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O mundo está mais desigual e a riqueza desumanamente concentrada

É dever do governo implementar uma reforma tributária justa que taxe os super-ricos e promova a distribuição de renda, defende o presidente da CUT Nacional, Sérgio Nobre

Publicado: 22 Janeiro, 2024 - 11h11 | Última modificação: 22 Janeiro, 2024 - 11h54

Escrito por: Sérgio Nobre

Roberto Parizotti (Sapão)
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O presidente da CUT Nacional, Sérgio Nobre, em artigo publicado no site Poder 360, critica o aumento da concentração de riqueza às custas dos trabalhadores e trabalhadoras, que cada vez ficam à mercê do trabalho intermitente, desregulado, precário e frágil. Para ele, é dever do governo implementar uma reforma tributária justa que taxe os super-ricos e promova a distribuição de renda

Confira a íntegra do artigo.

O mundo saiu da pandemia mais desigual, menos justo e menos humano. A pobreza extrema e a fome passaram a ser a realidade de bilhões de pessoas, segundo o relatório “Desigualdade S.A.: como o poder das grandes empresas divide o nosso mundo e a necessidade de uma nova era de ação pública sobre a desigualdade”, divulgado pela Oxfam, neste primeiro mês de janeiro. Em contrapartida, as cinco pessoas mais ricas do mundo, duplicaram a sua riqueza, ampliando o fosso que separa os ricos dos pobres.

A desigualdade não é um fenômeno social novo, sempre foi um desafio a ser vencido, a riqueza sempre esteve nas mãos de poucos e cresce tanto quanto mais se explora aqueles que quase nada têm.

A realidade nos mostra, porém, que essa exploração vem crescendo. Na busca incessante por lucros, a riqueza se concentra cada vez mais e a regulação do trabalho retrocedeu, com a ampliação da flexibilização da contratação, aumento da jornada e redução da remuneração. A produtividade deixou de ser apropriada pelos trabalhadores, virou prêmio periódico por atingimento de metas, a custo elevado da saúde física e mental dos trabalhadores. As grandes empresas atropelaram a legislação trabalhista dos países e o trabalho de bilhões de pessoas foi ficando intermitente, desregulado, precário e frágil.

O dono de empresa, por sua vez, deixou de ser um sujeito apenas, passou a ser um board de acionistas sem rosto e sem emoção, corporações cujo objetivo último é enriquecer os acionistas da ciranda financeira. Segundo a Oxfam, “sete das dez maiores empresas cotadas em Bolsas de Valores pelo mundo têm bilionários como CEOs ou principais acionistas” ou “observando as 50 maiores empresas de capital aberto do mundo, os bilionários são os principais acionistas ou CEOs de 34% delas, com uma capitalização de mercado total de 13,3 trilhões de dólares”.

Foi o caso da Petrobras, estatal brasileira, que, desde o golpe de 2016 no Brasil, foi usada para dar lucros aos seus acionistas independentemente do preço alto pago pela população. Em 2022, o lucro foi de R$ 188 bilhões; 77% superior ao de 2021. Mas, para os brasileiros, a gasolina subiu de preço, quase que semanalmente durante dois longos anos, e sendo o combustível custo para produção e distribuição de bens, os preços de vários itens básicos também aumentaram. O lucro dos acionistas da Petrobras foi pago com a fome e o empobrecimento das famílias brasileiras. Somente em 2023, com a eleição do presidente Lula, essa política começa a ser revista.

O relatório da Oxfam apontou ainda que a riqueza dos mais ricos se eleva por meio de quatro ações: a primeira, recompensando o acionista, aquele que não produz, não trabalha, mas ganha na esfera da financeirização, em que o dinheiro gera dinheiro e não mais mercadoria e, para isso, o importante é reduzir, ao máximo, o custo do trabalho. A segunda forma é não pagando imposto por meio de manobras legais às tributações locais por meio de paraísos fiscais. Com menos receita, governos reduzem seus investimentos nas áreas sociais e se veem aprisionados a programas de rigidez fiscal defendidos pelos mesmos que pregam a redução de impostos. A terceira forma se dá pela privatização, onde todos os serviços estratégicos do país vão para a mão de corporações que visam o lucro do acionista e pouco retornam para a qualidade do serviço que oferece. E a quarta é produzir sem a menor responsabilidade com a crise climática, uma vez que a prioridade é o resultado de curto prazo e não a garantia de um mundo melhor para as próximas gerações.

Dessa forma, foi por meio da financeirização do dinheiro, da renúncia, evasão para os paraísos fiscais, pela precarização de bilhões de trabalhadores e suas famílias e destruição do planeta na busca imediata de resultados imediatos que bilionários multiplicam seu dinheiro.

Não é esse o mundo que nós trabalhadores queremos e pelo qual lutamos. Acreditamos na possibilidade de se fazerem novos pactos objetivando o crescimento com desenvolvimento e a construção de uma sociedade mais igual e solidária. Os pontos ressaltados pelo relatório, como a solução para um novo caminho, estão, há muito tempo, presentes na agenda colocada pelos trabalhadores brasileiros desde os anos 2000, nos quais se propõe um Estado mais forte, que construa o desenvolvimento, que abra espaço para o debate tripartite e crie novas agendas, novas formas de geração de riqueza e de distribuição de renda para todos e todas.

Os trabalhadores querem um Estado que consiga tributar e regular as grandes corporações e a riqueza, que promova e garanta o trabalho decente e protegido como forma de assegurar melhor qualidade de vida para a população e seus descendentes. Um Estado que cuide do meio ambiente, para que a Terra siga sendo um planeta saudável.

O governo federal e o Congresso Nacional têm a obrigação de, com amplo e transparente debate público, implementar uma reforma tributária justa que taxe os super-ricos e promova a distribuição de renda e a efetivação dos direitos sociais no nosso país.

Sérgio Nobre é presidente nacional da CUT

São Paulo, 18 de janeiro de 2024