
Publicado: 21 Outubro, 2021 - 08h41
Escrito por: Cida de Oliveira, da RBA
Na propaganda, o agro é pop, tech e tudo. Na realidade, porém, é bem diferente. Não produz alimento, empregos, riquezas para o país e praticamente nem paga impostos. É o que constata o estudo O Agro não é Tech, o Agro não é Pop e Muito Menos Tudo, de autoria dos geógrafos Marco Antonio Mitidiero Junior, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (ANPEGE), e Yamila Goldfarb, vice-presidenta da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA). O financiamento é da Fundação Friedrich Ebert Stiftung, a mais antiga da Alemanha, que patrocina em diversos países trabalhos pautados na defesa da liberdade, justiça e solidariedade.
Ao analisar dados fiscais de produção, exportação, geração de empregos e de divisas, entre outros, e colocar tudo na ponta do lápis, os pesquisadores constataram que o agro usa diversas estratégias para construir um consenso entre a sociedade brasileira de que é o setor mais dinâmico, moderno e importante da economia nacional. Porém, a análise dos números fazem concluir que, na verdade, trata-se de um setor que recebe muito e contribui pouco com o país.
Para começar, há a falácia de que o agro é o “celeiro do mundo”. Mas a atividade não alimenta o mundo, muito menos os brasileiros. Por aqui, os alimentos são os mais afetados pela inflação – com aumento de preços três vezes maiores que os demais. Atualmente, a insegurança alimentar afeta, em maior ou menor grau, cerca de metade da população, ao mesmo tempo em que país bate recordes de produção agrícola e pecuária. O problema, porém, é que a carne produzida, em sua maioria, segue para exportação. Por sua vez, a produção agrícola, em sua ampla maioria de soja e milho, também é exportada, majoritariamente para a produção de ração animal.
Agro na balança
Na verdade, o plantio de alimentos propriamente dito vem quase que totalmente das pequenas propriedades rurais, onde famílias de pequenos agricultores produzem arroz, feijão, verduras, legumes, frutas e ovos consumo da população. Em grande parte dos casos, são famílias, comunidades quilombolas e indígenas que, apesar do bem que praticam, vivem na mira de latifundiários, cada vez mais desassistidos e excluídos de políticas governamentais.
A alegada modernidade, ao lado do pretenso dinamismo do setor, que estariam por trás da geração de empregos e de riquezas para o país também não se sustenta. A análise dos pesquisadores mostra que o agro quase nada contribui para a arrecadação de impostos, bem como com a balança comercial. “O Brasil tem status absolutamente subalterno na economia mundial. O superávit da balança comercial, propalado pelo agro, não significa desenvolvimento econômico. O Brasil exporta commodities, como soja e milho, sem valor agregado. Continuamos com a economia colonial, baseada na exportação de produtos primários e importação de industrializados”, disse Yamila Goldfarb à RBA.
O PIB do agro
Para facilitar o entendimento do que isso significa, a Organização Mundial do Comércio (OMC) informa que a China faturou 40 bilhões de dólares, de março a setembro de 2020, apenas com a venda ao exterior de máscaras para proteção contra a covid-19 . Nesse mesmo período, a brasileira Confederação Nacional da Agricultura (CNA) anunciou que o país exportou 23,8 bilhões de dólares em soja, outros 4,2 bilhões de dólares em carne bovina in natura, 3,5 bilhões de dólares em açúcar de cana e outros 3,5 bilhões de dólares em farelo de soja.