O dirigente entende que a PEC é mais uma iniciativa da direita que está, segundo ele, “encastelada” dentro do Congresso, que quer privatizar o que é público, como já fizeram com tantas outras coisas no país.
“Privatizar áreas de marinha é, para além disso, um ataque à natureza, aos chamados direitos da natureza, a transformando em mercadoria. Então, para nós, para além de uma irresponsabilidade, é um crime da soberania nacional, é um desrespeito e faz parte dessa orquestração “ecocida”, dessa direita fascista que esteve no poder, no Executivo, até há pouco tempo, mas que continua mandando e desmandando na agenda do Congresso Nacional, infelizmente”, declarou Gaio.
Ele refuta a ideia de privatização, que limita o acesso da população em geral às praias, por sequestrar um direito que deve ser preservado, o de acesso a esses espaços. A estimativa é que haja atualmente 2,9 milhões de imóveis em terrenos de marinha. Mas apenas 565,3 mil deles estão cadastrados. E os beneficiários tendem a ser pessoas de alta renda, que ocupam terrenos à beira-mar.
“Mesmo que não haja, como a direita tem tentado afirmar, uma venda ou uma negociação desses terrenos, um repasse para a iniciativa privada, o acesso será privado a eles. Então é sim uma privatização. Essa é a narrativa verdadeira e correta que dialoga com a realidade desse projeto”, afirma.
Gaio conclui contando que a CUT está subscrevendo algumas iniciativas de entidades parceiras e de escritórias de advocacia contra a PEC, em denúncia à sua tramitação e em denúncia ao objeto como um todo.
PEC da privatização das praias voltará a ser debatida no Senado (*)
O senador Fabiano Contarato (PT-ES), anunciou na noite desta quarta-feira (5), a aprovação de seu requerimento para audiência pública sobre a PEC da privatização das praias, que se, aprovado, as áreas à beira mar, de lagoas e rios, de domínio da União, serão transferidas a estados, munícipios e também a empresas.
“Já me posicionei contra a proposta do jeito que ela está redigida. Sou a favor de acabar com pesados impostos para quem ocupa terrenos de marinha. Mas sou totalmente contrário à possibilidade de privatizar essas áreas importantíssimas do ponto de vista social e ambiental. Agora, sim, vamos discutir melhor esse assunto, com a devida importância”, justificou Contarato em seu perfil na rede X.
PEC da Privatização das Praias facilita calote
A PEC da Privatização das Praias tem parecer favorável do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), relator da proposta. Em sua manifestação, o parlamentar alegou que o projeto dará mais segurança jurídica aos atuais ocupantes. Isso porque “muitas pessoas adquiriram imóveis devidamente registrados na serventia de registro de imóveis e, após decorridos muitos anos, passaram a ter suas propriedades contestadas pela União, quando da conclusão de processos demarcatórios”, argumenta.
Flávio Bolsonaro também defende que a medida aumentará a arrecadação federal e atenderá necessidades de municípios com grandes áreas litorâneas. A proposta, porém, que já foi tema de audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em 27 de maio, coleciona controvérsias e provoca repercussão nas redes sociais. Atualmente, a propriedade desses imóveis é compartilhada com a União, que cobra uma taxa de foro pelo uso e ocupação do terreno. Em caso de transferência para outra pessoa, é preciso pagar outra taxa, o laudêmio.
Ao facilitar a transferência, a PEC, porém, não prevê sanções ou condutas em caso de não pagamento. O que pode provocar diversos calotes no governo quanto ao pagamento de valores devidos por um proprietário. “A PEC é a porta para a privatização”, destacou o o biólogo Ronaldo Christofoletti, professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “A proposta não privatiza a praia. Ela permite que prefeitos e governadores regularizem a participação da iniciativa privada. Logo ela é a porta para a privatização”, completou em entrevista ao portal Congresso em Foco.
Senadores com propriedades no litoral
Levantamento da Folha de S. Paulo, divulgado nesta quinta-feira (6), mostra que entre os possíveis beneficiários diretos da PEC estão nove dos 81 senadores que vão votar a medida. São eles: Alessandro Vieira (MDB-SE), Ciro Nogueira (PP-PI), Esperidião Amin (PP-SC), Fernando Dueire (MDB-PE), Jader Barbalho (MDB-PA), Laércio Oliveira (PP-SE), Marcos do Val (Podemos-ES), Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Renan Calheiros (MDB-AL). Com base em dados públicos da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) e da Justiça Federal, o jornal identificou que todos esses parlamentares têm em seu nome propriedades que ficam em área de marinha.
Mas, apesar do conflito de interesse, a maioria disse não se sentir impedidos em analisar a PEC. Dois deles ainda já se declararam favoráveis ao texto: Esperidião Amin (PP-SC) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). O primeiro é dono de um imóvel de 2.982,89 metros quadrados em Guaratuba, no litoral do Paraná. À reportagem, Esperidião minimizou a contradição, afirmou que se trata de uma “casa de veraneio” e que a PEC não terá para ele um “reflexo significativo”.
“São milhares de casas na mesma situação. Importante salientar que, em qualquer hipótese, não haverá alteração no uso do terreno”, afirmou à Folha. A proposta de privatização das praias já teve aval da Câmara, em fevereiro de 2022. Na época, a SPU alertou que a medida seria “deletéria” sobre o patrimônio da União. O cálculo é de que o valor das áreas envolvidas supere R$ 1 trilhão. O prejuízo, contudo, pode ser ainda maior, segundo informações atualizadas pela secretaria a partir do Censo de 2022.
Entre os que podem se beneficiar estão ainda Marcos do Val e Laércio Oliveira, que não manifestaram qual posição vão adotar na análise do tema. Oliveira, porém, já votou a favor da PEC da Privatização das Praias quando ela foi aprovada pela Câmara e ele era deputado. Já Fernando Dueire, que também tem propriedade no litoral, se disse contrário à medida.
*Com Clara Assunção, da RBA