Escrito por: CUT-RS

Parte uma construtora da CUT e do PT, socióloga, feminista e companheira Enid Backes

Enid Backes participou ativamente das lutas pela redemocratização do país, pela anistia, e em defesa dos direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores

Reprodução

Com imenso pesar, a CUT-RS comunica que partiu nesta terça-feira (22) a companheira Enid Diva Marx Backes, de 93 anos. Era socióloga, feminista, militante de movimentos sociais, construtora da CUT e fundadora do PT.

“Não terá velório nem enterro”, disse o seu filho, o paisagista Toni Backes. “O último desejo e ação da guerreira foi doar seu corpo para a Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (Ufcspa) para ser estudado pela ciência.” Essa decisão demonstra toda a sua coragem e entrega.

Ela participou ativamente das lutas pela redemocratização do país, pela anistia, e em defesa dos direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores. 

Construtora da CUT

Enid foi uma das fundadoras da CUT no Rio Grande do Sul. “Era da associação dos sociólogos e através dela fez parte da comissão que criou a CUT em nível estadual e também foi da comissão pró CUT Nacional, junto com o Paim, o Olivio e o João Paulo, que era dos têxteis”, recorda com carinho a assessora nacional da CUT, Sílvia Portela.

“Depois ela veio para São Paulo, em 1985, e ficou na CUT Nacional por um ano mais ou menos, trabalhando como coordenadora da assessoria da Secretaria-geral. Já nesse período ela foi a primeira pessoa que começou a falar da questão das mulheres trabalhadoras, o problema do machismo e uma série de questões do feminismo”, destaca.

"Ela voltou para o Rio Grande do Sul e foi trabalhar na CUT de novo. Depois foi para a Secretaria de Saúde, quando Olívio Dutra assumiu a prefeitura de Porto Alegre e depois o Tarso a convidou para ser secretária da Mulher na gestão dele como prefeito", recorda Síliva. "Também participou de um programa da Escola Sul da CUT para mulheres.".

"Enid Backes foi uma grande companheira e lutadora que abriu caminhos pra todas nós, militantes feministas, militantes de Direitos Humanos e todas e todos que lutam por um mundo melhor. Também foi uma militante construtora da CUT. Vá em paz ser mais uma estrela no céu", afirmou a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT-RS, Mara Weber.

Enid presente!

Trajetória de lutas

Em 1982, foi candidata a deputada estadual pelo PT. Pela sua atuação como precursora do movimento feminista no Rio Grande do Sul, ainda nos anos 1970, foi escolhida por Tarso Genro – à época, prefeito de Porto Alegre – para liderar a primeira Coordenadoria Municipal da Mulher no Estado.

Na 4ª Conferência Estadual de Políticas para as Mulheres, em outubro de 2011, no Hotel Continental, em Porto Alegre, Enid foi a homenageada da conferência. Muito aplaudida, emocionada, agradeceu a homenagem, e fez um pedido ao governador: a abertura de espaços para as mulheres na grade de programação da Rádio FM Cultura e na TVE. 

"Esta é uma forma de ampliarmos e popularizarmos o debate sobre as questões específicas que afligem as mulheres e combater os preconceitos", defendeu Enid. "Isto será um importante passo para que as transformações necessárias à construção da equidade de gênero avancem."

O ex-deputado Adão Villaverde, então presidente da Assembleia Legislativa, destacou que "há mais de 30 anos, quando lutávamos contra a ditadura militar e pelas liberdades democráticas, Enid nunca nos deixava esquecer que não bastava resistir, era preciso pensar no futuro, na sociedade que queremos, com mulheres e homens em condição de equidade plena”. 

O histórico de defesa dos direitos humanos, e sobretudo dos direitos da mulher, levaram o Coletivo Feminino Plural a lhe prestar uma homenagem dando seu nome ao seu acervo – pioneiro no Estado ao dedicar-se às obras feministas. O Acervo Feminista Enid Backes, inaugurado no dia 10 de dezembro de 2015, é fruto de uma coleção rica e interdisciplinar construída pelo coletivo ao longo de duas décadas de ativismo feminista.

