Oposição derrota Temer e atrasa mudança da meta fiscal
No projeto de Lei Orçamentária, que tem de ser entregue hoje, constará oficialmente rombo
Publicado: 31 Agosto, 2017 - 17h54 | Última modificação: 31 Agosto, 2017 - 18h07
Escrito por: Hylda Cavalcanti, da RBA
No dia em que se completa um ano do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, a oposição obteve o que pode ser considerada a maior das suas vitórias no Congresso Nacional, ao longo dos últimos 12 meses, na madrugada desta quinta-feira (31). Sem alarde, apenas contando com o uso de obstruções, muitos discursos, ampliação dos debates e a ausência de quórum, a proposta de revisão da meta fiscal para os próximos dois anos não teve votação concluída. O governo pretendia ampliar o déficit de 2017 em R$ 20 bilhões (de R$ 139 bilhões para R$ 159 bilhões) e do 2018 em R$ 30 bilhões (de R$ 129 bilhões para R$ 159 bilhões).
Como o prazo para votação se encerra neste 31 de agosto, o Executivo vai ter que enviar um projeto de Lei Orçamentária com uma meta fiscal tida como irreal, com R$ 30 bilhões em cortes nas despesas previstas para o ano que vem. Isso é considerado um ponto negativo para o presidente da República e, sobretudo, para sua equipe econômica, que não conseguiu fazer os ajustes necessários prometidos desde o ano passado. O resultado é tudo o que o Palácio do Planalto mais temia.
Os parlamentares até aprovaram o texto base da meta fiscal, mas ficaram faltando os destaques que fazem alterações consideradas relevantes para a matéria. Das cinco propostas de emendas, somente três conseguiram ser aprovadas, sendo que, como a oposição pediu verificação de quórum e não foi possível realizá-la na análise das três emendas aprovadas, todas as cinco terão de ser apreciadas na próxima terça-feira (5).
Com o andamento tardio da votação, qualquer adendo, ainda que venha a ser aprovado, é tido como desgastante para o Executivo e para a imagem do governo diante do mercado financeiro.
A sessão foi marcada por várias obstruções feitas pelos partidos oposicionistas, iniciativas quase desesperadas dos líderes ligados ao Palácio do Planalto para chamar os parlamentares ao plenário, com o intuito de obter quórum, e discursos inflamados de comparações entre a meta fiscal que foi modificada diante de tanta reclamação no governo de Dilma Rousseff, em 2015, pelos mesmos deputados e senadores que nesta madrugada se empenharam para aprovar a mudança proposta por Temer. E também, de lembranças de que a projeção de déficit alterada no governo Dilma era bem menor que a do atual governo.
Para se ter uma ideia, em dezembro de 2015, quando o governo Dilma Rousseff pediu revisão da meta, a estimativa da União era de o ano ser fechado com déficit primário de R$ 119 bilhões (conforme dados da Agência Senado). Agora, o déficit primário, caso a proposta venha a ser aprovada em definitivo na próxima semana, ficará em R$ 159 bilhões.
Necessidade de explicações
Os deputados e senadores que foram contrários ao impeachment e que chamam o governo Temer de golpista não deixaram barato. “Antes de permitirmos que essa proposta de mudança da meta fiscal seja aprovada pelo plenário, queremos vários esclarecimentos da base aliada ao governo”, disse em tom firme o deputado Henrique Fontana (PT-RS).
“Quando foi pedida a alteração da meta no governo da presidenta Dilma, a grande acusação era de que o déficit tinha sido observado porque ela tinha cometido pedalada fiscal, o que sabemos que não consiste em crime de responsabilidade fiscal e não deveria ter levado ao impeachment. Este é um dos principais motivos pelos quais todos sabemos que a subida ao poder do grupo que aí está consistiu num golpe. A primeira pergunta que faço é: o presidente Michel Temer tem cometido pedalada fiscal? ”, questionou ele.
Fontana afirmou que o atual governo aprofundou a crise fiscal do país e precisa explicar, em detalhes, para os parlamentares e à população, os motivos da alteração proposta, de forma a permitir que a nova meta seja votada.
Pepe Vargas (PT-RS) também pediu várias obstruções e insistiu para a leitura da ata da sessão anterior, para que a mesa diretora fizesse conferência de quórum e, sobretudo, para que o tema fosse mais debatido antes de ter início a votação. “Não temos pressa. Ao contrário da base aliada, estamos usando de prerrogativas democráticas e regimentais, mas nossa intenção é fazer o bom debate e obtermos todos os esclarecimentos”, disse.
O texto-base da meta foi aprovado perto das 2h da madrugada, mas, pouco depois, exaustos, os parlamentares começaram a esvaziar o plenário. O líder do governo, senador Romero Jucá (PMDB-RR), tentou justificar a derrota dizendo que o que houve na verdade foi uma vitória, por conta da aprovação do texto base, mas evitou falar na questão do prazo constitucional para o envio do Orçamento Geral da União de 2018, que está sendo encerrado.
Jogo político
“O que aconteceu faz parte do jogo político. A oposição usou o instrumento de obstrução, que é permitido regimentalmente e nossos companheiros estavam cansados para voltar e votar tudo, mas não achamos que isso causará desgastes”, desconversou Jucá. Para os oposicionistas, o resultado mostrou a fragilidade do Executivo e do presidente e representou a dificuldade de união da base aliada do governo.
“Não se prepararam para uma votação difícil como essa, que sabíamos que seria repleta de debates. Só mostra que estamos atentos e que faremos de tudo para evitar investidas desse presidente ilegítimo contra o país”, afirmou o líder da minoria, José Guimarães (PT-CE).
Nos bastidores, a derrota (segundo os líderes governistas, falta de continuidade da votação até o final) foi vista como negativa para as imagens do presidente do Congresso, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE); do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR); do presidente interino da Câmara, André Fufuca (PP-MA), e até do presidente da República interino, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). O parlamentar, além de chamar vários líderes ao Palácio para uma reunião com o objetivo de lhes pedir apoio, ainda acompanhou a votação no próprio plenário sem sucesso.
Eunício Oliveira, numa última estratégia, ainda tentou cancelar a sessão para realizar uma outra para continuidade dos trabalhos no início desta quinta-feira (31). Mas foi aconselhado pelos mais próximos a desistir da ideia, diante da constatação de que se já estava sendo difícil garantir a votação até o final, pior ainda seria uma sessão pela manhã de hoje.
Ficou programada uma nova sessão conjunta do Congresso Nacional para completar a votação da matéria na terça-feira (5), a partir das 17h. Mas, agora, o estrago está feito: o rombo do orçamentário do governo, de R$ 20 bilhões além da meta em 2017, mesmo com retificação da proposta de orçamento para 2018, já é oficial.