Escrito por: Rosely Rocha

O que amplia desemprego e crise econômica não é lockdown, é desgoverno de Bolsonaro

Epidemiologista diz que negacionismo, falta de lockdown e de planejamento dos governos farão o Brasil prolongar pandemia.  Efeito será devastador na economia e a responsabilidade é de Bolsonaro, diz Vagner

Edson Rimonatto

O lockdown, isolamento social mais restrito recomendado pelas autoridades da área da saúde para conter a disseminação do novo coronavírus, não contribui para aumentar o número de desempregados e prolongar a crise econômica no Brasil. O que aumenta as taxas de trabalhadores sem emprego e sem renda e derruba a economia é a falta de ação efetiva do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) no combate à pandemia.

Em diversos países do mundo o lockdown imposto por até três meses, aliado a vacinação em massa e controle da doença, não só combateu a pandemia como contribuiu para a expansão rápida das atividades econômicas. Nos Estados Unidos, até a população com menos de 16 anos já começa a ser vacinada. Na Nova Zelândia, na Oceania, onde a economia está crescendo, tem eventos com mais de 51 mil pessoas sem máscaras porque a pandemia está controlada.  

Esses países também vivem uma crise econômica com o fechamento do comércio e a proibição de eventos, mas a diferença é que os governos locais, além de obrigar a população a ficar em isolamento social, deram condições financeiras aos trabalhadores e empresas para que isto ocorresse.

O prefeito de Araraquara, Edinho Silva, do PT, decretou lockdown de 15 dias e também viu o número de casos e mortes por Covid-19 caírem e a economia começar a voltar ao normal.

Apesar de todas essas experiências exitosas, o presidente continua discursando contra medidas como essa, demorou mais de um ano para criar um comando nacional de combate à Covid-19, zomba das medidas recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), como uso de máscaras e recomenda medicamentos sem eficácia comprovada. Pior, ameaça até usar o Exército, numa clara afronta à Constituição, contra governadores que decretaram toques de recolher ou lockdown para conter a disseminação do vírus que já contaminou mais de 14 milhões de pessoas no país.

Bolsonaro, e não o lockdown, é o culpado da situação dos brasileiros que, um ano após a OMS decretar a pandemia, convivem diariamente com o descontrole da doença, que tem provocado falta de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), falta de medicamentos até para intubação, com hospitais amarrando pacientes às camas porque eles acordam durante o procedimento.  

A economia, claro, sofre com as idas e vindas de governadores que, pressionados pelos apoiadores de Bolsonaro, protestam contra medidas de isolamento social. O abre e fecha do comércio e serviços deixam milhões de brasileiros sem ver uma luz no fim do túnel, que traga esperança. E as experiências internacionais mostram que o lockdown funciona inclusive para aquecer a economia com a volta da vida ao normal.

Sem lockdown, até classe média, que apoia Bolsonaro, sofre. A crise chegou a até a classe média, que foi atingida negativamente com menos renda. Estudo do IDados, a partir da Pesquisa Nacional de Domicílios, diz que no fim do ano passado, oito em 10 famílias de renda média vivem com menos. A maior parte perdeu entre 10% e 50% da renda do trabalho. Para duas em 10 famílias, a pandemia levou entre 50% e 80% da renda familiar. E um em 10 domicílios a fonte de renda caiu entre 80% e 100%.

“A renda da classe média caiu por que não tem consumo. Bolsonaro paralisou a economia, já antes da pandemia, ao quebrar o sistema de proteção da Previdência Social, com a reforma, ao acabar com a política de valorização do salário mínimo do governo Lula, que fortaleceu a classe média e a classe C, estimulando o consumo. Ele nem cumpriu a sua promessa de campanha eleitoral de aumentar o do valor dado aos beneficiários do Bolsa Família”, diz o vice-presidente da CUT, Vagner Freitas.

O dirigente reforça que a crise vivenciada hoje pela classe média, que abriu seu pequeno negócio por ter acreditado em palavras como “empreendedorismo” e “meritocracia”, é resultado não apenas da pandemia, mas do atual governo que não combate seus efeitos, seja imunizando a população com vacinas, seja investindo em tecnologias para que o Brasil fabricasse o seu próprio imunizante e, após essas medidas, a população pudesse ir e vir e manter seus empregos.

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Para Vagner Freitas, as pessoas precisam voltar a trabalhar, mas sem recursos de um auxílio emergencial decente, sem isolamento social, sem programas de apoio aos micro e pequenos empresários, sem garantia de manutenção do emprego, a população não pode ir às ruas, a economia não gira, e os efeitos são devastadores para todas as classes sociais, exceto os mais ricos que estão cada vez mais ricos.

