Escrito por: Júlio Turra, especial para o PortalCUT
Entrevista com o presidente da CUT-A, Bernardo Rojas
Uma semana depois da explosão popular no Paraguai contra o governo de Mário Abdo Benitez (Marito, amigo de Bolsonaro), o PortalCUT ouviu neste domingo (13) o presidente da Central Unitária de Trabalhadores–Autêntica (CUT-A) Bernardo Rojas, sobre a situação no país vizinho.
Confira abaixo a entrevista feita pelo assessor da CUT, Júlio Turra:
Júlio Turra: Como você avalia a mobilização popular em curso no Paraguai?
Bernardo Rojas: Desde o início de março, os trabalhadores da Saúde denunciavam em atos públicos o descaso do governo Marito com o povo paraguaio em meio à pandemia: falta de pessoal médico e hospitalar, de insumos básicos, leitos e agora de vacinas, com o sistema sanitário a beira do colapso. Em 5 de março, o ministro da Saúde renunciou, sob pressão das ruas ocupadas de forma espontânea por milhares de manifestantes, os jovens em grande número, que passaram a exigir a saída do presidente aos gritos de “fora Marito”. As manifestações prosseguiram no fim de semana e até hoje ocorrem em vários pontos do país. Em 6 de março, a CUT-A soltou uma nota pública denunciando a violenta repressão policial aos manifestantes concentrados diante do Palácio do Governo e nela dissemos: “a quarentena revelou a verdadeira cara desta administração estatal, que prioriza os interesses de alguns grupos políticos e econômicos – a elite – por cima dos interesses de 99% da população, deixando de lado as necessidades básicas de todo o nosso povo”.
JT: Há forças políticas que organizaram essas mobilizações?
O governo fala, como sempre, em “infiltrados” violentos, para tentar justificar a repressão policial. Na verdade é um movimento espontâneo, sem direção política reconhecida, uma explosão popular similar à ocorrida no Chile em 2019. Os políticos e parlamentares, inclusive da oposição, como os da Frente Guasú (do ex-presidente Lugo), são rechaçados nas manifestações e o que mais se ouve nelas é “que se vayan todos” (fora todos). A cidadania levantou-se contra o governo por não suportar mais a situação de corrupção, desprezo e ataques às condições de vida da maioria esmagadora do povo, o que ficou ainda mais patente com as medidas adotadas diante da pandemia.
JT: Como se coloca a CUT-A diante dessa situação?
BR: A ministra do Trabalho nos convidou para uma cerimônia com o presidente logo após a explosão popular. Dissemos à ministra que não estávamos acostumados a levar apoio político a governos. Se fosse para discutir as reivindicações dos trabalhadores, poderia ser, mas não era o caso. Algumas organizações sindicais aceitaram o convite, nós não participamos, porque queremos ficar ao lado do nosso povo, cuja mobilização é a única possibilidade de mudanças profundas em nosso país em beneficio da ampla maioria.
De nossa parte, CUT-A, decidimos, numa recente reunião conjunta com entidades estudantis e movimentos camponeses, nos somar às manifestações em todos os cantos do país para avançar nas mudanças reais e profundas no modelo de estado atual.
O Movimento Agrário Popular (MAP), que é ligado à CUT-A, já fez atos públicos e marchas em Caaguazú e agora junta-se a outros setores camponeses numa marcha até a capital, Assunção, para exigir a saída de Marito e seu entorno do governo nacional.
JT: oposição propôs um julgamento político - algo similar ao impeachment, mas muito mais rápido - de Marito, como você vê essa possibilidade?
BR: Vários setores apóiam o julgamento político de Marito no Congresso. Mas quem controla a maioria dos parlamentares é o ex- presidente Horácio Cartes, que governou o país entre 2013 e 2018 e que é o homem mais rico do país e dono do partido Colorado, o mesmo de Marito. Cartes chantageia o atual presidente exigindo que ele apóie a sua proposta de uma Constituinte que abra a porta para sua volta à presidência. Neste caso, orientaria o voto contrário ao julgamento político, senão o abandonaria. Lembremos que Marito já teve um pedido anterior de julgamento político negado pela maioria controlada por Cartes, quando foi denunciado por suas negociações sobre a binacional Itaipú com o governo Bolsonaro, em prejuízo dos interesses paraguaios. A oposição não tem votos suficientes para destituir o atual presidente.
JT: Como prossegue a luta, então?
BR: A situação é difícil, mas, para nós, só a continuidade da mobilização popular, com a participação dos setores organizados da classe trabalhadora, do campesinato e da juventude, é que pode abrir uma saída positiva. Para terminar, queria mandar um grande abraço aos companheiros da CUT do Brasil, dizendo-lhes que estamos muito felizes com a recuperação dos direitos políticos do ex-presidente Lula, o que vai reforçar a luta de vocês para por um fim no governo Bolsonaro.