“Uma mulher na frente de seu tempo”

A jornalista feminista Télia Negrão, companheira de Enid na luta pela vida das mulheres, destacou sua visão muito além de seu tempo. “Enid era uma mulher na frente de seu tempo, pois trazia uma concepção de feminismo que não estava ainda definida entre nós, que era a relação entre os nossos corpos, a autonomia das mulheres e a relação com a natureza, uma espécie de ecofeminismo.”

Télia destaca que ela recuperava permanentemente um saber ancestral das mulheres e o trazia para o presente, sobre o corpo, a vida, as relações com o planeta, “fazendo-nos refletir sobre o processo de desapropriação ocorrido quando o patriarcado se torna ‘dono’ dos saberes, que denomina de ciência. Ela nos fazia, portanto, pensar”.

Para Télia, é preciso resgatar a forma como lidava com os temas do movimento de mulheres, quando coordenava o Fórum Municipal da Mulher, depois de ter tido uma trajetória como gestora e ter participado de outras esferas de poder. “A sua sabedoria radicalmente conciliava conceitos, encontrava conexões entre diferentes visões de mundo e habilmente indicava caminhos. Era uma sábia, uma bruxa!”

Mensagens ressaltam a grandeza de Enid

“Hoje nos despedimos com tristeza de Enid Backes, precursora feminista, lutadora por importantes causas sociais e fundadora do PT. Seu histórico na defesa dos direitos humanos, e sobretudo dos direitos da mulher, nos orgulha e enche de inspiração na luta e na vida. Deixo um abraço afetuoso em toda sua família e amigas e amigos com quem ela sempre compartilhou a luta por um mundo mais justo. Enid, presente!”, destacou a deputada estadual Sofia Cavedon (PT).

A deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) também se manifestou. “Nos despedimos hoje da querida Enid Backes, uma das maiores referências da luta feminista do RS. A ela devemos o pensar nas políticas para as mulheres, pela ótica dos direitos humanos. Meu carinho a sua família e amigos.”

O Levante Feminista contra o feminicídio lamentou a partida de Enid Backes, lembando que "ela foi uma das poucas brasileiras que esteve na Conferência de Direitos Humanos de Viena, em 1992, “que nos fez pensar no significado dos Direitos Humanos das Mulheres. Esta conferência reconheceu, pela primeira vez, o direito das mulheres e meninas a uma vida sem violência, e declarou ‘a violência contra as mulheres e meninas é uma violação aos direitos humanos’. Quando dizemos que ‘quem mata uma mulher, mata a humanidade’, estamos lembrando do legado dessas mulheres, como Enid Backes, que ajudaram a construir uma nova forma de pensar e agir em favor das mulheres. Enid estará sempre presente em nós, feministas do Rio Grande do Sul.”

O Conselho Estadual de Direitos das Mulheres do RS também lançou uma nota ressaltando que hoje o movimento de mulheres do Brasil e do RS se despedem com tristeza de Enid Backes. "Nós do CEDM/RS estamos consternadas com a perda de uma de nós. Enid foi homenageada em vida pelo movimento de mulheres dando nome à última Conferência Estadual das Mulheres em 2011, foi nossa precursora nas lutas e com sua força nos inspira."

Curta-metragem conta vida de Enid

Um pouco da história de Enid pode ser conhecida no filme curta-metragem "Enid Backes", do Projeto Cinematrográfico Memorial das Mulheres RS, lançado no 8 de Março de 2017, Procuradoria Especial da Mulher do Legislativo.

O Projeto Cinematográfico Memorial das Mulheres do RS apresentou a história de mulheres que tiveram participação destacada nas conquistas dos direitos e valorização das mulheres. Além de Enid Backes, entre as personagens do projeto estão Dercy Furtado e Matilde Cechin. 

Também pode ser conferido o minidocumentário realizado pelo projeto Ponto de Cultura Feminista: corpo, arte e expressão, coordenado pelo Coletivo Feminino Plural.

Com Katia Marko e Marcelo Ferreira – Brasil de Fato RS