 “A falta de consumo destrói a classe média, aumenta a miséria nas classes D/E, e aumenta a violência. Mas entendemos que para isso é preciso que seja feito um lockdown de verdade. E, por isso que o 1º de Maio da CUT e das demais Centrais abordarão medidas que a gente sabe que são eficientes, como auxílio emergencial de R$ 600 até o fim da pandemia, vacina para todos, e em defesa da democracia e do emprego, e lockdown de pelo menos 21 dias, como defendem os cientistas”, afirma Vagner.

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O negacionismo da ciência é visto como tragédia pelo  epidemiologista do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Diego Xavier. Para ele, as quase 400 mil mortes por Covid-19 têm a ver com as decisões errôneas da autoridade máxima do país e de seus seguidores, incluindo alguns prefeitos e governadores.

Para ele há uma grande confusão gerada pelo argumento de que lockdown destrói a economia, como se a pandemia não tivesse nada a ver com isso.

“O lockdown é uma das alternativas para enfrentar a pandemia que o mundo todo está sofrendo. A pandemia não é um comportamento do mercado financeiro que quer prejudicar candidato X ou Y. Isto é argumento de narrativa da bolha negacionista”, diz o epidemiologista.

O vírus da Covid-19 se transmite de pessoa a pessoa. Com menos contato, menos contágio. O lockdown não é para destruir a economia, é para ser usado como fim à pandemia para reativar a economia e pôr um fim às mortes- Diego Xavier

A valorização à ciência é defendida pela CUT por que já foi demonstrado cientificamente em todo o mundo, que o uso de máscaras, de álcool gel e o lockdown, junto com recursos públicos para manter a renda dos trabalhadores, é a única forma de sair da pandemia.

“Bolsonaro não ouve a ciência, os médicos, estimula a população a descuidar da saúde. Portanto, é mentirosa a afirmação de que o presidente quer reativar a economia. Sem medidas sanitárias já preconizadas pelas autoridades de saúde, a economia não vai voltar a crescer”, afirma Vagner Freitas.

Já, segundo o epidemiologista, não há forma segura de voltar a funcionar, neste momento, alguns setores econômicos como muitos comerciantes querem. Um exemplo é o setor de eventos, os cinemas, as academias e as Igrejas.

“Nesses locais as pessoas se aglomeram, é um comportamento que só prejudica o fim da pandemia. Alguns setores econômicos deveriam ser olhados com mais seriedade pelo governo federal, com uma ajuda financeira. Mas o governo só tenta alternativas de narrativas que culpem governadores e prefeitos pelo isolamento social e a crise econômica”, diz Xavier.

Para ele, a visão de que o lockdown, uma medida sanitária, é responsável pela crise econômica é uma visão simplista do colapso econômico em que vivemos.

“Nunca houve uma dicotomia entre saúde e economia e a política acabou sobrepondo esses dois pontos. É político culpando uns aos outros, e ninguém toma as medidas necessárias em conjunto”, afirma o epidemiologista.

Xavier cita o exemplo de cidades vizinhas no Rio de Janeiro cujos prefeitos tomaram medidas diferentes, e o resultado foi negativo no combate à Covid e a população acabou por entender que isolamento social não funciona.

Ele conta que Niterói adotou um lockdown, mas a cidade vizinha, São Gonçalo, não adotou o isolamento. Com o ir e vir de pessoas, os leitos ocupados com pacientes de Covid nos hospitais da cidade em isolamento continuaram altos e o contágio também, por que a população de São Gonçalo continuou a ir para Niterói por depender dos hospitais da cidade vizinha. Sem baixar os números de contágio e mortes, os moradores de Niterói passaram a achar que a medida não resolve. O mesmo aconteceu com a capital do Rio e cidades próximas.

“Essas medidas descentralizadas, sem protocolos, planejamento e instrução apenas transferem responsabilidades. O vírus não respeita limite de política administrativa. Quando a medida é errada, por que prefeitos não conversam entre si, nada dá certo”, critica Xavier.

Outra crítica que o epidemiologista faz ao abre e fecha é que os governos locais não testam a população para a covid. Com todo mundo saindo às ruas, após um lockdown, sem saber quem está infectado, os benefícios do isolamento terminam em três, quatro dias.

“Muitos só falam retoricamente em união, mas não têm um plano conjunto e, por isso os municípios onde há leitos ficam sobrecarregados. Apenas 13% têm leitos para atender casos graves. São pouco  mais de 700 municípios num universo de mais de 5.500 em todo o país”, alerta.

 *Edição: Marize Muniz