Escrito por: Leonardo Wexell Severo, de Assunção - Paraguai
Plenária unitária de professores, pais e estudantes denuncia desgoverno Cartes
Estudantes da UNA protestam contra corrupção e desvio de recursos
A mobilização vai iniciar com assembleias e vigílias nas escolas e faculdades já nesta semana, continuando com a “sentata” em avenidas e culminando com uma grande marcha até o Congresso Nacional. Um documento com as reivindicações comuns foi encaminhado a deputados e senadores reiterando a necessidade das medidas, particularmente do aumento de recursos da educação para 7% do Produto Interno Bruto (PIB).
“Também vamos exigir que o governo retire imediatamente o Paraguai do Tratado Sobre Comércio de Serviços (TISA), mantido secreto em função dos interesses norte-americanos, que converte e reduz a educação, assim como a saúde, a água, as telecomunicações e tudo mais, a simples relações de compra e venda. Não queremos um país vendável, lutamos pelo presente e pelo futuro”, declarou Gabriel Spínola, presidente da Organização de Trabalhadores da Educação do Paraguai (Otep-Autêntica). Os 3,9% do PIB aplicados atualmente no setor, denunciou Spíndola, são “absolutamente insuficientes e demonstram que o orçamento atual está baseado numa lógica iminentemente financeira e não nas necessidades da educação”.
Membro da Federação Nacional dos Estudantes Secundaristas (Fenaes), Federico Enciso denunciou “a política de desmonte”, conclamando a todos “a seguir unidos e mobilizados em favor da educação e do país”. “Vamos pressionar o legislativo, que em novembro definirá o orçamento de 2016, para que amplie os recursos do setor para 7% do PIB. Ao mesmo tempo, questionamos a hipocrisia e as perseguições deste governo antissindical e anti-organizacional e seu programa de desestruturação", ressaltou. De acordo com Federico, “o movimento popular está acumulando para exigir a renúncia de Cartes, que deu as costas ao desenvolvimento nacional”. No plano educacional, disse, “os estudantes não permitirão que sua ministra Marta Lafuente participe de nenhuma cerimônia de formatura dentro de qualquer estabelecimento de ensino”. E caso apareça em algum deles, sublinhou, “será devidamente escrachada”.
Fátima Silva, secretária de Relações Internacionais da CNTE
AMEAÇA DE PRISÃO
Em uma marcha por mais verbas para a educação realizada no dia 29 de agosto de 2014, Stiben Patrón, dirigente estudantil da Fenaes, foi intimado pelo governo e ameaçado com cinco anos de prisão por suposta “perturbação à paz pública e resistência”. O promotor Emilio Fuster, filho de um ministro de Alfredo Stroessner (ditador de 1954 a 1989), foi quem se prestou ao jogo sujo de armar a denúncia.
Na quinta-feira, após intensa pressão, a Justiça finalmente recuou. "Os testemunhos eram todos falsos. Até inventaram que eu tinha uma bomba e iria queimar o palácio de governo”, relatou Stiben. Apesar da manifestação ter sido violentamente reprimida pela polícia, que usou balas de borracha, espancou uma professora grávida e deixou jornalistas feridos, quem foi levado ao banco dos réus foi o estudante e não Cartes. Frente à ausência de provas, o juiz determinou ao jovem que continue criando entidades e que prossiga com as mobilizações, dando continuidade às atividades para as quais foi indiciado.
“Esta decisão foi uma vitória do movimento estudantil, que já soma conquistas como o aumento da cobertura do almoço escolar e a inclusão de materiais didáticos nos kits escolares”, declarou Patrón, para quem é preciso agora que se faça justiça com os outros dois companheiros da Fenaes, Ariel Vera e Fabricio Núñez. “São lideranças que estão enfrentando processos semelhantes em causas judiciais armadas com o objetivo claro de amedrontar”, acrescentou.
O flagrante desvio de recursos e a péssima gestão do Fundo Nacional de Investimento Público e Desenvolvimento (Fonacide) também são alvo dos manifestantes. Os exemplos são abundantes. No começo de outubro, cerca de 15 alunos secundaristas e sua professora ficaram feridos na escola de Lambaré, ao sul da capital, depois que o teto da sala de aula desabou sobre suas cabeças. A utilização de materiais de segunda linha, aliada à “economia”, denunciaram, quase provocou uma tragédia.
A mobilização estudantil contra a corrupção conseguiu afastar na última sexta-feira o diretor da Faculdade de Ciências Agrárias da Universidade Nacional de Assunção (UNA), Lorenzo Meza, que renunciou conjuntamente com o seu vice-diretor, Miguel Ruíz. Por sua vez a Faculdade de Filosofia da UNA continua parada exigindo o afastamento da diretora Maria Angélica González.
Em todo o país mais de 50 diretores estão sendo processados e cinco foram presos depois de comprovada manipulação contábil, em que enchiam a folha de pagamento de correligionários partidários ou parentes.
Para Nataly Valdez, estudante de Psicologia da UNA, “os estudantes perderam o medo, forte herança da ditadura de Stroessner, e não aceitam mais o uso da repressão contra quem pense diferente”. “O governo e os meios de comunicação empresarial querem abafar esta pressão, mas ela cresce e se espraia pela capital e pelo interior”, disse.
“Nós jovens somos 60% da população paraguaia e vamos impedir que haja retrocesso nesta caminhada rumo à democratização do país”, concluiu Maria Silvero, da Faculdade de Filosofia da UNA.