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PA: histórico de lutas mobiliza trabalhadores na Amazônia 

Encontro no Pará articula movimentos sociais contra ampliação da Hidrovia Tocantins-Araguaia, usando experiência de luta dos povos da Região

Publicado: 14 Novembro, 2019 - 20h17 | Última modificação: 14 Novembro, 2019 - 20h38

Escrito por: Wanderson Lobato, especial para PortalCUT

Reprodução
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Organizado para construir uma grande aliança dos movimentos sociais e sindicais contra os prejuízos socioambientais previstos com a ampliação da Hidrovia Tocantins-Araguaia, o Encontro dos Povos das Águas dos Baixos Rios Tocantins que acontece até sábado (16), na cidade de Cametá, no Pará, também é uma oportunidade de resgatar a trajetória de luta e resistência dos movimentos sindicais e sociais da região. 

A socióloga e ex-deputada estadual pelo PT, Aida Maria Farias, explica que no final das décadas de 1970 e início dos anos 1980, a região vivia um período com muitos conflitos de terra, pois entrava em colapso o modelo de uso da terra com os chamados meieiros. “Os proprietários de terras davam seus lotes para alguém trabalhar e este ficava obrigado a dar metade de tudo que era produzido. Depois de gerações vivendo nesse modelo, os trabalhadores começaram a buscar pelos seus direitos de posse da terra”, explica Aida.

O país vivia sob a ditadura dos militares. Período em que as mulheres eram proibidas de se sindicalizarem, pois eram vistas como dependentes dos maridos. Os sindicatos, estavam sob intervenção. “Pra você ter uma ideia, o presidente do sindicato dos Trabalhadores Rurais de Cametá era um alfaiate!”, lembra a socióloga.

Neste cenário, a Igreja Católica, mais precisamente a Prelazia da cidade de Cametá, adepta da Teologia da Libertação, defendia o projeto “de uma opção preferencial pelos pobres”, e desenvolvia suas atividades de apoio aos trabalhadores da região através da Pastoral da Terra.

No final da década de 1970, o governo militar baixa o decreto de desapropriação de terras na região para a construção da barragem de Tucuruí. Na década seguinte, os moradores da região começam a se organizar e discutir soluções sobre o que aconteceria com as populações que viviam abaixo da obra.

No mesmo período, no município de Baião novos conflitos atingiam os trabalhadores rurais da região conhecida como Anilzinho. Trabalhadores vinham sendo expulsos de suas terras por empresas e empresários do sul do país que chegavam à região, atraídos pelos incentivos fiscais e pela propaganda dos governos militares. Partindo da premissa de que a Amazônia era desabitada, desenvolveram projetos de colonização, atraindo para a região pessoas que queriam terras. “Homens sem terra para terra sem homens” era o lema.

Decididos a resistir, os trabalhadores passaram a se reunir em encontros anuais, o Encontro Anilzinho que tinha o objetivo de articular resistências contra a perda de suas terras. Unindo rurais, quilombolas, pescadores e ribeirinhos, o movimento foi crescendo e tornou-se o Movimento pela Vida para em seguida se fortalecer como o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB).

Os anos de 1990 são marcados pela atuação do Movimento em Defesa e Desenvolvimento da Região Tocantina (Modert), uma iniciativa que se articulava com todos os movimentos sociais, pescadores, professores e associações. 

“A organização vai crescendo e vamos ganhando as lideranças dos sindicatos, algumas prefeituras. E depois da luta por conta da barragem, vem a luta pela energia elétrica para região. E dentro dessas lutas vieram outras, como o reconhecimento da agricultura familiar, a necessidade da assistência técnica, de ter recursos pra fomentar a agricultura familiar, um conjunto de muitas lutas”, lembra Aida.

Carmen Foro, Secretária-Geral da CUT Nacional, foi uma das lideranças envolvidas na organização e mobilização não só dos trabalhadores, mas de boa parte da população dos municípios da região, inclusive das prefeituras, no histórico movimento de ocupação da sede da Eletronorte, em Tucuruí, em 1996. 

No Pará, era um momento tenso na luta dos trabalhadores rurais, organizados para a terceira edição do Grito da Terra Brasil. Afinal, pouco mais de um mês havia se passado desde o Massacre de Eldorado dos Carajás, onde no dia 17 de abril, 19 sem terras foram mortos pela polícia militar, no governo de Almir Gabriel (PSDB).

“Hidrelétrica é guardada por tropas do Exército” era a manchete do principal jornal paraense no dia 27 de maio daquele ano. Segundo a reportagem, “o Serviço de Inteligência do Exército, em Brasília, teria detectado um plano de sabotagem da usina comandando por sindicatos ligados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), Movimento dos Sem Terra (MST), lideranças radicais do Partido dos Trabalhadores e funcionários da própria Eletronorte”.

Do outro lado, cerca de dois mil agricultores da região acamparam em frente à Eletronorte exigindo energia para os municípios do Baixo Tocantins. “Digo que foi meu batismo no movimento sindical. Lembro que chegamos na cidade e acampamos na estrada. A gente ia com os prefeitos e conseguia alguns bois para servir para os trabalhadores. O sindicato dos Urbanitários também nos ajudou com alimentos. Foi importante esse apoio pra garantir a nossa permanência no local”, lembra Carmen Foro.

No dia seguinte, uma comissão do Ministério das Minas e Energia é enviada para Tucuruí para negociar. Mas como o ministro Raimundo Brito e o governador Almir Gabriel não quiseram assinar um documento se comprometendo a estender a linha de transmissão de Tucuruí aos municípios do Estado, os agricultores resolveram radicalizar. Doze representantes dos trabalhadores decidiram fazer greve de fome e permanecer no escritório da Eletronorte. Do lado de fora, os trabalhadores interditam a BR 422, que liga Tucuruí ao resto do Estado.

O impasse é resolvido no dia 31 de maio, com a chegada de um fax, assinado pelo secretário executivo do ministério das Minas e Energia, José Luiz Garrido, e pelo presidente da Eletronorte, José Antonio Lopes, garantindo o cumprimento das reivindicações, como as linhas de transmissão de energia para Cametá, Limoeiro do Ajuru, Oeiras do Pará, Mocajuba, Baião, Moju, Tailândia e sul do Pará.

Para a Secretária-Geral da CUT Nacional, o Encontro, organizado pela CUT Nacional com o apoio da Solidary Center, entidade sindical internacional, é uma oportunidade de reconstrução do processo de luta dos movimentos sociais contra os atuais projetos pretendidos para a região. 

“O que está colocado par a Amazônia é absurdamente grave. É um modelo de desenvolvimento que precisamos enfrentar. Para isto, que a luz de nosso caminho seja nossa história de luta. Ela é a fonte que nós temos de beber e nos levantar para dizer qual o modelo de desenvolvimento que queremos para a Amazônia”, afirmou Carmen Foro.