Escrito por: Redação CUT

País perde Luiza Batista, referência de luta pelos direitos e pela vida das mulheres

Coordenadora-Geral da Fenatrad, Luiza deixará registrada na história do movimento sindical sua luta regulamentação da categoria das domésticas, a luta contra o trabalho análogo à escravidão, entre muitas outras

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O movimento sindical perdeu, neste sábado, 1° de março, uma de suas principais referências de luta. Luiza Batista, Coordenadora Geral da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad) e presidenta do Conselho Nacional dos trabalhadores Domésticos (CNTD) faleceu vítima de um câncer contra o qual vinha lutando, arduamente, há tempos.

A CUT lamenta profundamente a morte desta companheira, que tanto contribuiu para as lutas contra a opressão sobre a classe trabalhadora, em especial à sua categoria, das empregadas domésticas e na luta contra o trabalho análogo à escravidão.

“A luta pela vida das mulheres perde neste dia uma grande guerreira. A história de Luiza Batista, desde a sua infância difícil até a luta pela sua categoria e, mais recentemente, pela sua própria vida, é a história de uma trajetória de um ser humano único que sempre nos inspirou e que agora se eterniza como uma grande referência”, lamenta Amanda Corcino, secretária da Mulher Trabalhadora da CUT

É muito triste a partida dessa grande companheira, que tanto contribuiu para a luta das mulheres. Este Mês Internacional da  Mulher em 2025, fica marcado por esta perda irreparável. Luiza sempre esteve e sempre estará em nossos corações. E com toda sua garra, sua disposição de enfrentar todas as adversidades da vida, ela sempre fez e sempre fará parte de nós- Amanda Corcino

 

Lideranças lamentam a perda

Por meio de nota, no portal da Fenatrad, a amiga, companheira de luta, presidenta de Honra da Fenatrad e secretária de Formação Sindical e de Estudos do Sindoméstico-BA” , Creuza Oliveira, lembrou que Luiza Batista iniciou sua trajetória no movimento sindical das trabalhadoras domésticas em 2006 e que, em pouco tempo, veio a ser uma das maiores lideranças da categoria das trabalhadoras domésticas na história do Brasil. 

“A Fenatrad perde hoje Luiza Batista, uma grande líder que deixa um legado importante para a luta da categoria. Ela foi muito dedicada à luta das trabalhadoras domésticas, das mulheres e da população negra. A sua trajetória pelas trabalhadoras domésticas, mulheres e população negra é um grande exemplo para continuarmos trilhando este caminho que ela fez tão bem, defendendo com unhas e dentes os direitos da categoria das trabalhadoras domésticas. Ela sempre estava nas lutas e debates. Portanto, Luiza Batista, hoje e sempre, presente!”, afirmou Creuza Oliveira.

No X (antigo Twitter), a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves também lamentou a morte de Luiza e lembrou uma de suas recentes passagens, a instalação do Fórum das Trabalhadoras Domésticas.

“Recebi com profunda tristeza a notícia do falecimento de Luiza Batista neste sábado, 1° de março. Luiza era coordenadora-geral da Fenatrad - Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas - e uma das principais lideranças na luta pelos direitos das domésticas no Brasil. Fez história ao construir outras lideranças políticas entre as domésticas e a lutar contra as desigualdades na categoria, incluindo o trabalho análogo à escravidão. Em novembro de 2024, o Ministério das Mulheres esteve na aula inaugural do Programa Trabalho Doméstico Cidadão (TDC), no Recife, lançando oficialmente a iniciativa da pasta para esta que é a maior categoria de trabalhadoras do país. No mesmo dia, instalamos o Fórum das Trabalhadoras Domésticas”, escreveu a ministra na rede social

 

Recebi com profunda tristeza a notícia do falecimento de Luiza Batista neste sábado, 1° de março.

Luiza era coordenadora-geral da Fenatrad - Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas - e uma das principais lideranças na luta pelos direitos das domésticas no Brasil. Fez… pic.twitter.com/czZYTeiX5r

— Cida Gonçalves (@CidaMulheres) March 2, 2025

 

Trajetória

Luiza Batista nasceu em 1956, filha de um casal de trabalhadores rurais de São Lourenço da Mata, Pernambuco. De acordo com uma reportagem especial publicada no Brasil de Fato em 2020, com sua história, quando o pai foi trabalhar no Engenho Veneza, pertencente à família Guerra, em Vitória de Santo Antão, a família foi junto para viver na vila de casas de taipa pertencentes aos donos do engenho.

Veja aqui a matéria completa do Brasil de Fato com a história de Luiza Batista

Mas logo o pai viria a falecer, quando Luiza ainda tinha seis anos de idade e a família foi obrigada a deixar a casa para viver na rua. "Ele era um homem bom, trabalhador. Nunca presenciei brigas sérias entre ele e a minha mãe. Mas quando morreu ele não deixou nada, não por culpa dele. Na época trabalhador rural não tinha direito a nada", disse Luiza Batista à reportagem.

Ela contou ainda detalhes sobre sua infância e as dificuldades que a moldaram como uma personalidade forte e de luta contra as desigualdades. "Não tínhamos dinheiro para aluguel e passamos duas semanas dormindo nas ruas. Na época minha mãe tinha tuberculose, vomitava sangue, e com um menino e duas meninas", recordou Luiza, sem esconder a emoção.

"Ali conhecemos a solidariedade de pessoas tão boas e cuja religião é tão atacada por preconceito”, disse ao BdF.

Mãe Bilinha e seu Paulo, uma família de candomblecistas, decidiu abrigar a mulher e seus três filhos no salão onde realizavam as cerimônias religiosas. Lá a família viveu por dois meses até que Mãe Bilinha mobilizou seus filhos de santo para erguerem uma casa para Severina e as crianças.

"Construíram uma casinha de taipa com dos vãos para nós, coberta com folhas de sapé. Era o nosso teto, a nossa casa. Foi ótimo. Moramos dois anos nessa casa", diz Luiza.

Câncer

Sua mãe, Severina, morreu em 1990, de câncer. Dois anos depois Luiza percebeu, durante o banho, um nódulo na mama. "Senti uma ondulação no seio. Mas não fui ao médico. Já em junho passei uma tarde ralando coco, o que me fez sentir muitas dores no seio e fui parar na emergência", recorda.

Durante o tratamento ficou sem trabalhar e contou com ajuda da patroa, dona Eleniza, que mandava itens para ajudar na feira; e principalmente a ajuda do seu companheiro Francisco, zelador do edifício em que trabalhava e com quem já estava havia seis anos. "Ele me deu toda a assistência que podia, todo apoio necessário. Sempre levava uma água de coco. Foi uma pessoa incrível, mas era muito mulherengo", diz com um riso no rosto, mas sem esconder o tom de lamento.

Foram mais de 10 anos juntos e ela lembra, satisfeita, que ele foi e continua sendo pai de seus filhos. "Ele hoje tem um filho da nova companheira, mas diz para todo mundo que tem dois primeiro casamento". Na separação, a casa própria – que foi uma conquista de ambos – ele deixou para ela, oficializado em cartório.

Aos 40 anos, ela recebeu a notícia de que o câncer voltara. "Tive que tirar a mama toda. No mesmo ano, meses depois, tive que fazer histerectomia total (remoção do útero e ovários), porque tive metástase de câncer no ovário esquerdo, havia muitos miomas. Em 1999 tive câncer na outra mama. A última cirurgia de remoção de tumor foi em 2006".

Apesar dos anos de batalha, a marca que esse período lhe deixou não é de puro sofrimento. "Muitas mulheres, quando descobrem que estão com câncer e que perderão a mama, elas entram em depressão. Eu não tive isso. A minha antiga patroa dizia que após o câncer eu fiquei mais atrevida. Perdi o medo de me jogar na vida", afirma orgulhosa.

Aposentadoria e sindicalismo

Em 2006, já aposentada por invalidez, Luiza passou a contribuir mais no Espaço Mulher e, por insistência da amiga-irmã Edicléa, voltou a estudar através do Projeto Trabalho Doméstico Cidadão, que envolvia sete cidades, com 30 estudantes em cada, todas trabalhadoras domésticas que não haviam concluído o Ensino Fundamental. Nas aulas, Luiza conheceu mulheres que já eram da diretoria do sindicato.

"Naquela sala de aula descobri sobre as tantas lutas que haviam garantido direitos às trabalhadoras domésticas. E decidi contribuir com a luta, me filiei ao sindicato e passei a ir às reuniões – que até hoje acontecem sempre no segundo domingo do mês". No projeto, Luiza concluiu o Ensino Fundamental e se matriculou numa escola do governo, onde cursou o Ensino Médio, concluindo em 2009. Ainda em 2006, durante o projeto, Luiza viajou para Salvador (BA) onde participou do 9º Congresso Nacional de Trabalhadoras Domésticas do Brasil. Em 2007, viajou com as companheiras para a Marcha das Margaridas. E em 2009 foi eleita presidenta do Sindicado das Domésticas de Pernambuco.

 

Luiza Batista 

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